Digital: como uma ameaça se pode tornar uma oportunidade para os jornais

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A Google tem vindo a pagar campanhas de publicidade na imprensa dita tradicional

Gigantes tecnológicos beneficiaram, durante anos, de conteúdos produzidos pelos jornais, mas começam a perceber que têm de ajudar a pagar o jornalismo de qualidade que (ainda) se faz.

Quando a televisão surgiu, dizia-se que ia “matar” a rádio, mas, apesar da concorrência “desleal”, não foi isso que sucedeu. Com os jornais está a passar-se o mesmo: o digital, através da transferência de leitores e anunciantes, fez tremer o edifício da imprensa tradicional, mas, passado o choque inicial, começa a vislumbrar-se um futuro em que o digital e o papel podem coexistir e, até, em certa medida, beneficiar as empresas jornalísticas.
Há, de resto, já alguns exemplos de como é possível criar valor ao mercado e continuar a ser uma referência como marca de informação, garantindo a tão ambicionada sustentabilidade.
O colosso “The New York Times” conseguiu fazer essa transição, através de uma profunda reestruturação interna. Hoje em dia, os jornalistas daquele diário norte-americano já produzem mais notícias para o site e para as newsletters do título do que para a edição impressa, que passou a disponibilizar um conteúdo premium. Mas também no site foi possível fechar conteúdos e entregar jornalismo de qualidade aos assinantes, que estão disponíveis para pagar por informação fidedigna.
E em 2020, mesmo tendo em conta que foi um ano de pandemia, a verdade é que, pela primeira vez na história, o “The Times” conseguiu obter mais receitas no digital do que no papel, sem perder a relevância nas bancas.
Aos poucos, também os gigantes tecnológicos que viveram, durante anos, à conta dos conteúdos jornalísticos das empresas de comunicação social começam a despertar para a necessidade de pagar pelo jornalismo de qualidade que (ainda) se faz.
Em 2020, em plena pandemia de covid-19 e quando a circulação digital dos meios cresceu de forma exponencial, a Google criou um Fundo de Apoio de Emergência que apoiou financeiramente títulos como a Gazeta das Caldas. Contudo, há muito por fazer no que diz respeito à forma como as notícias são distribuídas, até porque, a título de exemplo, a Google, o Facebook ou o Twitter não pagam aos jornais para permitir a partilha de links de notícias. Em termos legislativos começam a surgir alguns planos disruptivos, mas na Europa ainda não é assunto.
Ainda assim, projetos como o Google News Initiative, que tem vindo a fazer campanhas de publicidade na televisão e na imprensa generalista nacional, ou os Facebook Articles, em que aquela rede social paga aos produtores de notícias por cada vez que um utilizador abre uma notícia, indicam o caminho de futuro no setor.
A Google ainda tem outra preocupação: a de dotar os jornalistas de ferramentas digitais que visam facilitar o trabalho dos profissionais da informação, com recursos como o Google Tradutor, o Google Trends ou Google Dataset Search, para além de proporcionar formações no uso de ferramentas mais comuns para os utilizadores, como a pesquisa.

E as fake news?
O “fact checking” é uma palavra que, nos últimos anos, começou a tornar-se corrente nas redações, sobretudo devido à forma como as chamadas fake news galgaram terreno no espaço mediático. De repente, vários órgãos de comunicação social começaram a criar departamentos para… verificar notícias, algo que, no fundo, já devia estar inerente à profissão (e à missão) do jornalista.
Para o presidente da Associação da Imprensa de Pernambuco, a questão é complexa, mas os títulos devem deixar a decisão na mão do leitor.
“O primeiro passo para resolver a questão tem que ver com a sociedade. O leitor deve ir à fonte em que acreditam. As pessoas acreditam no seu jornal. A partir daí, teremos leitores que fazem análise do que estão a ler. As fake news sempre existiram, apenas elas se adaptaram à realidade”, frisa Múcio Aguiar Neto.

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