
Em 1 de Agosto de 1887 iniciou-se a exploração do troço da linha do Oeste de Torres a Leiria. Nesse dia Caldas da Rainha ficou ligada a Lisboa por caminho-de-ferro. Quase um ano depois poder-se-ia ir de comboio à Figueira da Foz e, em 1889, também directamente a Coimbra.
Tendo tido a sua origem como uma concessão concorrente à da Companhia Real Portuguesa (a futura CP), a qual já explorava, entre outras, a linha de Lisboa ao Porto, a linha do Oeste pretendia servir o populoso litoral da Estremadura, o qual havia sido negligenciado pela principal linha ferroviária do país quando se escolheu utilizar o vale do Tejo para atingir o seu objectivo primeiro: a ligação com Espanha. Num negócio algo nebuloso, envolvendo altas figuras do Estado, a Companhia Real acabou por ficar com a posse da concessão concorrente, integrando a linha do Oeste na sua rede.
A primeira imagem data do virar do século XIX para o século XX e retrata a estação das Caldas com um comboio misto (isto é, um comboio transportando mercadorias e passageiros das três classes então existentes) sendo formado para a sua viagem com destino à capital. Nesta época havia quatro comboios por dia em cada sentido e, num comboio misto, como o da imagem, parando em todas as estações e não ultrapassando os 50 km/h, demorava-se cinco horas a chegar a Lisboa e para Coimbra eram sete horas de viagem. Nos comboios mais rápidos – que com dificuldade atingiam pontualmente os 100 km/h – demorava-se menos duas horas em cada um dos percursos referidos, ou seja, três horas para Lisboa e cinco horas para Coimbra.
Desde os seus primórdios até à década de 1920, no sistema de transportes o caminho-de-ferro era então designado como “viação accelerada”, por oposição à “viação ordinaria” que se processava nas estradas. Esta última fazia-se a pé, no lombo de animais, ou em veículos de tracção animal. Por isso, e comparativamente, os tempos de viagem por comboio eram, obviamente, “accelerados” e não havia necessidade nem pressão para que fossem ainda mais rápidos. Mesmo os poucos automóveis que existiam não tinham estradas que permitissem viagens às velocidades que aqueles permitiriam e, de resto, eram ainda da posse de apenas um punhado de afortunados.

Por isso, o caminho-de-ferro, virado sobre si próprio e deslumbrado pelo seu monopólio primitivo, foi mantendo ao longo dos anos os seus sistemas habituais de exploração, com comboios mais ou menos ronceiros e parando em todas as estações, até que, a “viação accelerada” passou a ser a rodovia. Pelo menos no Oeste.
A segunda imagem, mostra-nos a estação das Caldas na actualidade. Por comparação com a primeira foto, lá está em primeiro plano o antigo dormitório e a cocheira de carruagens; o edifício da estação propriamente dito é uma ampliação do original feita em 1925 segundo projecto de Perfeito de Magalhães; o antigo depósito de água para abastecimento das locomotivas a vapor foi substituído em 1948 por um em betão armado; o plano de vias da estação foi completamente remodelado na década de 1990 durante a renovação integral da via feita na linha do Oeste, que lhe deu uma infra-estrutura em boas condições, do Cacém ao ramal de Alfarelos.
Mas, apesar das aparências, pouco mudou. Lá está na estação o mesmo comboio ronceiro. Só que agora já não leva mercadorias nem passageiros das três classes. Tomou a forma de uma automotora, transportando passageiros democraticamente em classe única, mas com ar condicionado de 1ª, conforto de 2ª e espaço nos assentos de 3ª. E continua a arrastar-se entre cada paragem em todas as estações, não ultrapassando os 100 km/h, mas agora muito aquém das possibilidades da linha. Demora menos 1 hora do que há 100 anos, mas a actual “viação accelerada” agora tem auto-estradas…
Nelson Oliveira
(este texto não segue deliberadamente o novo Acordo Ortográfico)































O maior erro foi a construção da linha não ser directa a Coimbra.