ontem & hoje

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Em 1950 começou a construção da Igreja de Nª Sª da Conceição, tendo sido inaugurada em 1951. Estava localizada num verdadeiro descampado, zona desértica e muito isolada. Como consequência da urbanização do Borlão iniciada em 21 de outubro do mesmo ano, a rodear a Igreja ficou uma artéria em forma de U, designada por Rua Hemiciclo Frederico Ulrich, em honra do ministro das Obras Públicas do Estado Novo que estava no governo na altura, e, posteriormente, Rua Hemiciclo Guiné-Cabo Verde, possivelmente em lembrança da descoberta destes países pelos Portugueses no século XV. Em 1982, altura em que o Papa João Paulo II visitava Portugal pela primeira vez no âmbito de uma peregrinação do 13 de maio, a Câmara Municipal das Caldas da Rainha decidiu que passaria a designar-se Hemiciclo João Paulo II, nome que se mantém atualmente (2ª Fotografia).
Nos anos 90, a Igreja Paroquial foi autorizada pela autarquia a utilizar o terreno junto à sacristia para construção do centro pastoral, visível na fotografia mais atual.
Os tempos mudam, as paisagens urbanas modificam-se, os desafios que o ser humano tem de enfrentar, muitas vezes devido às suas próprias opções, são só situações que ele próprio também deverá procurar ultrapassar.
Vim residir a 28 de agosto de 1962, para a Praça Marechal Carmona, antigo Borlão, e hoje Praça 25 de abril. Ao longo dos sete anos anteriores e todos os meses de agosto, fazíamos as malas para a viagem de comboio de Queluz para as Caldas. Os nossos ilustres ancestrais caldenses, do lado do meu avô materno, como José Francisco de Sousa, José Augusto de Sousa e Anselmo Fausto de Sousa, chamavam-nos!
Lembro-me de brincar nas arcadas da casa onde hoje vivo, das minhas aulas de catequese, e de outras cerimónias religiosas na Igreja Paroquial.
De uma das janelas do meu antigo quarto via-se uma parte lateral do Tribunal Judicial da Comarca de Caldas da Rainha que se observa na fotografia atual, em frente à Igreja. Foi inaugurado a 01 de dezembro de 1959 e lembro-me que, nas suas traseiras, se encontrava um descampado interrompido por um ou outro poço e ladeado por muros que delimitavam quintais de pequenas urbanizações, algumas das quais se encontram ainda hoje.
Vêem-se, na fotografia mais atual, alguns dos prédios que delimitam a Rua António Sérgio, atrás do Tribunal.
É curioso que era no antigo campo do Borlão do início do século XIX, próximo da então Vila das Caldas da Rainha, que, durante as invasões francesas, se realizavam fuzilamentos. Hoje, nesse mesmo local, contornando a praça onde no centro existe uma rotunda ajardinada, está a Igreja, o Tribunal e o edifício albergando a Câmara Municipal e as Finanças, entre outros serviços!
Recordo os antigos colegas do Colégio Ramalho Ortigão onde estudei quando vim para as Caldas e que já não se encontram a residir no Borlão hoje.
Lembro-me do dia 15 de maio de 1971 em que o Presidente da Câmara de então, Eng.º Paiva e Sousa, inaugurou, na atual rotunda do Borlão, uma estátua do Marechal António Óscar de Fragoso Carmona, aquando da comemoração do centenário do seu nascimento. Os tempos passam, a vida dá muitas voltas e eu, após ter ido para Angola, onde comecei a lecionar, entre junho de 1973 e março de 1975, regressei nesse ano a Caldas da Rainha. Quando cheguei, a estátua fora retirada, estando hoje, no seu lugar três plantas, sendo a do meio, a mais resistente às intempéries, uma pequena palmeira.
Assisti à evolução das obras do novo edifício da Câmara Municipal de Caldas da Rainha, desde o seu início, em 1981 na Praça 25 de abril, até à respetiva inauguração, a 15 de maio de 1992.
No antigo campo do Borlão, inicialmente frio e desértico, hoje podem-se ver prédios com varandas alindadas com vasos cheios de plantas floridas, e, em alguns deles, ninhos de andorinhas junto ao telhado. Existem na praça canteiros ajardinados com plantas de diversas espécies, uma palmeira já antiga e dragoeiros, junto ao edifício da Câmara Municipal, uma oliveira no recanto perto do Café Maratona, árvores que timidamente teimam em rodear a Igreja, apesar de já terem sido ameaçadas algumas delas, o buxo, visível na fotografia mais atual, e alguns agapantos, de um dos lados da escadaria do Tribunal. O verde alinda e embeleza dando cor e alegria, purifica o ar mais ou menos poluído pelos carros circulando junto à Igreja e na Praça, dá cheiro agradável na primavera e sombra fresca em dias de demasiado calor no verão; é, em muitos casos, local de nidificação e habitat de aves como os melros que saltitam de ramo em ramo, polinizam algumas flores e por vezes passeiam nos relvados da rotunda, ou entre os canteiros. Os pombos esvoaçam entre as varandas dos prédios, as árvores, os fios elétricos e os candeeiros, o Tribunal, a Câmara e a Igreja, ora passeando, ora procurando atarefadamente alimento deixado por quem passa nas ruas e passeios.
A fachada da Igreja e as torres sineiras continuam na mesma, ontem e hoje, apenas necessitando de uns retoques na pintura de vez em quando, fruto do tempo.
Hoje o local onde vivo é o mesmo onde cresci e é interessante pensar em toda uma história passada de uma das zonas mais importantes da cidade e nos projetos que se esboçam para o futuro que se avizinha.
Nós vamo-nos modificando com a idade e, após um certo tempo de vida, poderemos assistir, por exemplo, a alterações num determinado local da cidade, tendo oportunidade de registar e compartilhar experiências passadas e presentes, relembrar fatos históricos, sentimentos e emoções. Esta poderá ser uma das mais belas vertentes do envelhecimento humano!

Mercês Silva e Sousa

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