É com um sorriso rasgado que o pároco de Óbidos, A-dos-Negros e Gaeiras assume trocar regularmente mensagens por Whatsapp com mães de santos. Aliás, “jovens santos”, esclarece Ricardo Figueiredo, de 30 anos, que se dedica a escrever biografias espirituais, exercício que lhe permitiu conhecer a vida de “pessoas normais”, que morreram jovens e foram considerados exemplos de santidade.
A primeira destas biografias saiu em 2017, sobre Guido Schäffer, um médico surfista brasileiro, que faleceu em 2009. Seguiu-se uma obra sobre o venerável Carlo Acutis, que deverá ser beatificado em Outubro e faleceu em 2006, com 15 anos. Depois, escreveu sobre José Luís Sánchez Del Río, um mexicano que morreu aos 14 anos, no início do século XX. E agora segue-se mais um livro sobre uma jovem, que faleceu em 2016, mas cujos pormenores ficam por revelar.
“Serem pessoas normais é o que mais me cativa nestes casos. Ser cristão não é algo que seja estranho à nossa vida normal, mas é algo que está ao nosso alcance”, justifica o pároco.
“Por vezes, olhamos para os santos e vemos imagens angélicas e que estão acima da nós. Mas estes são jovens que viveram uma vida normal, tinham família e fizeram coisas que toda a gente faz. E, sendo normais, é interessante tentar perceber como viveram a exigência de ser cristãos”, justifica este homem, que se considera tão normal, que até frequenta o ginásio nas Caldas. “Algumas pessoas começaram por estranhar, mas agora já é um hábito”, reconhece o padre, que nasceu em Belas (Sintra) e entrou no seminário aos 15 anos.
Saiu dos Olivais aos 18 anos , quando lhe surgiram “muitas dúvidas”. Durante três anos, oscilou sobre o caminho a seguir. “Tinha dúvidas se queria ser padre e havia muitas coisas que podia fazer. Tive convites para trabalhar em empresas, mas chegou o momento em que percebi que devia colocar a minha vida nas mãos da igreja e voltei ao seminário”, relembra Ricardo Figueiredo, que foi ordenado em 2015 e passou os primeiros dois anos de ministério sacerdotal nas paróquias de Peniche, Atouguia da Baleia e Serra d’El Rei.
Entre 2017 e 2019 foi pároco das oito paróquias do concelho de Óbidos, mas desde há pouco mais de um ano exerce nas paróquias de Óbidos, A-dos-Negros e Gaeiras, dedicando algum do tempo ao doutoramento em Teologia.
A tese de mestrado deste padre foi dedicada a S. Tomás de Aquino e a tese de mestrado intermédia incidiu sobre a teologia da santidade, num diálogo entre um teólogo católico e um protestante. No prelo está a conclusão da tese de doutoramento final, sobre teologia da catolicidade. Que visa responder, no essencial, a uma questão.
“O que é isso de a igreja ser católica? Parece que os católicos estão fechados, fazem parte do rebanho, mas a igreja não tem limites. Quer e já chega a todos”, assinala alguém que “não tinha perspectiva de ser escritor”, mas que foi “aceitando desafios” e já vai para o décimo livro publicado.
Nada que seja surpreendente, pelo menos para quem o conheça, como D. Manuel Clemente, que, aquando da nomeação para as paróquias de Óbidos, há três anos, lhe deu um recado directo.
“O senhor cardeal patriarca olhou para mim e disse-me: ‘Gostas de escrever, então vais para Óbidos, que é vila literária e, por isso, vai correr bem”, recorda Ricardo Figueiredo, que lamenta, apenas, que “a produção literária local não exista”.
“Temos tudo à disposição para que Óbidos tenha um nível cultural muito acima da média, mas custa-me um pouco aceitar que não se consiga constituir, em certa medida, uma rede de trabalho”, adverte o padre, notando que, ao invés, em Peniche, encontrou “um grupo interessante de reflexão cultural”. “Somos um bonito postal em Óbidos, mas podemos ser algo mais”, conclui o padre da vila.
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