No âmbito do Dia Internacional para a Eliminação da Discriminação Racial, o Centro Local de Apoio à Integração de Migrantes (CLAIM) promoveu no dia 21de março, no espaço Turismo, uma tertúlia e lançou a campanha de sensibilização “Frases Fora da Caixa – uma perspetiva dialogante”, nas Caldas da Rainha. O evento debateu o impacto da discriminação e a necessidade de um maior compromisso social com a inclusão.
A iniciativa incluiu a exposição de mensagens de sensibilização espalhadas pela cidade, concebidas por alunos de várias escolas do concelho. Foram três as frases selecionadas para ser exibidas em mupis pela cidade. “O preconceito fecha portas, a empatia abre mundos”, por um aluno do 9ºB do Colégio Rainha D. Leonor; “Quem discrimina amizades elimina”, da Escola Secundária Rafael Bordalo Pinheiro, 11º ano; e “Brincar com todos é divertido e fica mais colorido”, da Infancoop, 3º ano.
Conceição Henriques, vereadora do município caldense com a pasta da ação social, lançou a tertúlia sublinhando que a discriminação continua a ser uma realidade presente e alertando para a necessidade de um compromisso mais forte na sua eliminação. “Infelizmente, neste tempo em que vivemos, não só existe muita discriminação como ela tem vindo a alimentar-se”, afirmou, deixando um apelo à reflexão. “Por vezes, estamos tão convencidos de que aquele assunto não nos toca porque não discriminamos, que não temos a necessária distância de nós próprios para nos autoexaminarmos. Mas será que estou mesmo a cumprir o meu papel, no sentido de assegurar toda a dignidade de todos à minha volta?”, questionou.
Thaíssa Cavalcanti, da Agência para a Integração, Migração e Asilo (AIMA), foi a moderadora da sessão e destacou a necessidade de ampliar a reflexão sobre a discriminação, sublinhando que esta não se restringe apenas à questão racial. “Temos que lutar contra todas as áreas da discriminação. Porque a discriminação só serve para minimizar o outro. É uma forma que inventaram para fazer com que o outro se sinta menos empoderado”, afirmou, lamentando que, em pleno 2025, o tema ainda tenha de ser debatido.
Rui Correia, professor de História e autor, trouxe à discussão a dimensão histórica da discriminação, sublinhando que esta não é apenas um problema do presente, mas uma construção que atravessa séculos. O docente defendeu que a discriminação sobreviveu ao longo da História porque teve “razões potentes”, que não podem ser ignoradas. “Ignorar esse lugar desconfortável de tentar perceber o que leva alguém a ser discriminatório é, de alguma maneira, analfabetizar o nosso coração e os nossos próprios argumentos”, acrescentou, sublinhando que compreender essas razões pode, paradoxalmente, fortalecer o combate à discriminação. “Conhecer melhor o outro, até mesmo aquele que nos ofende, pode trazer-nos a um lugar ainda mais poderoso, mais seguro e, portanto, ainda mais útil” na luta contra a discriminação, acrescentou.
Rui Correia destacou também a forma como, ao longo da História, as próprias comunidades discriminadas, por vezes, contribuíram para a sua marginalização, ao tentarem adaptar-se a padrões impostos. Deu o exemplo dos emigrantes portugueses nos Estados Unidos nos anos 30 do século passado, que alteravam os seus nomes para parecerem mais “americanizados”. “Se eu deixei de ser Miguel Valente para ser Mike Strong, tem de haver uma boa razão para isso. E conhecê-la ajuda-nos a perceber melhor”, afirmou.
A conversa estendeu-se para o papel da educação e das associações no apoio às comunidades mais vulneráveis. Nilzete Pacheco, do Instituto Brasil, destacou a importância das organizações de imigrantes como agentes de integração. “As associações fazem um trabalho que muitas vezes o Estado não consegue fazer. São elas que estão na linha da frente, que conhecem as dificuldades diárias das comunidades migrantes, que sentem de perto as necessidades de quem chega a um país novo sem rede de apoio”, afirmou.
Já Joana de Deus, da Associação Renovar a Mouraria, sublinhou a diversidade cultural do território onde a associação atua, mas que a discriminação racial ainda é uma realidade visível, especialmente nos recreios e nos comentários ouvidos nas salas de aula. A oradora alertou para a forma como a interculturalidade tem sido trabalhada, considerando que, muitas vezes, o discurso “é fofinho, é bonito, é fácil”, mas acaba por ofuscar a necessidade de debater a discriminação racial de forma mais profunda. Por isso, a associação desenvolveu o projeto Radika, que procura “aprofundar a compreensão do que é a discriminação étnica e racial, sem medo de a nomear”.
O trabalho da associação tem-se centrado em formar crianças do primeiro ciclo para que consigam identificar atos de discriminação e reconhecer a sua estrutura. Joana de Deus relatou que, durante ações nas escolas, muitas crianças não conseguiam perceber que expressões como “és um macaco” ou “vai para a tua terra” são micro agressões, porque fazem parte do seu dia a dia. No entanto, era preciso proporcionar a essas crianças um novo olhar sobre essas situações.
A oradora criticou também a falta de preparação das escolas para lidar com a diversidade, “não existe nenhum protocolo ou procedimento para acolher crianças estrangeiras e as suas famílias”, disse, e a barreira linguística é também um problema que impede a participação das famílias migrantes na vida escolar dos filhos. “Muitas reuniões são dinamizadas numa língua que os pais não entendem. E em muitos países de origem, não é suposto as famílias entrarem pelas escolas e serem participativas, pelo que, se ninguém lhes explicar que aqui é esperado que participem, dificilmente o farão”, referiu, pelo que “são urgentes ferramentas e políticas para que a escola seja acessível a todos”, concluiu.































