
Os países europeus, em particular a então República Federal da Alemanha, tiveram um papel fundamental no 25 de Abril de 1974 porque souberam aproveitar o clima de desanuviamento da Guerra Fria e permitir um desenrolar positivo dos acontecimentos em Portugal. Quem o diz é o investigador caldense Luís Nuno Rodrigues que foi o orador numa conferência que teve lugar no dia 29 de Abril nos Paços do Concelho, na qual falou sobre o contexto internacional onde se inseriu a Revolução dos Cravos.
Um dos actores decisivos que contribuiu para a Revolução de Abril e consequentes desenvolvimentos foram os países da Europa Ocidental, com destaque para a então República Federal da Alemanha. “Estes perceberam quais eram as forças políticas em jogo em Portugal e distinguir com clareza as diferenças entre o Partido Socialista e o Partido Comunista Português”, disse Luís Nuno Rodrigues acrescentando que os países europeus decidiram, a nivel interno, “dar o seu apoio ao bloco civil e militar moderado”. O primeiro era liderado pelo PS e por Mário Soares e o segundo era representado pelo Grupo dos Nove (integrado por oficiais que pertenciam ao MFA e que tinham uma tendência política moderada) e liderado por Ramalho Eanes. Desta forma, os países europeus “opuseram-se à eventual tomada do poder por parte do Partido Comunista” tendo contribuido para que se estabelecesse em Portugal “um regime de democracia pluralista do tipo ocidental”.
Segundo o investigador caldense, que dirige mestrados em doutoramentos em História Contemporanea no ISCTE, os países da Europa também tiveram um papel decisivo para convencer os EUA que “eram estas as peças do xadrez político em Portugal”. Aconselharam também a administração americana a não interferir na política interna portuguesa, como fizeram noutros países. Os EUA poderiam tentar derrubar o General Spínola, que se encontrava exilado no Brasil.
Por fim, ainda convenceram a União Soviética de que não valia a pena “pôr em causa os equilibrios alcançados” durante o período da Détente (desanuviamento) da Guerra Fria e que tiveram lugar entre 1962 e 1979.
Os representantes dos países ocidentais defenderam que “não seria correcto” apoiar em Portugal um regime pró-soviético “num país que era membro e fundador da NATO”.
O 16 de Março: militares divididos
Luís Nuno Rodrigues considera que o 16 de Março foi um episódio interessante da Revolução de Abril, sobretudo para os caldenses, dado que a intentona “partiu daqui”. De qualquer forma, este golpe “foi uma tentativa antecipada de fazer cair o regime anterior que não foi bem sucedido”. O académico caldense atribui o insucesso ao facto das operações militares não terem sido bem planeadas tal como aconteceu, sob coordenação de Otelo Saraiva de Carvalho, nas semanas posteriores e que obteve bons resultados a 25 de Abril.
Também tendo em conta as investigações mais recentes, o 16 de Março “já espelhava uma certa divisão entre os militares do MFA”, disse o convidado, acrecentando que o Golpe das Caldas “terá sido preconizado pela ala spinolista e que de, alguma maneira, tentou antecipar o 25 de Abril, só que não foram secundados pelos seus camaradas”. No entanto, foi tudo uma questão de aguardar alguns dias até que a democracia fosse instaurada em Portugal.
O investigador concorda que o 16 Março – que foi notícia em vários meios de comunicação internacionais – permitiu à Europa e ao mundo recordar que Portugal “ainda vivia em ditadura”. Como tal, considera que a mediatização do Golpe das Caldas funcionou como alerta para o facto de “a robustez do regime já não ser a mesma que se viveu no periodo anterior à guerra colonial”. Agora existiam tensões subterrâneas na sociedade e nas Forças Armadas que, a prazo, “podiam pôr em causa o próprio regime como viria a acontecer, poucas semanas depois”.
Alerta com os novos populismos

Já na fase das questões do público houve quem questionasse o orador sobre a ascensão dos partidos populistas. O historiador respondeu que, apesar desse fenómeno existir em alguns países da Europa e nos próprios Estados Unidos, “até hoje a democracia não foi suprimida em nenhum dos países ocidentais”. Luís Nuno, apoiando-se na História, constata que na sequência de períodos de crise económica e de transformações sociais surgem as crises políticas e a ascensão dos nacionalismos. No entanto, não considera que as instituições democráticas estejam em perigo directo. E como cidadão, afirma que aqueles que acreditam na democracia não podem baixar os braços e têm o dever de defender os seus valores, na rua, nas escolas e nas instituições. “Devemos fazê-lo todos os dias e a todas as horas”, reforçou.
Sob o ponto de vista académico, o investigador considera que há uma nova geração de movimentos de extrema direita, tal como se pode verificar em França. Mas não são herdeiros directos dos movimentos nacionalistas e fascistas do século XX. Os novos movimentos “não pretendem subverter a democracia nem instaurar ditaduras”, referiu. O historiador considera que estes têm uma agenda de extrema direita, sob o ponto de vista social, económico e das relações internacionais “mas parecem estar dispostos a jogar o jogo político democrático”. Na sua opinião, é preciso estar atento ao que acontece. Luis Nuno Rodrigues referiu-se ao que está a acontecer nos EUA onde o actual Presidente é “menos respeitador dos formalismos da vida democrática”. No entanto, o próprio Presidente tem sido posto em cheque pelo bom funcionamento das próprias instituições democráticas que têm mais pergaminhos do que as portuguesas. Por cá, o historiador caldense não antevê problemas de maior com populismos, dado que não há partidos de extrema direita “com votação expressiva”, rematou.






























