ontem & hoje

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Postal Ilustrado – Dias & Paramos

A praça 5 de outubro, mais conhecida como praça do peixe, começou por se chamar praça nova, por comparação com o antigo Rossio, a praça, onde se realizava (e realiza) o mercado diário. Nos finais do século XIX, altura em que as termas das Caldas da Rainha estavam na moda e a vila era frequentada pelas elites nacionais, fizeram-se várias intervenções urbanísticas, dotando-a de novos equipamentos como os hospitais – Termal e de Santo Isidoro – os Pavilhões e o Parque, o Hotel Lisbonense, o Teatro Pinheiro Chagas, a Praça de Touros, entre outros.
A praça nova data dessa época, ao mesmo tempo que se intervinha na antiga praça, então já designada Praça Maria Pia (mais tarde, Praça da República), através do respetivo calcetamento. Em 1896 (10/5), no jornal O Círculo das Caldas, dizia-se em artigo intitulado “Mercado das Caldas” que este devia deixar de se realizar ali, agora que a praça estava “muito bem calçada e com elegantes passeios”. No mesmo artigo defendia-se ser prejudicial para as termas a realização do mercado em zona que lhes era tão próxima, referindo que “cascas de melancia e outras coisas” ficam espalhadas pelo chão, até mesmo na rua Direita (atual rua da Liberdade), e que isso constituía um perigo para quem se dirigia para o Hospital Termal.

Joaquim António Silva (2011)

A hipótese de o mercado passar a realizar-se na nova praça tornou-se “o assunto mais palpitante da vila”. As opiniões dividiram-se quanto a essa decisão: “Os da Praça Maria Pia queixam-se e os habitantes da Praça Nova louvam-na.” (O Círculo das Caldas – 10/10/1897) Acaba por vencer a solução de compromisso: os legumes e a fruta continuam a ser vendidos na antiga praça enquanto a venda de animais, com destaque para o peixe, naturalmente causadora de maior sujidade, é remetida para praça nova.
Passado algum tempo, no mesmo jornal, a 7 de maio de 1899, é noticiado o seguinte:
“A Sociedade Dramática Caldense vai emitir uma série de acções na intenção de angariar fundos para a conclusão do teatro há tantos anos começado. Oxalá que os caldenses auxiliem tanto quanto lhes seja possível o empreendimento da Sociedade Dramática que, como todos reconhecem, a falta de um teatro razoável é um dos fastos que mais sensíveis se tornam nesta vila.”
Numa época (finais do século XIX) marcada por um forte associativismo – ativo e diversificado – é interessante notar quanto a população se juntou em torno deste projeto da Sociedade Dramática Caldense, encontrando várias formas de financiamento para além da referida, revertendo todas a favor da construção do teatro. Este veio a ser inaugurado em 1900 e contou com a participação de Rafael Bordalo Pinheiro como decorador. A sua construção valorizou decisivamente aquele espaço urbano. Durante anos foram ali realizados os mais variados espetáculos performativos e, mais tarde, exibidos filmes.
Em 1902 a Praça Nova passou a chamar-se Praça Hintze Ribeiro (dirigente político do Partido Regenerador, monárquico) e, na sequência da implantação da República, em outubro de 1910, viu o seu nome mudado para Praça Almirante Cândido dos Reis. No ano seguinte (1911), a designação passou a ser a que agora possui: Praça 5 de outubro, em homenagem ao dia da implantação da república.
Entretanto, volvido um século, na década de 90 do século XX, deixou de se realizar ali o mercado do peixe e o Teatro Pinheiro Chagas foi demolido, após um longo processo de degradação. Não se tratando de uma das zonas mais emblemáticas da cidade – chegou a servir de parque de estacionamento de automóveis em quase toda a sua extensão – a praça 5 de outubro consegue atualmente uma inusitada animação noturna, principalmente aos fins de semana, mercê das esplanadas e dos bares da zona, muito frequentados por jovens.
Agora, em agosto de 2012, olhando com atenção as duas imagens publicadas neste jornal, penso que ninguém diria tratar-se do mesmo lugar fotografado em duas épocas diferentes, mesmo que muito distantes no tempo, tão grande é a transformação ocorrida! O Teatro Pinheiro Chagas já lá não está; a volumetria dos prédios é outra, marcadamente heterogénea; o tabuleiro empedrado é agora ocupado por equipamentos urbanos de vários tipos: desde a entrada para o parque de estacionamento subterrâneo ao pequeno anfiteatro ao ar livre. Do passado não resta memória, nem que seja a de um pequeno apontamento que se tivesse deixado ficar. Quem diria que seria possível modificar de modo tão radical a fisionomia de um lugar! Qualquer semelhança é pura coincidência…

Isabel Xavier

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