O que tem as Caldas da Rainha a ver com a descoberta da Austrália?

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Atribui-se a descoberta da Austrália ao navegador holandês Willem Janswoon, em 1606, embora esta não seja uma verdade absoluta porque há historiadores que acham provável que navegadores portugueses tenham aportado aquele continente 80 anos antes.
Mas uma descoberta recente veio dar um novo alento a esta tese: trata-se de um manuscrito português, que terá sido feito entre 1580 e 1620, que tem um desenho de um animal que parece ser um canguru. E, como todos sabem, cangurus só mesmo na Austrália.
E o que tem esta história a ver com as Caldas? O facto deste manuscrito (um livro de orações em tamanho de bolso) ter pertencido a uma alegada freira das Caldas da Rainha. Pelo menos é o que diz a imprensa portuguesa e estrangeira (sobretudo britânica, americana e australiana) sobre a mulher que foi proprietária do referido livro de orações.
O manuscrito foi vendido por um alfarrabista português à galeria nova-iorquina Les Enluminures, que o avalia em 11 mil euros. A imprensa anglo-saxónica diz que o livro teria pertencido a “uma freira das Caldas da Rainha” chamada Caterina de Carvalho.
Mas Gazeta das Caldas apurou que não se tratava de uma freira, até porque nunca houve nenhum convento feminino nas Caldas da Rainha). Na cidade, nessa época viveu uma Caterina de Carvalho que foi casada com Felício de Rodrigues e que foi mãe do provedor do Hospital das Caldas, frei Jorge de Brito. Este último aparece também com o nome de Jorge de S. Paulo no livro “História da Rainha D. Leonor e da Fundação das Caldas da Rainha”.
O livro de orações era para época um livro caríssimo e ao alcance de apenas uma minoria de pessoas, pelo que faz sentido que pertencesse a alguém que na época fazia parte da elite caldense.
Por outro lado, no início do séc. XVII não era nada frequente que as freiras soubessem ler. Pelo contrário, havia mosteiros em que só um número muito reduzido dessas religiosas sabiam ler e escrever.
Só uma investigação mais profunda poderá dar mais pistas sobre  quem foi Caterina de Carvalho e como lhe foi parar às mãos um livro que tem a iluminura de um canguru desenhado na letra D com que começa um dos capítulos.
Seja como foi, jornais como os britânicos The Guardian e The Telegraph, e os australianos The Age e The Sydney Morning Herald referem as Caldas da Rainha nos seus artigos sobre uma história que levanta novas questões sobre quem descobriu a Austrália.
A especialista em manuscritos, Laura Light, diz no The Age (citado pelo Público) que “o canguru num manuscrito tão antigo prova que o seu autor ou esteve na Austrália ou, ainda mais interessante, que relatos de viajantes e desenhos de curiosos animais que podiam encontrar-se neste novo mundo estavam já disponíveis em Portugal”.
O historiador Peter Trickett, que escreveu um livro onde defende que foi o navegador português Cristóvão de Mendonça quem primeiro pisou as praias australianas, diz que “não é nada surpreendente que a imagem de um canguru tenha aparecido em Portugal no final do séc. XVI”.
O desenho do canguru (sobre o qual também não há acordo que se trate realmente desse animal) aparece no livro de orações de Caterina de Carvalho atrás da letra D. O mais surpreendente é que neste livro de bolso, esta letra na qual aparece a iluminura não ocupa mais que o tamanho de uma unha.

Carlos Cipriano
cc@gazetadascaldas.pt

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