ontem & hoje

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Postal Ilustrado - década de 1920 Espólio da Biblioteca Municipal das Caldas da Rainha (col. V. Trancoso)
Joaquim António Silva - 2013

Grandela descobriu a Foz nos últimos anos do século XIX, quando frequentava as Termas das Caldas, por conselho médico, para recuperar de uma fractura numa perna. Julgamos que tal tenha ocorrido em 1897, pois o jornal O Circulo das Caldas noticiava na sua «crónica balnear» de 18 de Julho desse ano que Luis Grandela estava nas Caldas da Rainha. Pensamos que se tratava de Francisco Grandela, pois quando assinalaria, mais tarde, a recepção da revista Passatempo (dos Armazéns Grandela), aquele semanário citaria novamente, por engano, o nome de Luis como sendo o conhecido comerciante e proprietário dos Armazéns Grandela.
Como se achasse melhor, Grandela fez um passeio de burrico até á Foz do Arelho. Ficou de tal modo deslumbra­do com a paisagem, que logo quis adquirir um terreno na localidade. Tomou-se foreiro de um terreno da «Quinta da Foz», propriedade de Francisco Paiva Magalhães de Vas­concelos Bemardes, que era o dono, naquela altura, de praticamente toda a área entre a povoação e o mar.
Em 8 de Fevereiro de 1898, FAG escreveu a Paiva Magalhães, pedindo autorização para fazer uma «pe­quena» casa na Foz, junto á lagoa, num dos montes que lá existiam e que «parecia uma pedreira de saibro».
Em 22 de Junho do mesmo ano já tinha começado a construir o futuro palacete, quando auscultou nova­mente Paiva Magalhães, por escrito, sobre a possibilidade de levar a cabo uma ideia que partilhara com o seu amigo Sarrea Prado: edificar um conjunto de habitações na enseada da lagoa, em frente da sua nova construção, por entre as quais circulariam canais – que a lagoa se encarregaria de encher – tal como «em Veneza ou em Amsterdam».
Não sabemos se também imaginava alguma contra­partida lucrativa para ele próprio, mas sabemos que Grandela insistiria mais tarde, em 7 de Março de 1912, em O Circulo das Caldas -, na ideia de uma Foz à imagem de Veneza, a propósito da casa (ao lado da Escola) que ali estava construindo o seu amigo Joaquim Frutuoso.
Esta era uma das suas propostas para transformar aquela terra numa bela estância turística, para a qual via a necessidade de um «plano geral» que obstasse que a povoação ficasse com «aleijões» que se poderiam evitar atempadamente.
O seu palacete pintado de amarelo foi erigido sobre um local onde existira um barracão, e no qual se arrecada­vam as bateiras e galeotas reais, destinadas aos passeios ou caçadas da família real na lagoa.
A secção central ficou pronta em 1899. A primeira ampliação, em direcção ao mar  ficou pronta em 1902. A segunda – em direcção oposta – estava em construção em 1907 fi­cando com a sua versão final (fig. da esquerda) pronta, provavelmente, ainda nesse ano. Em cada uma des­tas últimas fases foi construído um torreão em cada um dos extremos da casa. Os tor­reões receberam a denominação de «Torre de Mena­gem» e «Torre de Cimancas».
Segundo o próprio FAG (em O Passatempo de 25 de Abril de 1902) o «desenhador», das duas primeiras fases, foi Henrique de Freitas e Silva – seu cunhado, casado com a irmã Matilde – e «mestre de obras» Manuel Pereira. O «mestre de carpinteiros» chamava-se Louzada e a cantaria das janelas foi trabalhada por João Ramos, da Batalha. O palacete era ornado com janelas manuelinas (estilo que muito apreciava) e rodeavam-no cerca de 10 quilómetros de ameias. Um amplo salão percor­ria-o a todo o comprimento.
No «hall» de entrada existia um vitral de cristal azul e branco representando um guerreiro antigo com lança, e um escudo com a inscrição «FAG». As paredes eram ornadas com panóplias de armas diversas e com inúmeros quadros. Quadros da autoria de FAG, de Tomás de MeIo, de Roque Gameiro, entre muitos outros. Duas das pinturas eram atribuídas a EI Greco e uma ao pintor flamengo do seco XV Hans Memeling.
No salão grande, arcos suportados por colunas delimi­tavam uma galeria lateral na qual se instalaram duas enormes lareiras encimadas pela estatueta da loba com Rómulo e Remo. À direita da entrada neste salão, ex­punha-se um cofre de cristal e prata guardando docu­mentos inéditos do seu escritor favorito: Alexandre Her­culano.
Foi a primeira casa que alguém, vindo de fora, cons­truiu na Foz do Arelho e que Grandela desejava que fosse o início de uma povoação balnear, que viesse no futuro a ser importante.
Após o falecimento de Grandela (1934) o Palacete, foi vendido, em Março de 1940, depois de leilão do recheio, por 80 contos transformando-se poste­riormente na colónia de férias da F.N.A.T «Marechal Carmona» (fig.da direita).

Vasco Trancoso

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