A falta de professores, a motivação dos alunos e a adaptação da escola ao mundo digital são alguns dos grandes desafios que se colocam no ensino
A renovação do quadro de professores é um dos desafios do sistema de ensino na próxima década. “Aquilo a que assistimos neste momento, em várias escolas do país, é preocupante, várias turmas sem professores e de várias disciplinas”, disse Sandra Santos, da direção do Colégio Rainha D. Leonor. “Durante os últimos anos assistimos ao encerramento de cursos na área do ensino e isso já se começa a refletir. É preciso investir nesta área, colocando esta profissão no patamar que merece, aliciando, assim, os alunos a escolherem o ensino”, concluiu.
João Silva, diretor do Agrupamento de Escolas Raul Proença , diz que “a carência de professores e a necessidade de rejuvenescer os quadros das escolas constitui uma equação de difícil resolução”, tal como a “desvalorização da carreira dos Assistentes Técnicos e dos Assistentes Operacionais, que cria dificuldades de recrutamento”.
Já Maria do Céu Santos, diretora do Agrupamento Bordalo Pinheiro, lamenta a ausência de “medidas concretas suscetíveis de evitarem o colapso anunciado”. A motivação dos alunos é outro ponto abordado. A professora nota que “a escolaridade obrigatória até aos 18 anos trouxe mais um desafio: motivar os alunos para a aprendizagem. Para muitos, a escola pouco lhes diz”.
João Silva realça “as dificuldades resultantes de uma sociedade que se concentra nos seus direitos e ignora, ou desvaloriza, os seus deveres”.
A adaptação ao mundo digital é outro dos grandes desafios e sobre isso, afirma Maria do Céu Santos, “o principal desafio da escola é hoje, como sempre foi, preparar da melhor forma os alunos para o mundo”, mas “há novas realidades decorrentes da evolução tecnológica que merecem uma reflexão, desde a crise do paradigma secular da aula expositiva perante a turma passiva que vai “tirando apontamentos”, ao imobilismo da escola perante o mundo dinâmico que a rodeia”. A diretora nota que “o mundo avança todos os dias, vertiginosamente, para uma realidade inconciliável com o padrão de ensino tradicional. Os alunos, todos eles, trazem no bolso, ao alcance de um clique, bibliotecas inteiras, no smartphone” e salienta ainda que “será um erro a Escola persistir em eleger as novas tecnologias como inimigas”. Maria do Céu Santos refere, ainda, que “as mudanças no mundo refletem-se, inevitavelmente, na escola” e que “a realidade virtual e realidade aumentada tem de entrar nas salas de aula. O professor é insubstituível, mas terá de fazer um imenso esforço de adaptação aos novos tempos”.
Uma ideia semelhante tem Sandra Santos, que diz que “o ensino terá de saber conciliar soft e hard skills. Não podemos ignorar o avanço tecnológico, nem as competências digitais enquanto mais-valia, mas também não podemos menosprezar tudo o que existe de insubstituível na relação humana dentro de uma sala de aula, as competências sociais, privilegiando sempre o desenvolvimento emocional dos alunos”.
João Silva também sente que “as “novas” tecnologias estarão mais presentes na prática letiva e os alunos terão de assumir um papel mais ativo num contexto de maior articulação curricular. Interdisciplinaridade, trabalho de projeto e em equipa serão metodologias mais presentes nas nossas escolas. A realidade envolvente (local, nacional e mundial) e as preocupações da sociedade, e dos jovens em particular, terão de ser assumidas como eixos motivacionais”, considera.
“No caso particular do nosso agrupamento, temos ainda como desafio a necessidade de requalificar a Escola Secundária Raul Proença e, posteriormente, a EB de Santo Onofre (EBI)”, acrescentou João Silva, notando que “decorridos dois anos em contexto pandémico, ansiamos para que tudo volte progressivamente ao “normal”. Os danos causados ao nível das aprendizagens foram muito significativos”, mas mostrando-se convicto de que “com o envolvimento de todos poderemos recuperar muito do que ficou para trás, mas tem de haver um trabalho colaborativo e um investimento significativo na educação, seja a nível do poder central, seja ao nível do poder local”.
