Exaltina Nogueira foi a primeira vereadora na Câmara das Caldas

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Eleita pelo PS, cumpriu apenas meio mandato entre 1977 e 1979

Exerceu o cargo “obrigada”, depois de o cabeça de lista ter declinado tomar posse, nas primeiras eleições autárquicas. Esteve na origem do Museu da Cerâmica e dos Encontros Internacionais de Arte

Exaltina Nogueira foi a primeira mulher a integrar a vereação da Câmara das Caldas, em 1977, nas primeiras eleições autárquicas, cumprindo meio mandato. A câmara foi ganha pelo PPD e ela, que concordara em pertencer à lista do PS em lugar não-elegível, viu-se “obrigada” a aceitar o cargo depois do cabeça de lista pelo partido, Hergildo Velhinho, ter recusado tomar posse.

“Naquela época, vivia-se a política em todo o lado”

Exaltina Nogueira

Tal como a maioria da sua geração, só despertou para a política após o 25 de Abril, “contaminada pelo entusiasmo geral”, lembra à Gazeta das Caldas. Envolveu-se na fundação da secção do PS local, “arrastada” pelo marido, José Carlos Nogueira, e pelo irmão, Carlos Gil. “Era membro do secretariado, mas fazia de tudo um pouco”, recorda, sobre a “época muito eletrizante, em que se vivia “a política em todo o lado, discutia-se muito”. Para Exaltina Nogueira foi uma aprendizagem feita “na vivência do dia a dia, no local de trabalho, no partido, na leitura dos jornais, nas discussões com os amigos”.

A então vereadora com o Presidente da República numa visita às Caldas
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Foi eleita vereadora num momento em que os cargos políticos eram essencialmente ocupados por homens, mas teve a “sorte” de encontrar no executivo um grupo de colegas que sempre a respeitaram e apoiaram. “Trabalhávamos em equipa, sem divergências partidárias, sempre num ambiente de amizade e concórdia”, conta a ex-autarca, que não se recorda de terem tomado alguma decisão sem ser por unanimidade. O maior problema era a falta de condições para desempenhar o cargo, pois acumulava as funções profissionais. “Dava aulas em horário completo, as reuniões prolongavam-se pela madrugada, por vezes era preciso fazer ou receber visitas institucionais, ou deslocarmo-nos aos ministérios, o que ocupava grande parte do dia…”, relembra. Para além disso, em finais da década de 1970 não havia a facilidade de comunicação dos tempos atuais, os contactos telefónicos eram raros, a burocracia muito lenta e complicada.
No antigo edifício da câmara os vereadores não dispunham de um gabinete ou de secretária para organizarem os documentos de trabalho, recorda a então vereadora, que, apesar das dificuldades, se orgulha da quantidade e qualidade dos projetos que desenvolveu. Mas guarda uma amargura: nunca ter constado da lista oficial de ex-autarcas e, por isso, ter perdido oportunidades de reencontro e de comemoração.

Dois anos de mandato. Foi vereadora entre 1977 e 1979, em substituição do cabeça de lista pelo PS, que declinou tomar posse

Enquanto vereadora teve os pelouros da Cultura e Desporto. No desporto, preocupou-se em recolher informação sobre todas as associações e clubes, para facilitar apoios e subsídios e deixou de pé o Pavilhão Gimnodesportivo da Mata, o primeiro equipamento local do género. Já ao nível da Cultura, foi durante o seu mandato que foi adquirido o Palacete do Visconde de Sacavém e ali instalado o Museu de Cerâmica e feita a aquisição da coleção Lucas Cabral. Foi, também, através da sua ação que foi conseguida a cedência da coleção de escultura de António Duarte, destinada à criação de um museu com o seu nome. No entanto, para Exaltina Nogueira, o acontecimento de maior relevo, e que deixou a sua marca na História da Arte Contemporânea em Portugal, foram os IV Encontros Internacionais de Arte nas Caldas, na altura muito polémicos, mas hoje estudados e referenciados.
“Todas estas e outras realizações só foram possíveis em tão pouco tempo graças a amigos e conhecidos que a vários níveis facilitavam a concretização dos meus projetos. “Era assim que naquele tempo funcionavam as redes sociais”, destaca.
Conciliar a vida política com a familiar “não era nada fácil”, reconhece, lembrando a dificuldade em compatibilizar horários tão exigentes com as crianças pequenas. Depois de sair da câmara abandonou a política, por razões profissionais e familiares, mas também devido a um “certo desencanto com a realidade da vida partidária local”. Como não tinha ambições, recusou vários convites para voos mais altos e dedicou-se inteiramente ao desenvolvimento no campo da pedagogia e didática das línguas que lecionava.
A caldense considera que hoje há mais condições para as mulheres se dedicarem à política, não só ao nivel de apoios, mas também porque as mentalidades evoluíram. Agora são “cada vez mais visíveis e geralmente muito empenhadas e competentes”, conta a antiga autarca para quem, por enquanto, as quotas para mulheres são necessárias: “Como um dia ouvi alguém dizer, só teremos de facto atingido a igualdade de género na política quando tivermos uma primeira-ministra que seja reconhecidamente incompetente!…” ■

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