Os caldenses possuem um dos únicos mercados ao ar livre do país, que se pode comparar em termos de tradição e de enquadramento urbano, como um dos mais interessantes do mundo, apesar de pouco que foi feito. Isto apesar de uma lavagem da cara recente e da colocação de um novo conjunto de barracas em estrutura metálica e em plástico.
Gazeta das Caldas foi visitar o Mercado do Peixe do Livramento, em Setúbal, que também oferece frutas, legumes, carne, cerâmica, flores e outros produtos de consumo comum, mas que foi considerado recentemente pela revista norte-americana USA Today, um dos melhores e mais interessantes do mundo. A sua escolha junta-se a outros exemplares de referência, como os mercados de Tsukiji (no Japão), que é considerado o maior e melhor do mundo. Recentemente viu limitadas as visitas do público para não prejudicar a intensa logística do mercado. Também está na lista o mercado central de pescados, de Madrid, apesar de não ter grande projecção internacional.
Contudo, a mesma publicação tem também uma lista dos mercados ao ar livre mais interessantes no mundo entre os quais se destacam o La Boqueria (Barcelona) o Borough Market (Londres), o Kauppatori (Helsínquia), o Marché Provençal de Antibes (sul de França), o Mercado do Rialto (Veneza), o Farmers Market (Portland, nos Estados Unidos), e o Mercado de Marrakech em Marrocos.
Por exemplo, o Kauppatori é um pequeno mercado ao ar livre junto ao porto de Helsínquia onde se pode encontrar lá um pouco de tudo, mas especialmente peixes do Mar do Norte, frutas, legumes e artesanato. No Inverno, os vendedores aquecem-se com radiadores, com as barracas parecidas com as das Caldas, rodeadas de neve. Contudo, existe um mercado coberto nas imediações.
O mercado de Setúbal com azulejos de Pedro Pinto
Voltando a Setúbal, o mercado do peixe situa-se no final da alameda ajardinada que leva ao centro histórico, frente à fonte luminosa, numa zona aberta e espaçosa, com vastos espaços de estacionamento. Foi inaugurado em 1930 e recuperado recentemente, dispondo de colunas em ferro fundido, com vários painéis de azulejos da época da construção, sendo o edifício de gosto Arte Deco. Nas entradas de topo também dispõe de vários painéis de azulejos sobre motivos da cidade, enquanto que os do topo do edifício retratam cenas da faina agrícola, piscatória e de outras actividades tradicionais.
O autor dos painéis foi Pedro Jorge Pinto, discípulo de Columbano Bordalo Pinheiro. Contudo, nas obras de reconstrução, na sequência de um acidente que vitimou alguns trabalhadores em Fevereiro de 2012, perderam-se alguns painéis, que foram recuperados com apoio de uma fundação alemã (Fundação Buehler-Brockhaus).
Na sequência da recuperação também foram realizadas quatro estátuas de autoria do cartoonista Augusto Cid e modeladas nas Caldas da Rainha em cerâmica por Carlos Oliveira, com as figuras de profissionais alusivos ao mercado, como da vendedora de ovos e galinhas, carregador de peixe, o homem do talho e vendedora de flores, oferecidas pela mesma fundação.
O principal atractivo do mercado é o peixe e o marisco, que é descarregado nos portos de Setúbal e Sesimbra, com uma variedade muito grande de pescado, desde os salmonetes, sardinhas, peixe-espada, besugos, douradas, robalos, sargos, ao linguado, cherne, garoupa. Dos pratos típicos de Setúbal fazem parte o choco frito, os carapaus manteiga e as ostras do Sado, que são adquiridos em cru no mercado.
Neste campo o mercado caldense é facilmente batido, apesar de mesmo assim e nos últimos anos, ainda se encontrar uma boa oferta que provém dos portos de Peniche e da Nazaré, bem como alguma coisa da Lagoa de Óbidos.
No campo das frutas e legumes, o mercado de Setúbal fica muito aquém do das Caldas, uma vez que na cidade do Sado os vendedores são em número mais reduzido e estão muito longe da produção própria, sendo na maior parte dos casos intermediários dos canais tradicionais de abastecimento destes géneros agrícolas.
Nas restantes bancas podem-se encontrar flores, com menos variedade e quantidade do que no mercado caldense, frutas secas, azeitonas, tremoços, alhos, queijos, bacalhau, bolos tradicionais ou de pastelaria, etc. É possível ainda encontrar um lugar que vende louça de barro vermelho e outro com compotas caseiras.
O mercado dispõe ainda de dois ou três cafés e bares, e de um posto de atendimento para a defesa do consumidor. Tem também várias casas de banho impecavelmente asseadas e que qualquer vendedor ou visitantes pode utilizar. Tem também num dos topos uma zona de armazenagem com frio.
As bancadas são em mármore e os lugares de venda do peixe dispõem de água corrente e de área de lavagem do peixe, bem como de balança electrónicas.
O mercado é espaçoso e tem zonas de circulação confortáveis e pouco incomodativas para quem circula no mercado, como é bem iluminado por luz directa. Na zona dos queijos e das carnes tem balcões frigorificados, cumprindo as exigências modernas de conservação dos alimentos.
E a Praça da Fruta das Caldas da rainha
O mercado do Livramento é muito interessante e não admira que tenha conquistado a simpatia e o reconhecimento dos jornalistas norte-americanos. Contudo, facilmente o das Caldas da Rainha, se explorasse um pouco mais e melhor alguns dos seus pergaminhos e peculiaridades, podia obter uma distinção idêntica a nível internacional.
Primeiro porque funciona todos os dias ao ar livre, num cenário tradicional português, com fachadas azulejares que reflectem a luz natural, apesar de alguns desmandos, como foi a construção de dois mamarrachos e a destruição de dois edifícios cobertos em azulejo do início do século passado.
Depois porque oferece produtos directamente do campo e da produção agrícola, sendo os vendedores os próprios produtores em muitos casos.
Terceiro porque os preços são mesmo convidativos e muito competitivos em relação aos mercados alternativas, sejam dos supermercados, sejam aqueles praticados das frutarias dos principais centros urbanos, como Lisboa.
Finalmente, porque se tratava de recuperar uma tradição muito forte e arreigada em muitas pessoas, que vinham à praça caldense no século passado.
Falta-lhe estacionamento e circuitos de acesso fáceis e cómodos para os visitantes externos. Não foi ainda feito nenhum arranjo cenográfico, tendo sido a regeneração uma aposta pouco conseguida e com uma mensagem e conteúdo pobres.
Ainda pode ser feito muito mais, mas para isso devem recorrer a especialista na área que domine as novas ferramentas da comunicação dos espaços públicos. Isto não é obra de curiosos ou de convencidos porque depois dá resultados inacreditáveis, dos quais basta invocar dois ou três exemplos: os bancos colocados no empedrado, as caixotes do lixos colocados em redor da praça, ou mesmo o mausoléu em cimento num dos topos da praça…
José Luiz Almeida Silva
jlas@gazetadascaldas.pt































