Exerceu o cargo “obrigada”, depois de o cabeça de lista ter declinado tomar posse, nas primeiras eleições autárquicas. Esteve na origem do Museu da Cerâmica e dos Encontros Internacionais de Arte
Exaltina Nogueira foi a primeira mulher a integrar a vereação da Câmara das Caldas, em 1977, nas primeiras eleições autárquicas, cumprindo meio mandato. A câmara foi ganha pelo PPD e ela, que concordara em pertencer à lista do PS em lugar não-elegível, viu-se “obrigada” a aceitar o cargo depois do cabeça de lista pelo partido, Hergildo Velhinho, ter recusado tomar posse.
“Naquela época, vivia-se a política em todo o lado”
Exaltina Nogueira
Tal como a maioria da sua geração, só despertou para a política após o 25 de Abril, “contaminada pelo entusiasmo geral”, lembra à Gazeta das Caldas. Envolveu-se na fundação da secção do PS local, “arrastada” pelo marido, José Carlos Nogueira, e pelo irmão, Carlos Gil. “Era membro do secretariado, mas fazia de tudo um pouco”, recorda, sobre a “época muito eletrizante, em que se vivia “a política em todo o lado, discutia-se muito”. Para Exaltina Nogueira foi uma aprendizagem feita “na vivência do dia a dia, no local de trabalho, no partido, na leitura dos jornais, nas discussões com os amigos”.

Foi eleita vereadora num momento em que os cargos políticos eram essencialmente ocupados por homens, mas teve a “sorte” de encontrar no executivo um grupo de colegas que sempre a respeitaram e apoiaram. “Trabalhávamos em equipa, sem divergências partidárias, sempre num ambiente de amizade e concórdia”, conta a ex-autarca, que não se recorda de terem tomado alguma decisão sem ser por unanimidade. O maior problema era a falta de condições para desempenhar o cargo, pois acumulava as funções profissionais. “Dava aulas em horário completo, as reuniões prolongavam-se pela madrugada, por vezes era preciso fazer ou receber visitas institucionais, ou deslocarmo-nos aos ministérios, o que ocupava grande parte do dia…”, relembra. Para além disso, em finais da década de 1970 não havia a facilidade de comunicação dos tempos atuais, os contactos telefónicos eram raros, a burocracia muito lenta e complicada.
No antigo edifício da câmara os vereadores não dispunham de um gabinete ou de secretária para organizarem os documentos de trabalho, recorda a então vereadora, que, apesar das dificuldades, se orgulha da quantidade e qualidade dos projetos que desenvolveu. Mas guarda uma amargura: nunca ter constado da lista oficial de ex-autarcas e, por isso, ter perdido oportunidades de reencontro e de comemoração.
Dois anos de mandato. Foi vereadora entre 1977 e 1979, em substituição do cabeça de lista pelo PS, que declinou tomar posse
Enquanto vereadora teve os pelouros da Cultura e Desporto. No desporto, preocupou-se em recolher informação sobre todas as associações e clubes, para facilitar apoios e subsídios e deixou de pé o Pavilhão Gimnodesportivo da Mata, o primeiro equipamento local do género. Já ao nível da Cultura, foi durante o seu mandato que foi adquirido o Palacete do Visconde de Sacavém e ali instalado o Museu de Cerâmica e feita a aquisição da coleção Lucas Cabral. Foi, também, através da sua ação que foi conseguida a cedência da coleção de escultura de António Duarte, destinada à criação de um museu com o seu nome. No entanto, para Exaltina Nogueira, o acontecimento de maior relevo, e que deixou a sua marca na História da Arte Contemporânea em Portugal, foram os IV Encontros Internacionais de Arte nas Caldas, na altura muito polémicos, mas hoje estudados e referenciados.
“Todas estas e outras realizações só foram possíveis em tão pouco tempo graças a amigos e conhecidos que a vários níveis facilitavam a concretização dos meus projetos. “Era assim que naquele tempo funcionavam as redes sociais”, destaca.
Conciliar a vida política com a familiar “não era nada fácil”, reconhece, lembrando a dificuldade em compatibilizar horários tão exigentes com as crianças pequenas. Depois de sair da câmara abandonou a política, por razões profissionais e familiares, mas também devido a um “certo desencanto com a realidade da vida partidária local”. Como não tinha ambições, recusou vários convites para voos mais altos e dedicou-se inteiramente ao desenvolvimento no campo da pedagogia e didática das línguas que lecionava.
A caldense considera que hoje há mais condições para as mulheres se dedicarem à política, não só ao nivel de apoios, mas também porque as mentalidades evoluíram. Agora são “cada vez mais visíveis e geralmente muito empenhadas e competentes”, conta a antiga autarca para quem, por enquanto, as quotas para mulheres são necessárias: “Como um dia ouvi alguém dizer, só teremos de facto atingido a igualdade de género na política quando tivermos uma primeira-ministra que seja reconhecidamente incompetente!…” ■































