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Os dois entrevistados usam linguagens artísticas para lutar contra a doença: Daniela Reis as artes de palco, João Serigado a pintura nas telas e na cerâmica.
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Daniela Reis recupera de um AVC com ajuda das técnicas teatrais
Daniela Reis tem 30 anos e formou-se em Teatro na ESAD. Aos 21 anos sofreu um AVC. Por causa da doença perdeu uma bolsa que tinha ganho numa escola inglesa, mas não baixou os braços, apesar do ataque de coração hemorrágico que, a dado momento, a deixou sem andar ou falar. Passado quase uma década quer ajudar outros que tenham passado pelo mesmo. Foi com a ajuda das técnicas teatrais que conseguiu ultrapassar muitas barreiras, causadas pela doença e por isso quer agora ensiná-las a outros que tenham passado pelo mesmo.
Daniela Reis é natural da Marinha Grande. Tinha 21 anos e vivia nas Caldas o último dia da sua licenciatura em Teatro quando sofreu um AVC hemorrágico, provocado por uma malformação congénita.
“Estava a fazer um último trabalho em casa, com uma amiga, quando me comecei a sentir mal”, contou, recordando que percebeu que era sério o que estava a sentir. Chamou o INEM e não se deu conta que já tinha perdido a capacidade de falar. Com a ajuda dos companheiros de casa, chamaram um táxi para a levar ao hospital das Caldas. Assim que chegou à triagem começou a vomitar, tendo os profissionais de saúde constatado que era algo grave. Infelizmente, quando um jovem tem um AVC “julga-se que é motivado por overdose, ou por tentativa de suicídio”, disse. A sociedade ainda não está preparada para este tipo de problemas de saúde em gente tão jovem. Mas o que é facto é que tal acontece, para desespero dos próprios e seus familiares.
Do hospital das Caldas, Daniela Reis passou para o de Leiria (área de residência) e, mais tarde, para o Hospital dos Covões (Coimbra).
O seu estado requereu vários meses de recuperação. A legislação não prevê que gente jovem tenha estas problemáticas de saúde, logo a burocracia é imensa, escasseiam os apoios e torna-se um grave problema quando se está em plena vida activa. “Ninguém nos dá emprego…”, queixou-se a jovem, a quem o ataque cardíaco deixou com uma incapacidade de 60%.
Recuperar com ajuda do teatro
Daniela Reis teve que reaprender quase tudo, desde andar até ao falar. Mas não esmoreceu. Teve que pôr para trás das costas o facto de ter ganho uma bolsa, oferecida pelos rotários para frequentar a Academia Londrina de Música e Arte Dramática.
Agora era preciso recuperar. E além da frequência da fisioterapia, que conseguiu cedo, reparou que as técnicas que tinha aprendido no seu curso de Teatro lhe eram muito úteis. As aulas de Voz, da docente Ana Sacramento, foram a base para os exercícios que Daniela Reis fez para reaprender a falar, capacidade que foi gravemente afectada pelo AVC.
O mesmo aconteceu com os exercícios de respiração que lhe permitiam controlar as dores. Foi também o que aprendeu nas aulas de arte dramática que a ajudaram a encontrar novamente o seu ponto de equilíbrio e a corrigir a marcha.
Depois de um ano de fisioterapia (terapia diária de várias áreas), quando se sentiu minimamente recuperada, informou a mãe que vinha morar sozinha para as Caldas. “Eu precisava de provar que era capaz”, disse a jovem, que ainda mal andava nessa altura. “Só que há coisas que ninguém vai fazer por nós”.
Quando as melhorias são lentas…
Daniela Reis tem estado em contacto com várias pessoas vitimas de AVC e, nalguns casos, os doentes sofrem algumas alterações na sua personalidade. “Eu continuo a ser a mesma. Aprendi a ser paciente, algo que não era antes do ataque…”, disse a jovem, comentando que era até um pouco rebelde e que, por norma, agia primeiro e pensava depois.
A recuperação permitiu-lhe voltar ao controlo da sua vida.
Inscreveu-se em mestrado na ESAD para prosseguir estudos na arte dramática. Completou o primeiro ano, resolveu fazer o segundo em Riga, na Letónia.
Durante um interregno, tirou o curso de Gestão Hoteleira, em Faro, com bolsa. Também deu explicações e aulas de Música e de Expressão Dramática nas AEC’s e na Universidade Sénior em Leiria.
Referindo-se ao apoio da sua família, diz que os cuidadores são essenciais, mas que também eles deveriam poder contar com apoio psicológico.
Outra das consequências do ataque foi que Daniela Reis não vê bem e sofre agora de epilepsia, que também lhe condiciona a vida e a faz tomar mais medicação.
Dois anos depois do AVC, as coisas começam a estabilizar, ou seja, “as melhorias evoluem de forma mais lenta e começamos a desanimar”, contou.
Financiamento colectivo para pagar propinas
Ainda assim, com uma parca pensão de invalidez, Daniela Reis precisava de ajuda para pagar as propinas na ESAD. Mesmo vítima de AVC, não conseguiu ter direito a bolsa.
Desta forma, Daniela Reis recorreu ao financiamento colectivo na plataforma on-line tendo obtido numa semana os 1514 euros necessários para saldar a sua conta na universidade.
Orientada pelo docente da ESAD, Guilherme Mendonça, a mestranda Daniela Reis dedica-se agora à parte prática da tese “O Treino de Actor como parte da recuperação de doentes de AVC”.
Realizar este estudo académico “trouxe-me muita paz de espírito”, disse a autora, que contou com o auxílio do seu orientador para separar o facto de ter sofrido o AVC e de agora ser investigadora académica.
“No início cheguei a emocionar-me…”, contou a jovem, que agora está a realizar estudos de caso e por isso quer reunir um grupo de pessoas que tenham sofrido AVCs.
Daniela Reis pretende trabalhar com maiores de 15 anos (que não estejam a fazer terapia) e dar-lhes a conhecer as técnicas que aprendeu no curso de Teatro pois estas foram-lhe muito úteis no seu processo de recuperação.
“De seis em seis meses pergunto à minha neurologista se posso deixar alguma da medicação ao que ela responde que não, que não devo pois estou estabilizada”.
Apesar de tudo, Daniela Reis sente-se bem e com apoio de familiares e amigos. Além do querer constituir um grupo de pessoas que sofreram de AVC e de as querer ajudar a recuperar, a mestranda da ESAD gostaria de um dia regressar aos palcos.
E pensa fazê-lo com uma peça de Ibsen, “Quando nós, os mortos, despertamos”, por ser uma obra que lhe é cara e lhe diz muito. E, com certeza, não faltará gente para a aplaudir na plateia.