Sandra Santos alertou ainda para a “capacidade para preparar os alunos para as profissões do futuro, pois muitas pesquisas dizem que vários empregos da próxima década ainda não existem. Necessitamos de desenvolver diversas competências nos nossos alunos, para os dotar de ferramentas que os tornem adultos capazes, críticos, empreendedores e seguros/confiantes das suas capacidades. Conhecer o aluno, reconhecer as mudanças necessárias e saber envolver o aluno, serão premissas essenciais para que as aprendizagens sejam significativas”.
Vítor Lapa, director dos Núcleos de Caldas da Rainha e Peniche do CENFIM, disse à Gazeta das Caldas que um dos principais desafios “é captar jovens para o ensino tecnológico. Pode atá parecer um contrassenso, num tempo em que a tecnologia está na base de tudo, mas efectivamente os jovens não se sentem atraídos pelas profissões ligadas às indústrias e tecnologias. No CENFIM ensinamos e trabalhamos áreas profissionais às quais ainda, erradamente, estão associados ambientes hostis e sujos, tarefas duras e pesadas, mas felizmente para os milhares de profissionais deste sector a evolução tecnológica transformou as suas profissões e hoje são muito mais informatizadas que pesadas”, fez notar.
A dificuldade em encontrar formadores com as caraterísticas que procuram “disponíveis para colaborar na formação em horário laboral, é uma tarefa árdua e um grande desafio que acaba por limitar a nossa capacidade de formar”.
Acresce que o “o ritmo a que a tecnologia evolui obriga a que as escolas, e a nossa em particular, acompanhem as novas tendências tecnológicas tornando difícil a aquisição de equipamentos e instrumentos que estejam actualizados e equiparados ao que se utiliza na indústria. Conseguir financiamento para essa actualização é outro desafio muito relevante”.
Vítor Lapa nota ainda que para o futuro, no caso deste centro de formação, é importante “juntamente com as empresas do sector da Metalurgia, Metalomecânica e Electromecânica, tornar as suas profissões mais atrativas para jovens e adultos”, mas também “convencer as empresas a libertar os seus profissionais qualificados e técnicos especialistas para a missão de transferir a sua experiência e conhecimento para os formandos” e ainda “ter a capacidade financeira para investir em recursos tecnológicos e humanos que nos permitam acompanhar a evolução tecnológica”.
Este responsável sente que “na sequência do que já está a acontecer agora, a aprendizagem tenderá a ser mais baseada em projectos que integrem vários domínios/disciplinas aumentando a interligação e transversalidade dos conteúdos” e portanto “os professores/formadores assumirão um papel de facilitadores de aprendizagem, orientando os alunos no acesso à informação e na forma como estes a devem aplicar”.
Nesse sentido, Vítor Lapa prevê que “os recursos e métodos pedagógicos serão orientados para permitir a autoaprendizagem, cabendo ao formador acompanhar e orientar os formandos nesse processo, possibilitando ritmos e níveis de aprendizagem diferenciados. Este modelo, que já está em prática no CENFIM, para adultos, através do projecto “Oficina Individual de Formação”, permite aos formandos escolherem o seu horário e ritmo para fazerem o seu percurso formativo (passagem pelas várias etapas do circuito onde estão os recursos didáticos) que é acompanhado e monitorizado pelo formador, à semelhança do que existe por exemplo nos ginásios”.
A terminar, realçou ainda que “é muito importante que se assegure que a rede de transportes públicos colectivos cubra as várias áreas do concelho das Caldas da Rainha e a sua ligação aos concelhos vizinhos, para que os jovens e adultos desses concelhos possam escolher a sua área de formação sem que estejam limitados pela inexistência de transporte ou transporte com horário compatível com a frequência dos cursos”. ■

































