ontem & hoje

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Joaquim António Silva - 2012
Postal ilustrado - ca. 1920

O Parque D. Carlos I permanece como um documento emblemático, pois além de estar intrinsecamente ligado à história das Caldas desde a sua fundação, ele está, de uma forma ou de outra, enraizado na memória de cada caldense, nas suas vivências, nos seus sonhos, descobertas e conquistas.
Nem sempre foi um parque. Durante muito tempo era chamado de “ Passeio da Copa” e só no século XIX, com Rodrigo Berquó, então Administrador do Hospital Termal, se passou a denominar Parque D. Carlos.
No entanto, desde a sua fundação, o Hospital dispunha de um espaço arborizado utilizável para convalescença e divertimento dos seus banhistas, onde o lazer e o divertimento se integravam numa estratégia terapêutica, sendo o parque um elemento complementar da ação hidrológica, sobretudo a partir do século XVIII.
Armando da Silva Lopes, na sua obra Noticia do que foi ontem e do que é hoje a vila de Caldas da Rainha, escrita em 1873 tece os maiores elogios a este espaço, nomeadamente à Rua Andrade, representada nas fotografias apresentadas, escrevendo “(…) os passeios são belos, elegantes, seu arvoredo frondoso rivaliza com os melhores, (…)leva a uma extensa e larga rua perfeitamente arborizada e guarnecida lateralmente por duas ordens de buxo, o que lhe dá uma beleza espantosa. Aqui o passeante está perfeitamente a coberto do sol, esta rua denomina-se Rua do Andrade. Este passeio foi mandado fazer em 1799 pelo administrador Dr. António Gomes da Silva Pinheiro”.
Nestes tempos, era moda ir às termas para tratamento e divertimento, assim o afirmava Ramalho Ortigão “ a moda casa o frémito dos leques e a palpitação dos espartilhos com o ramalhar dos choupos”.
A grande procura dos grupos dirigentes, aristocratas, políticos, estrangeiros, poetas e demais pessoas ilustres, obrigaram ao crescimento e consecutivas reestruturações do Parque.
Durante a época balnear, a vida social decorria a maior parte do tempo no parque da cidade e no clube, ali construido em 1837. Além dos passeios, os banhistas partilhavam ideias, poemas, música, e jogos como o whist, o boston, o croquet, o arquinho, à sombra dos plátanos e das faias. O dia prolongava-se noite adentro no clube, com bailes, jogos de cartas, concertos e mais conversas.
Nos finais do século XIX, o Parque dispunha também de campo de ténis, recinto de patinagem, carreira de tiro e o lago artificial. Este espaço, que nascera para convalescença dos doentes do hospital, pobres ou ricos, vai valorizando em crescendo a sua componente lúdica em desprimor da terapêutica.
A partir dos meados do século XX, o Parque abre as suas portas essencialmente para a população caldense. Continua a ser um espaço belo, arranjado e cheio de atrações lúdicas.
Observando atentamente os Parque de hoje, verifica-se que este espelha uma nova realidade social Os anos passaram e as relações tornaram-se mais individualistas, com um ar de modernidade ‘hi-tech’, modificando o modo de entretenimento onde as telecomunicações e o mundo da informática tornaram o conceito de lazer em algo de contemplativo, e a oferta de espaços fechados, como os shopings, as discotecas e os bares criaram uma nova lógica de ocupação de tempos livres, algo organizado, produtivo e consumível, logo lucrativo.
Observando uma vez mais o Parque de hoje, verifica-se que as árvores continuam lá, de pé.
Tenho para mim que, apesar da crise, há ainda alternativas para o gozo ou lazer para pessoas autónomas e saudáveis, seres sociáveis, que podem descontrair-se, eliminando o cansaço de modo salutar.
Dizem-me que quando falo do Parque transmito uma grande ternura… É verdade, pois este Parque tem-me acolhido, sempre, maternalmente, de ramagens abertas.

Dulce Soure

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