A televisão passou de moda. Agora o que eles querem é o Youtube. Eles quem? A geração Z, jovens até aos vinte e poucos anos, que já nasceram rodeados pelas possibilidades da Internet e andam com o mundo no bolso.
No Youtube não são apenas consumidores de vídeos, mas também – e cada vez mais – são criadores de conteúdos. Têm os seus próprios canais online e dedicam horas a alimentá-los. Quanto mais subscritores maior o reconhecimento, mas é o número de visualizações dos vídeos e a publicidade que permitem a alguns ganharem dinheiro suficiente para viverem do Youtube.
A “febre” dos Youtubers também já chegou às Caldas.
Tiago Agostinho deu os primeiros passos no Youtube aos 11 anos. Gravava com uma câmara web e editava os vídeos no Paint. Eram ferramentas rudimentares quando comparadas com a sua actual máquina, computador, microfone de estúdio, equipamento de iluminação e programa de edição – o Vegas Pro – que é pago e utilizado por profissionais de multimédia. Agora tem 19 anos.
O caldense tem dois canais no Youtube. Há um ano criou o t7agox e há cerca de um mês o Tiaguitos. No primeiro, que conta com mais de 94 mil subscritores, Tiago Agostinho publica vídeos em que dá a sua opinião sobre diversos assuntos ou pessoas, a maior parte ligados à comunidade youtubiana. “Utilizo um tom sarcástico e irónico, sou frontal, por isso há pessoas que até se sentem ofendidas e eu recebo alguns comentários negativos”, diz o jovem, que não está muito preocupado com os “haters”.
Já no Tiaguitos, com 22 mil subscritores, Tiago joga ao vivo Counter-Strike: Global Offensive, um jogo de tiros e estratégia. Os Youtubers que transmitem jogos nos canais têm mesmo um nome específico: chamam-se Gamers.
Relativamente ao Tiaguitos, “é um trabalho difícil e extremamente cansativo, porque tenho que estar concentrado em várias coisas ao mesmo tempo: jogar, entreter em directo e responder aos comentários que me vão fazendo”, afirma Tiago Agostinho, acrescentando que “são raras as pessoas que conseguem fazer as duas coisas bem ao mesmo tempo, pois são precisas muitas horas de treino”. Para “alimentar” o Tiaguitos, o Youtuber joga ao vivo no canal todos os dias, duas a quatro horas durante a semana, e quatro a oito horas no fim-de-semana.
“O Youtube pode ocupar dez minutos ou dez horas do teu dia, depende do investimento que pretendemos fazer no canal e se queremos ou não fazer disto uma profissão”, explica Tiago Agostinho, que actualmente já é representado por uma agência de talentos portuguesa que gere vários Youtubers, a Thumb Media. Este tipo de agências funciona como intermediário entre a plataforma e o Youtuber: o dinheiro que ele ganha passa primeiro pela agência e ao mesmo tempo esta encarrega-se de arranjar patrocínios e marcas que estejam interessadas em pagar ao Youtuber para fazer publicidade. Também o leva a eventos relacionados com o conteúdo do canal.
À medida que o Youtube deixa de ser apenas um hobby e se vai transformando numa ocupação a tempo inteiro, surgem os “contras”. Para Tiago Agostinho, o maior é mesmo o stress. “É muito fácil ficarmos agarrados aos números… dos likes, das visualizações e dos subscritores. Se por acaso colocamos um vídeo e não atingimos a média de visualizações que pensávamos, isso mexe muito com a nossa cabeça e começamos logo a pensar o que terá corrido mal, como se não tivéssemos cumprido os objectivos”, refere.
Na opinião do caldense – e como é quase impossível ignorar os números – o segredo está em não cair no erro de trabalhar apenas para os “likes”, “pois aí deixamos de apreciar aquilo que estamos a fazer”.
Mas há mais aspectos negativos. É que a um nível mais profissional, por detrás dos vídeos, escondem-se horas de empenho. E como um dia só tem 24 horas, há que fazer escolhas.
“Costumo dizer que quem é Youtuber só pode escolher duas destas três coisas: o canal, a saúde ou a vida social. Dificilmente se consegue ter tempo para manter tudo isto”, afirma Tiago Agostinho, realçando que é principalmente por esta razão que “todos podem, mas nem todos conseguem fazer do Youtube um emprego”.
É PRECISO TEMPO LIVRE
Rute Simão, por exemplo, tem o sonho do Youtube em “standby”, precisamente pela falta de tempo. Com 25 anos, tem compromissos como um emprego a full-time e a gestão da sua própria casa. Por tudo isto, foi obrigada a fazer uma pausa no canal, que não actualiza há seis meses. Mas espera voltar.
Estreou-se como Rute Simão – La Petite há dois anos, motivada pelas amigas. “Dava-lhes dicas sobre maquilhagem e produtos de beleza, porque na altura trabalhava numa perfumaria e passei a interessar-me sobre esses temas. Elas sugeriram que eu transmitisse esses conselhos num canal do Youtube”, conta a caldense, que já tinha o gosto pela fotografia e edição de imagem e, por isso, resolveu avançar.
