Prazer em viver

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caesA vida animal é, frequentemente, representada como uma árdua e constante luta pela sobrevivência. Assegurar a satisfação de necessidades biológicas básicas como a alimentação, segurança ou reprodução, implica a superação dos mais variados desafios. E pode envolver inúmeros perigos, conflitos e incertezas, muitas vezes agravados pela competição inter e intra espécies. Evitar a privação, a dor e o sofrimento são, sem dúvida, motivações básicas de qualquer animal (incluindo os humanos). Mas serão as únicas? Seguramente: não.

Um crescente número de biólogos e estudos científicos tem vindo a reforçar a importância da procura de estados de prazer e bem-estar enquanto motivação básica dos animais. Na verdade, todos os animais vertebrados (mamíferos, aves, peixes, répteis e anfíbios) partilham a mesma estrutura básica corporal: sistema esquelético, muscular, nervoso, respiratório, circulatório, digestivo, excretório, endócrino, reprodutor e sensorial. E cinco sentidos básicos (que podem ser mais ou menos desenvolvidos em função da espécie): visão, olfacto, audição, tacto e paladar. Estão, portanto, equipados para processar e experienciar sensações negativas… e positivas. Ou seja, os animais sentem, evitam a dor e o sofrimento, procuram o prazer e o bem-estar.
Jonathan Balcombe (etólogo, biólogo e autor de dezenas de artigos científicos e livros na área do comportamento animal) destaca a brincadeira, a comida, o toque, o cortejo e o sexo, o amor, o conforto e o companheirismo como as formas privilegiadas de os animais buscarem e experienciarem sensações de prazer e estados emocionais positivos. Recorrendo a inúmeros exemplos provenientes das mais variadas espécies, a mensagem a retirar é que, enquanto seres sensíveis, todos os animais desejam, à sua maneira, bem-estar e qualidade de vida. Todos os animais desejam uma vida que valha a pena ser vivida.
O conhecimento e a consciência sobre estes factos conduzem à reflexão sobre o impacto de algumas práticas humanas na vida dos animais. Em tantas circunstâncias, temos o poder de afectar directamente a sua existência e qualidade de vida. Citando António Menezes Cordeiro (no Tratado de Direito Civil Português): “A sensibilidade é um todo. Não é pensável ser-se cruel para com os animais e bondoso para com as pessoas: uma coisa implicará a outra. (…) O ser humano sabe que o animal pode sofrer; sabe fazê-lo sofrer; sabe evitar fazê-lo. A sabedoria dá-lhe responsabilidade”.
Alargando esta ideia para além do sofrimento, sabemos hoje que a busca de bem-estar e de sensações positivas são motivações básicas de todos os indivíduos, todos os animais, independentemente da espécie a que pertencem. Se a sabedoria nos dá responsabilidade, aceitemos então o dever: deixemos todos ter prazer em viver.

João Graça
joaodsg@gmail.com

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