Duzentos anos depois, lavadeiras, trabalhadores do campo, músicos e até um casal de noivos voltaram à cidade, para desfilar pelas ruas comerciais num movimentado sábado de manhã (6 de Outubro). Tratou-se da quarta edição do Tradições da Vila, um evento organizado pelos grupos de folclore do concelho.
Para o ano há mais e com mais arrojo, com a organização a querer recriar actividades ligadas à olaria no centro da cidade.
Sentada em cima de uma carroça puxada por um burro, uma noiva aguardava, de ramo de laranjeira na mão, o início do trajecto entre o Chafariz das Cinco Bicas e a Capela de S. Sebastião (ao cimo da Praça da Fruta) onde o noivo a esperava para o enlace.
A cena, invulgar nos dias de hoje, atraiu muitos curiosos, uns em passeio na cidade, outros no trajecto das compras, que por ali foram ficando e assistiram a um casamento à moda antiga. Dentro da capela os noivos disseram o sim perante o padre e à saída foram saudados com uma chuva de pétalas de flores. O momento ficaria registado numa máquina fotográfica de fole, mas também em muitas câmaras digitais e telemóveis.
Antes, os elementos dos grupos folclóricos do concelho tinham percorrido a Avenida 1º de Maio em procissão até à frente da Igreja Nossa Sra. da Conceição, onde depositaram um andor, rezaram e cantaram. Momentos depois dançaram na Praça 25 de Abril. Estes “quadros” etnográficos foram uma novidade desta edição das Tradições da Vila.
As recriações começaram logo de manhã no Largo dos Pimpões, e incluíram ainda o desfile de vendedores com os seus pregões ao longo da Rua Heróis da Grande Guerra e Rua das Montras. As lavadeiras lavaram as suas roupas, e deram largas à coscuvilhice no chafariz das Cinco Bicas, e o Largo do Hospital Termal foi transformado em eira para a descamisada e malha do milho.
As lavadeiras lavaram as suas roupas no Chafariz das 5 Bicas
Já no Parque D. Carlos I foram recriados alguns trabalhos agrícolas, como o varejar e apanha da azeitona, ou mesmo cavar à manteia. A música de cariz popular e tradicional, interpretada por elementos das tocatas dos grupos participantes, pôs fim ao evento, frente ao Museu de José Malhoa.
- publicidade -
Mais actividades em 2019
Tratou-se de um programa intenso e que foi cumprido à risca, mesmo sem ensaios, tendo em conta que era difícil reunir os seis grupos participantes. A estes juntaram-se, como convidados, a Banda Comércio e Indústria e o Rancho Folclórico do Arco da Memória.
O dinamizador do projecto, Sérgio Pereira, lembra que a cidade sempre viveu “com as tradições das pessoas das aldeias do concelho e que ajudaram a formatar este sentimento caldense”. Ele próprio ainda se recorda de andar pelas ruas das Caldas e de ouvir apregoar a venda das sementes de nabo, de couve e de horto, assim como de ver vender ouro nas feiras.
A organização tenta mudar todos os anos o percurso e acrescentar algumas actividades. Querem que a próxima edição seja ainda mais arrojada, com a recriação das profissões nas principais ruas da cidade, entre elas a olaria. “Isso exige uma participação e dedicação mais profunda dos grupos”, refere Sérgio Pereira, reconhecendo que a data do evento coincide com a época das vindimas, o que leva a que alguns elementos não possam participar.
O responsável lembrou que as juntas de freguesia propuseram-lhe a realização de um festival com os vários grupos e ele propôs, em contrapartida, a realização destas recriações com um cariz mais identitário. “Isto é uma riqueza que temos no concelho e que merecia ser valorizada”, disse Sérgio Pereira, acrescentando que a ideia de que o folclore é apenas dança e música é redutora.
Neste dia também não há bairrismo entre ranchos. Participam vários grupos, mas nenhum leva a sua bandeira. “Estamos apenas interessados em promover esta nossa maneira de mostrar o folclore e a etnografia da região”, remata Sérgio Pereira.