Peniche tem os maiores estaleiros privados de construção naval do país

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notícias das CaldasOs Estaleiros Navais de Peniche são a primeira empresa privada deste sector de actividade, já que os estaleiros congéneres de maior dimensão – Estaleiros de Viana do Castelo e Arsenal do Alfeite – são de capitais públicos.
Em 2010 esta empresa, que emprega 210 trabalhadores, facturou 12,5 milhões de euros, dos quais 9,1 milhões provenientes das exportações. Teve lucros de 56 mil euros.

No dia 4 de Agosto está prevista a chegada a Maputo do Índico I, um navio de carga que zarpou do porto de Peniche no passado dia 29 de Junho. Foi nos estaleiros desta cidade que foi construído e faz parte de um contrato com o governo de Moçambique que inclui o fornecimento de um segundo navio idêntico, uma lancha de 29 metros e dois ferries para passageiros destinados ao Lago Niassa e a Cahora Bassa que fazem parte da lista.
“Estas encomendas aconteceram devido à necessidade de Moçambique reequipar o seu transporte marítimo e aproveitando as linhas de crédito, estabelecidas entre o Estado português e o moçambicano”, diz Carlos Mota, presidente dos Estaleiros Navais de Peniche (ENP), para quem só graças a estes acordos entre Estados tem sido possível construir navios para os mercados africanos.
Para Angola vai ser construída em Peniche uma doca flutuante no valor de 7,3 milhões de euros, que vai ser rebocada para Luanda onde será montada. Acompanhando este negócio, este empresário diz que perspectiva-se também a recuperação do estaleiro da Soconal na ilha de Luanda, destinado a apoiar a frota artesanal e semi-industrial daquele país, bem como a própria possibilidade de os ENP virem a assumir a própria exploração destes estaleiros.
“A nossa internacionalização, que até agora tem sido só de fornecedores de bens de equipamento, entraria assim numa fase em que nos assumiríamos também como prestadores locais de serviços de reparação naval”, diz o empresário.
Com uma vocação claramente africana, os ENP viraram-se também para a Argélia, país que deverá receber duas lanchas de apoio ao trabalho portuário, também “made in Peniche”. É um negócio de apenas 800 mil euros, mas Carlos Mota diz que pode ser o início de um fornecimento de 9 milhões de euros se, entretanto, vier a ganhar um concurso para o fornecimento de 18 lanchas.
Esta aposta de internacionalização em África levou a que nos últimos três anos estes estaleiros tivessem já fabricado 16 traineiras para Angola e nove water táxis para a Nigéria, Moçambique e Senegal.
Indonésia pode representar negócio de 60 milhões de euros
No mercado asiático os estaleiros de Peniche estão prontos para fabricar 60 lanchas para fiscalização, busca e salvamento destinadas aos mares da Indonésia. Mas este contrato está pendente da disponibilização de uma linha de crédito para aquele país.
“Portugal está há dois anos a negociar com a Indonésia acordos de cooperação e chegou a estar prevista uma visita oficial com o governo de Sócrates aquele país, para a qual fomos convidados. Como não se realizou, fomos lá por nossa conta e risco e as nossas diligências traduziram-se na possibilidade de um contrato de 60 milhões de euros, mas esperamos agora que o sucesso das negociações Portugal-Indonésia venham a consagrar um quadro financeiro propício ao financiamento destas exportações”, diz Carlos Mota.
No mercado português conta-se o fabrico de quatro lanchas de piloto para a administração dos portos da Terceira e Graciosa e para as barras do Douro e de Leixões, bem como o apetrechamento final do Sacor II, um navio da Galp para distribuição de combustível na costa portuguesa e que constitui para o ENP um contrato de 1,7 milhões de euros.

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REPARAÇÃO PERDE IMPORTÂNCIA

A componente reparação tem vindo a perder peso na actividade dos ENP. No ano passado, num total de 12,5 milhões de euros de volume de negócios, esta actividade representou apenas uma facturação de 2,7 milhões de euros.
Sinal do declínio da actividade pesqueira é que as reparações significaram apenas 765 mil euros dessa facturação, tendo os restantes 1,9 milhões de euros resultado da reparação de ferries, pequenos navios de carga e embarcações ligadas às actividades portuárias.
Mas para 2011 está já fechado um contrato com um armador norueguês para a reparação de um navio por 1 milhão de euros.
Também de 1 milhão de euros e igualmente para um cliente nórdico é o valor do contrato com uma empresa finlandesa para a montagem de um equipamento para produção de energia através das correntes submarinas.
Para responder às encomendas moçambicanas, os estaleiros de Peniche investiram em 2010 mais de quatro milhões de euros – “sem qualquer apoio oficial”, sublinha Carlos Mota – na construção de uma nova doca para receber navios de maior porte e na modernização e ampliação de toda a sua linha de aço.
Um investimento que não se traduz directamente num aumento do imobilizado no seu balanço, uma vez que os ENP operam num espaço concessionado pelo Instituto Marítimo Portuário e dos Transportes Marítimos, ao qual pagam 200 mil euros por ano. “O nosso património resume-se aos bens de equipamento móveis”, diz Carlos Mota.

 

Europa é proteccionista mas Portugal é uma má excepção

A União Europeia, que deveria ser o baluarte do livre mercado e da concorrência perfeita entre os seus estados membros, porta-se no sector naval como o mais proteccionista dos mercados.
É isso que constata a experiência de Carlos Mota que diz haver uma relação afectiva dos países com os seus estaleiros navais que leva a esse proteccionismo.
“É praticamente impossível assegurar uma encomenda no mercado europeu porque há um proteccionismo de cada um dos países para salvaguardar para os seus estaleiros o mercado interno”, diz o empresário, que lamenta que Portugal seja a excepção. “Ainda recentemente o Governo Regional dos Açores abriu um concurso com um valor base de 18 de milhões de euros, para comprar dois ferries para apoio ao transporte inter-ilhas do qual, na prática, excluiu os estaleiros nacionais com as imposições colocadas a nível do caderno de encargos”, diz.
No seu relatório de contas de 2010 a empresa lamenta a ”irrelevância” do mercado nacional e “verbera, muito veementemente a irresponsabilidade com que as empresas de capitais públicos organizam os concursos para as novas construções, num manifesto desprezo impune pela salvaguarda do interesse nacional”.
Para Carlos Mota a concorrência entre os estaleiros portugueses não é um problema. Sobre a situação dos de Viana do Castelo, diz apenas desejar que a solução encontrada para a paralisia em que se encontram, não aconteça, “uma vez mais exclusivamente à conta do orçamento do Estado”. É que, refere, em Viana é o Estado que paga a factura e que arranja os clientes para os estaleiros. Em Peniche, é ele próprio que procura encomendas pelo mundo inteiro.

 

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