Edifício da ESAD obtém classificação como monumento de interesse público

0
769

Concluído em 1997, e Prémio Secil, o edifício é considerado uma obra de referência na história da arquitectura portuguesa contemporânea, no entanto as soluções de organização oferecem dúvidas

O Ministério da Cultura classificou como monumento de interesse público o edifício pedagógico 1 da Escola Superior de Artes e Design (ESAD) das Caldas da Rainha e fixou uma zona especial de proteção na envolvente. Desenhado entre 1992 e 1993 por Vítor Figueiredo, e distinguido pelo Prémio Secil de Arquitetura 1998, o edifício “constitui um dos passos mais marcantes da obra” deste arquiteto, refere a portaria publicada a 30 de agosto em Diário da República. O documento explica que o arquiteto “soube contrapor a massa tendencialmente horizontal dos edifícios à verticalidade do pinhal envolvente, criando uma nova polaridade entre a natureza e o imóvel” e deu uma “grande unidade formal e estética” ao conjunto arquitetónico, remetendo para um “vocabulário quase minimalista”.
A classificação do edifício reflete os critérios do caráter matricial do bem, o génio do respetivo criador, o valor estético, técnico e material intrínseco e a sua conceção arquitetónica, urbanística e paisagística. A zona especial de proteção tem em consideração a implantação do edifício e a envolvente urbanística e paisagística e a sua fixação. Impõe, por isso, restrições, como a proibição de obras de alteração da volumetria existente e a preservação dos edifícios correspondentes ao antigo hospital de Santo Isidoro, bem como a envolvente arbórea circundante. Apenas é permitida a reflorestação e a infraestruturação, designadamente ao nível de iluminação e de acessos ao imóvel, “no sentido de fazer prevalecer a relação” entre o edifício e a envolvente natural, “acautelando a salvaguarda do seu enquadramento”.

Dúvidas sobre a pertinência
João Santos, diretor da ESAD, fala do “longo caminho” percorrido desde o pedido inicial até a atribuição do título que, salienta, tem duas consequências: se, por um lado, reconhece o valor do edifício, contribuindo para valorização da região; por outro, sendo esse valor intrínseco à obra e ao seu desenho, deveria ser desnecessária a classificação. “Uma escola, como um organismo vivo, deve poder evoluir sem constrangimentos monumentais”, refere, fazendo notar que o “factor monumento” pode contribuir para atrasar adaptações da ESAD no campo do ensino das artes e do design.
No entanto, as regras estabelecidas para a zona especial de proteção, estendida para além dos limites do campus, têm um enquadramento que “permite ter alguma esperança numa evolução de qualidade, que beneficie a escola e o ensino, o ambiente que integra e a cidade das Caldas”, conclui João Santos.
Para João Serra, professor coordenador jubilado da ESAD, a classificação de uma peça de arquitetura contemporânea é “prestigiante” para a instituição e para a cidade e “um ato de reconhecimento do valor do seu autor, o arquiteto Vitor Figueiredo, e da qualidade do seu projeto”. O caldense não tem dúvidas sobre o facto de se estar perante um edifício de alto valor que merece ser destacado, mas diverge quanto ao método de o consagrar.
João Bonifácio Serra lembra que o projeto da ESAD recebeu, em 1998, o Prémio Secil de Arquitectura, ou seja, a distinção foi efetuada, “em tempo oportuno, em vida do próprio arquiteto”. “A obra é belíssima, o seu valor estético e poético é singular. As soluções de organização do edifício, porém, são questionáveis”, adianta, fazendo notar que, centrado num programa de escola-oficina, a ESAD “não fornece soluções de espaços onde se desenvolvam atividades de gestão científica e de investigação e as condições para a presença dos docentes foi secundarizada”. Ao fim de 30 anos é claro para João Serra que a ESAD projectada por Vitor Figueiredo não é ESAD actual. “O futuro da ESAD passará ou por uma redefinição da sua estrutura interna ou pela construção de novos edifícios”, refere à Gazeta das Caldas. É neste ponto que também arrancam as suas dúvidas sobre a pertinência da classificação. “Este instrumento de valorização pode revelar-se um instrumento de bloqueio da adaptação”, refere, lembrando que na origem do pedido de classificação esteve um protesto contra a substituição do sistema de climatização das salas e o abate dos pinheiros.
“Sendo o edifício público e tutelado por uma instituição que inscreve nos seus fins o ensino artístico e cultural, a pertinência da classificação é, no meu entender, muito discutível”, conclui.■

- publicidade -