No que respeita à edição de vídeo, Rute foi aprendendo sozinha como trabalhar no Adobe Premiere Pro. Ora por tentativa-erro, com a ajuda de tutoriais do próprio Youtube ou com alguns conhecimentos que adquiriu na licenciatura em Ciências da Comunicação. Na sua opinião, para criar conteúdos é fundamental que o Youtuber também consuma os vídeos dos seus concorrentes.
“O objectivo não é copiar, pelo contrário. É preciso estarmos a par do que está a ser feito para não fazermos mais do mesmo, e ao mesmo tempo é importante sabermos quais os géneros de vídeos que estão na moda”, diz Rute Simão, salientando que os utilizadores do Youtube são cada vez mais exigentes com a qualidade dos vídeos.
A exigência de quem vê obriga à criatividade de quem cria. É por isso que há mesmo quem diga que Youtuber é das profissões mais criativas na era das novas tecnologias. Não está implicado apenas o tempo a gravar ou editar os vídeos, mas também a pensar em conteúdos apelativos para os subscritores que, com a mesma facilidade com que subscreveram um canal podem também desassociar-se. A distância é a de um clique.
A IMPORTÂNCIA DA ESPONTANEIDADE
Gazeta das Caldas entrevistou Catarina Filipe em Janeiro de 2016, quando a jovem de 21 anos já era um fenómeno do Youtube, com 20 mil subscritores. Mas agora, passado mais de um ano e com 135 mil fãs na plataforma, é uma das Youtubers portuguesas mais populares nos canais de lifestyle.
Catarina Filipe publica vídeos sobre maquilhagem, rotinas diárias, DIY’s (vídeos “Do it yourself” – “Faz por ti mesmo” – com dicas sobre trabalhos manuais) e outros em que convida amigas Youtubers. Faz também sorteios – recentemente, graças ao patrocínio da Universal Music, conseguiu levar uma subscritora a Amesterdão ver o concerto de Drake – e vídeos em que partilha factos sobre si, viagens ou momentos com o namorado. Digamos que o canal abre as portas à sua vida social e aos seus gostos.
Mas os vídeos com mais visualizações (há deles que atingem as 300 mil) são aqueles em que Catarina Filipe compara situações e explora o seu lado cómico: como os vídeos “Amiga vs Melhor Amiga” ou “Ter 16 anos vs Actualidade”.
E qual é o segredo para tantos subscritores? “Não há uma fórmula para o sucesso, mas acho que o essencial é termos um registo único, que te diferencie dos outros”, responde a Youtuber, que acrescenta a importância da espontaneidade. “Tanto partilho vídeos em que estou maquilhada, como vídeos em que estou com olheiras, acabada de acordar. Faço-o naturalmente, precisamente porque quero mostrar que sou uma pessoa real, como todas as outras”, realça.
A proximidade que se cria entre um subscritor e o Youtuber ultrapassa a barreira dos ecrãs de televisão. As camadas mais jovens identificam-se com as estrelas do Youtube muito mais do que com as celebridades da TV. E as marcas já perceberam isso. São cada vez mais as que definem os Youtubers como os maiores influenciadores entre os mais novos e, para fazerem chegar-lhes os seus produtos, pagam aos Youtubers para que façam divulgação no canal. Este torna-se num meio de publicidade semelhante à televisão, só que nalguns casos bem mais eficaz.
Isto porque as marcas podem escolher os Youtubers consoante o público que querem alcançar. Se o objectivo for fazer publicidade a um novo creme, há que distribui-lo pelas Youtubers mais populares de moda e beleza, mas se o objectivo for antes vender um jogo para computador, há que apostar nos Gamers.
Mais do que com o número de visualizações dos vídeos, é assim que os Youtubers ganham dinheiro e conseguem fazer do canal a sua fonte de rendimento. É o caso de Catarina Filipe, que assim que terminar a licenciatura em Gestão pretende dedicar-se apenas ao Youtube.
“Este é um trabalho sem horário fixo e que se estende muito além do canal, pois é necessário gerirmos outras redes sociais que servem de ponte para o canal e para mantermos um contacto diário com os seguidores. Como o Instagram”, afirma a caldense, que tem apostado cada vez mais em fotografias de qualidade profissional. “Isto exige que perca bastante tempo a fotografar, até porque o faço quase todos os dias”, acrescenta.
Hoje em dia é natural que Catarina Filipe seja abordada na rua – pedem-lhe para tirar fotografias – e até já existem páginas de fãs suas espalhadas pela Internet. Os adultos até podem desconhecê-la, mas os mais novos sabem quem é.
O Youtube é o meio de entretenimento do futuro e provavelmente daqui a uns anos Youtuber já será uma profissão reconhecida.
































