Iniciativa trouxe à cidade os costumes e as profissões do Portugal rural, na sexta edição deste evento dinamizado por vários ranchos folclóricos e etnográficos do concelho das Caldas da Rainha.
Cerca de 180 figurantes de nove ranchos da região da Estremadura vestiram-se a rigor para dar a conhecer o folclore desta região dos séculos XIX e XX, num cortejo que percorreu várias zonas do centro da cidade das Caldas durante a manhã do passado sábado, dia 8 de outubro. E não houve quem não saísse à porta da loja ou viesse à varanda de casa para ver o desfile etnográfico passar, com milhares de pessoas, entre caldenses e estrangeiros, ao longo de todo o percurso, de telemóvel ou câmara fotográfica em riste, muitos deles surpreendidos com o cenário e outros a quem o que viam suscitava ternas recordações de infância. É, no fundo, essa a magia do Tradições na Vila, que traz à cidade uma viagem pelo passado rural do concelho.
Cada rancho levou recriações de profissões e costumes da época, como o varejar da azeitona, os pregões, a entoação das loas, as romarias com os círios a cavalo, as ofertas em bens alimentares ao santo nas festas populares e religiosas para pagar promessas, as desfolhadas ou descamisadas do milho, as danças do folclore português, ou ainda as brincadeiras das crianças e as “pulhas”, não esquecendo o amola-tesouras, as lavadeiras e as aguadeiras.
Os figurantes vestiram-se com trajes de trabalho ou domingueiros, de dias de festa e de vir à cidade, nesta iniciativa que pretende “mostrar a riqueza das regiões e destas tradições que existiam antigamente”, que denotam uma grande variedade de região para região, assim como a nível das próprias personalidades (“veja-se a vivacidade que as nazarenas tinham”), explica Sérgio Pereira, diretor do Rancho Folclórico e Etnográfico “As Ceifeiras” da Fanadia e coordenador da iniciativa.
O dirigente frisa que o objetivo passou também por “dignificar o folclore e dar estatuto aos grupos que participam”. Afinal, “aparecem muitos grupos que não têm cuidado com o traje e com a maneira como as pessoas se vestiam, e tudo isto é importante”.
“Somos muito criteriosos. Por exemplo, os botões que usamos não podem ser de cores e de coisas que não havia antigamente. O botão dos homens é sempre um botão de quatro furos, um botão que tem dois furos é um botão de mulher. E temos de ter cuidado com isso”, salienta o caldense.
Cada grupo ou rancho folclórico e etnográfico apresentou uma ou mais recriações, que tiveram lugar ao longo da rua Heróis da Grande Guerra, no topo da Praça da Fruta, em frente à Ermida de S. Sebastião, no Chafariz das Cinco Bicas e ainda no Largo Frederico e Pinto Basto. O Grupo Etnográfico de Danças e Cantares da Nazaré, uma estreia no evento, levou as peixeiras, as lavadeiras e o andor de Nossa Senhora da Nazaré, que, contrariamente à tradição, foi carregado por senhoras, dada a impossibilidade dos homens, em dia de trabalho, estarem presentes no evento…
O Rancho Folclórico e Etnográfico “Papoilas do Campo”, da Cela Velha (Alcobaça), outro convidado inédito, presenteou os espectadores com a cerimónia do círio acompanhada de entoação das loas.
Já o Rancho Folclórico e Etnográfico “Os Azeitoneiros” de Alvorninha, que pertence à organização, representou o varejar e o apanhar da azeitona, ao som de “Ó Solidó, Solidó”. A descamisada ou desfolhada do milho foi trazida pelo Rancho Folclórico “Flores da Primavera” do Guisado.
A curandeira Sandra Ferreira, do Rancho Folclórico e Etnográfico “As Ceifeiras” da Fanadia, foi requisitada para curar o bucho tombado de uma menina, aplicando uma folha de couve sobre a barriga da pequena paciente, enquanto pronunciava algumas rezas, mezinhas que conseguiram recuperar “um senhor que esteve morto três dias”, brincou Sérgio Pereira, ao microfone.
“Antigamente era assim. E elas curavam mesmo”, comenta uma simpática senhora de um rancho, na assistência.
As mulheres saloias também andaram a desfilar nos seus fatos domingueiros, e algumas não perderam tempo a leiloar a sua fogaça, composta pelo chamado “pão de festa”, no caso da nossa região, a ferradura, ou, como se chamava à altura, o “bolo-de-noiva”, por ser oferecido nos casamentos a todos os convidados para dar sorte, mas também por outros produtos regionais, como o vinho e o chouriço.
“Tenho aqui um bolo caseiro feito na freguesia de Salir de Matos, foi feito ontem, ‘maciinho’”, comentou Fátima Rebelo, do Rancho Folclórico “Flores da Primavera” do Guisado, que também levou uma fogaça à cabeça.
Ainda houve tempo para um pezinho de dança, no final de um cansativo dia de trabalho para uns, e de vendas pela cidade, para outras, em belos bailaricos ao som da música popular providenciada pela banda composta por gaiteiros, acordeonistas, viola, ferrinhos, reco-reco e tambor.
Para o ano, a aldeia há de voltar à cidade, para mais momentos de feliz recordação ou de aprendizagem destas tradições únicas da cultura portuguesa, recriadas colaborativamente e “sem bandeira” entre os diversos grupos. Porque o mais importante é desfrutar do momento e voltar a exacerbar o sentimento pelas tradições do nosso povo.































