Ingleses da volta a Portugal em comboio passaram pelas Caldas

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_MG_6865-(2)Na estação das Caldas é mais um dia pacato. Pouco passa do meio-dia de mais uma segunda-feira normal. Aqui não há nenhuma agitação especial, mas a cidade prepara-se para receber cerca de 50 súbditos de Sua Majestade que chegam num comboio especial.
Trata-se de um grupo de entusiastas dos caminhos-de-ferro que anualmente fretam um comboio à CP para sentir o ribombar dos motores de uma locomotiva a diesel cujo motor foi construído na Inglaterra há 50 anos.

A viagem que estes “maluquinhos dos comboios” costumam realizar todos os anos durou desta vez quatro dias. Começou no Porto, de onde seguiram para Valença, pararam para almoçar em Viana do Castelo e pernoitaram em Coimbra. No dia seguinte foram à Guarda e prosseguiram até Vilar Formoso. Regressaram a Coimbra, onde pernoitaram novamente e de onde seguiram, na manhã de segunda-feira, para as Caldas da Rainha onde pararam durante três horas para almoçar.
O grupo espalhou-se pela cidade e comeu onde quis. Alguns deram um passeio pela Praça da Fruta e houve quem estranhasse não ver o mercado a funcionar porque já conheciam a cidade.
Às 15h30 a composição dos ingleses – formada por uma locomotiva 1400 e duas carruagens Sorefame – partiu para Lisboa para depois subir para o Porto via linha do Norte. Para quem gosta de viajar de comboio, estas viagens não cansam – são um prazer.

As fantásticas locomotivas 1400

Até às Caldas da Rainha a viagem correu “mais ou menos como planeado” contou à Gazeta das Caldas, Jason Warner, um dos viajantes britânicos. Este habitante de Northamptonshire contou que “era suposto termos ido à Figueira da Foz ver os Estaleiros Navais do Mondego e não fomos porque a CP não organizou tudo a tempo”.
Entendido em comboios, tal como os restantes compatriotas desta viagem, Jason Warner apontou para uma automotora Allan estacionada na linha ao lado e disse “aquele comboio não é bom, mas a locomotiva [1400] que nos trouxe é boa”.
Não será por rivalidades nacionalistas (a Allan é de origem holandesa) que este britânico prefere a 1400. “É uma série desenhada em Inglaterra e é por isso que os ingleses organizam este tipo de viagem”, contou.
Estas locomotivas foram compradas pela CP em 1967 à English Electric. Estão numeradas entre 1401 e 1467 e resultaram de um investimento que pretendia eliminar a tracção a vapor em Portugal, à época ainda muito em uso em grande parte do país.
Apenas as dez primeiras foram construídas em solo inglês. As restantes foram construídas pela Sorefame, na Amadora.
Estas máquinas prestaram (e ainda prestam) serviço em todo o território nacional a norte do Tejo, mas com especial incidência na linha do Oeste. Foram depois substituídas por automotoras quando a CP decidiu acabar com as composições formadas por locomotiva mais carruagens.
Na estação das Caldas Jason Warner conta que desde 1997 vem todos os anos a Portugal. Já tinha estado várias vezes na estação das Caldas, mas nunca tivera a oportunidade de visitar a cidade. É que, até há alguns anos estes comboios especiais eram alugados com uma carruagem-restaurante pelo que as refeições faziam-se a bordo. Mas a CP, entretanto, abateu estas carruagens.

UMA VIAGEM EMOCIONAL

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Na opinião de Robin Bridgetson, que veio de Winchester (e que já conhecia as Caldas da Rainha), “é muito triste o que está a acontecer em Portugal” com o encerramento de várias linhas ferroviárias. “Por exemplo, no Douro existiam algumas linhas muito bonitas que agora já não podemos percorrer”, lamentou-se, referindo-se ao encerramento das linhas do Tâmega, do Corgo e do Tua.
Este entusiasta dos comboios, diz que a peregrinação ferroviária anual a Portugal é importante para conhecer pessoas e encontrar amigos. “Todos vivemos no Reino Unido, mas muitos de nós só nos vemos em Portugal” contou. E sublinha que viajar de comboio é uma forma bonita de conhecer um país, para além do prazer que constitui a própria viagem em si.
Uma opinião partilhada por David Pepperell que contou à Gazeta as suas impressões sobre a viagem: “ontem tivemos muito problemas mas graças ao maquinista conseguimos manter-nos a andar, portanto fazemos figas para que os 547 quilómetros que nos faltam percorrer hoje passem sem incidentes”. Este britânico conheceu a região Oeste há 25 anos atrás e quis agora ver como esta se tinha desenvolvido.
“Esta é uma viagem muito emocional para nós porque já restam muito poucas locomotivas destas em actividade”, contou, explicando depois que decidiu vir neste comboio para descobrir um pouco mais de Portugal. “Todos os anos venho para o Algarve, uma ou duas vezes, mas acho muito fascinante o Centro e o Norte de Portugal”, disse o turista.
Às 15h30 a locomotiva 1400 soltou um prolongado apito e o comboio dos ingleses pôs-se em marcha para sul. Pouco antes da partida, funcionários da Câmara das Caldas deslocaram-se à estação e distribuíram folhetos turísticos da cidade e da região a estes visitantes inesperados.

Isaque Vicente
ivicente@gazetadascaldas.pt

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1 COMENTÁRIO

  1. Como os ingleses devem ter ficado “encantados” com a pobreza das nossas linhas e o abandono geral da maior parte das nossas estações ferroviárias. Por exemplo, essa linha do Oeste, um autêntico museu só que nem cuidada como se fosse mesmo um museu. Mas pior ainda foi eles terem ida à Guarda e voltado pelo mesmo caminho só porque os senhores que mandam nisto tudo, teimosos como são, nunca mais recuperam um pequeno proço da Linha da Beira baixa entre a Covilhã e a Guarda. Esses senhores que mandam nisto tudo, se percebessem alguma coisa de comboios e de economia, há muito que tinham recuperado como deve ser a Linha do Oeste para servir condignamente as populações e concorrer com as auto-estradas e ao mesmo tempo servir de altermantiva à Linha do Norte quando a mesma tem problemas como foi o caso do acidente de Alfarelos. O mesmo se pode dizer em relação à Linha da Beira Baixa que deveria estar toda a funcionar para servir as populações, concorrer com a A23 e também servir de alternativa à Linha da Beira Alta. Mas é o temos.