Desenhos de José Vilhena no CCC

0
2058

Está patente até ao fim do mês no CCC uma exposição de capas e contracapas de autoria de José Vilhena. São 23 desenhos publicados entre os anos 50 e a década de 70 do século passado. A mostra pretende recordar aos mais velhos esta figura irreverente, mordaz e crítica, dando-a ainda a conhecer às gerações mais novas. Na inauguração, o sobrinho do autor sugeriu a criação de uma Casa do Humor nas Caldas, ideia que já conta com uma outra proposta anterior de António, para reunir nas Caldas a história do World Press Cartoon e do Humorismo no mundo.

“Pior que qualquer dos antecedentes este livro constitue uma ofensiva cerrada do autor contra a Sociedade estabelecida. É irreverente, anti-religioso, imoral e indecente, ataca tudo e todos para insinuar ideias que são mais do que cripto-comunistas. A sua irreverência é maciçamente insultuosa para a Religião Católica, achincalhando os Livros Sagrados e toda a espiritualidade cristã, é insultuoso para os judeus como Povo, a sua imoralidade despreza todos os limites, a sua indecência é claramente obscena e as insinuações agressivas para a política nacional são constantes”, é assim que a censura analisa em 1965 a obra “História Universal da Pulhice Humana – 3º volume”, da autoria de José Vilhena.
“Tudo indica pois que seja de aplicar uma rigorosa proibição”, conclui o chefe do serviço, Rodrigo de Freitas. E era muito isto que marcava José Vilhena, na sua irreverência. “O meu tio chegou a estar preso três vezes e foi várias vezes chamado à PIDE e à censura, porque era um provocador”, explica o sobrinho e detentor do espólio, Luís Vilhena.
Quando começou a desenhar para o Diário de Lisboa, José Vilhena seguia a escola de desenho francesa e fazia mais a anedota. É com O Mundo Ri que vê duas capas serem censuradas. “Penso que foi o pior que lhe fizeram, porque isso deu-lhe imensa vontade de fazer os livros”, explica o sobrinho.
Esses famosos livros do Vilhena, que escrevia, desenhava, paginava, editava e que até estava presente no processo de impressão. Depois, tinha duas carrinhas que distribuíam os livros pelo país todo.
Mas estas obras não eram vendidas em qualquer livraria, eram aliás muito poucas as que arriscavam a vendê-las. Os livros do Vilhena encontravam-se sim em tabacarias. Eram guardados e depois vendidos “por baixo do balcão”, porque comprar uma obra destas era como uma pequena transgressão, uma afronta ao regime.
O “mau nome” do autor é algo que ainda se mantém. “Continua a ser uma espécie de autor maldito”, faz notar Luís Vilhena, notando ainda que o facto de o tio ter conseguido viver deste trabalho ao longo da vida, foi o que lhe conferiu a autonomia necessária para ser crítico.
No CCC, até ao final do mês de Dezembro, é possível apreciar uma mostra que reúne capas e contracapas dos mais de 80 livros de sua autoria, mas também livros que traduziu ou “apenas” ilustrou. São 23 desenhos, organizados cronologicamente, desde os anos 50 à década de 70 do século passado.
A evolução das técnicas e do traço do autor, mas também das próprias temáticas é perceptível numa análise das obras. Na mostra é também possível ver livros e revistas e ler alguns dos relatórios da censura sobre José Vilhena.
O sobrinho do autor está a preparar uma exposição maior, que abarca as obras desde que José Vilhena começou a fazer os cartoons para o Diário de Lisboa, passando pela série O Mundo Ri, pelos livros (desde 1956 aos anos 70) e ainda os desenhos da Gaiola Aberta, do Fala Barato e do Cavaco.
Até essa exposição, que poderá acontecer em Lisboa ou nas Caldas, tem feito exposições temáticas. Esta mostra já esteve em Coimbra e agora foram adicionados alguns desenhos. Depois deverá seguir para Tomar, com mais algumas obras.

Casa do Humor poderia ser nas Caldas

O convite para expor nas Caldas surgiu da parte do colega e amigo, Jorge Mangorrinha, confrade da Confraria do Príapo. Depois da inauguração da exposição realizou-se uma tertúlia com o sobrinho do autor e com o investigador Álvaro Costa de Matos. Aí, Luís Vilhena sugeriu que as Caldas poderia ser o local para a criação da Casa do Humor, um espaço museológico dedicado a esta temática, numa cidade com tradição satírica tão forte.
Ana Marques, vice-presidente da Confraria do Príapo (cuja presidente, Maria Dulce Horta, se demitiu recentemente), revelou que o sobrinho do autor doou uma revista de José Vilhena à confraria.

- publicidade -