Num ano tão atípico como este, marcado pelos impactos que a pandemia teve nas vidas de milhões de pessoas, a Gazeta das Caldas apresenta-lhe histórias de alguns emigrantes oriundos dos concelhos do Oeste que se encontram espalhados pelo planeta e que vão ter, certamente, um mês de Agosto muito diferente do habitual. Houve quem optasse por ficar no país de acolhimento durante este Verão, mas também há quem tenha arriscado fazer a viagem de volta a casa durante a pandemia, para rever a família e retemperar energias

Este ano não há 15 de Agosto nas Caldas, nem se realizam os eventos, como a Feira de São Bernardo, em Alcobaça, que eram verdadeiros pontos de encontro dos emigrantes portugueses espalhados pelos quatro cantos do mundo. A pandemia continua a ter fortes impactos na vida de milhões de pessoas e a condicionar o regresso a casa daqueles que partiram em busca de um futuro melhor. Razões para ouvir os protagonistas de um Agosto, certamente, muito diferente do habitual na região Oeste.

UMA ASTRÓNOMA CALDENSE NO ORIENTE

A caldense Joana Marques é investigadora na área de Educação de Astronomia. Tem 39 anos e vive em Zhuhai, na província de Cantão, na China, país onde se registaram os primeiros casos de infecção por covid-19.
Tal como milhares de emigrantes, este ano as férias não serão em Portugal, junto da família. “A China ainda tem as fronteiras fechadas a cidadãos estrangeiros, mesmo que portadores de visto”, explica. Ou seja, se a família viesse a Portugal estava impedida de “voltar a casa”.
De qualquer modo, por razões de segurança, mesmo se pudesse voltar, Joana Marques não iria fazê-lo, assim como também não pretende viajar dentro da China. “Temos uma filha muito pequena, e apesar da situação estar muito controlada aqui, este ano optamos por ficar mais por casa e aproveitar a praia e outras áreas de lazer aqui em Zhuhai”, rematou.
Porém, aquele gigante asiático não foi o primeiro destino de emigração da caldense. “A primeira aventura foi para o Brasil, e só depois é que viemos para a China”, contou a investigadora, explicando que ela e o marido se mudaram para o país oriental por razões profissionais. São ambos académicos e buscam novas oportunidades profissionais e de continuação dos estudos.
Conta que em Zhuai a qualidade de vida “é muito boa” e que a cidade tem muito para oferecer, “desde quilómetros de praia, imensos parques com vegetação luxuriante, museus (incluindo o maior aquário do mundo), zonas históricas e muitos e diversos restaurantes de deliciosa comida chinesa!” Além disso, Zhuhai tem fronteira terrestre com Macau e, portanto, “num instante” pode “estar a comer um pastel de nata” enquanto ouve “falar Português num cafezinho de Macau, onde ainda existe uma grande comunidade portuguesa”. A caldense destacou “a enorme hospitalidade dos chineses, que foi uma surpresa” e admite que a barreira cultural e da língua na China “é muito grande”, o que por vezes pode tornar coisas simples do dia-a-dia “muito complicadas”. Para a investigadora caldense salva-se a simpatia dos chineses para com os estrangeiros e que ajuda “a tornar tudo mais fácil”.

GAEIRENSE ATRAÍDO PELO FASCÍNIO DA GRÉCIA

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Cláudio Rodrigues, de 28 anos, natural das Gaeiras, está a viver em Atenas, na Grécia, há dois anos.
“É um país fascinante. Antes de se ver, cheirar ou conhecer, já se sonha com os recantos, a história e os pensamentos que deambularam ao longo do tempo por estas travessas”, conta à Gazeta das Caldas o arquitecto de soluções na empresa Omilia Conversational Intelligence.
Deixar Bruxelas, onde viveu antes de se instalar em Atenas, foi uma decisão ponderada e que teve em conta a vontade de triunfar profissionalmente também no sector privado. Depois de ter trabalhado seis anos em organismos públicos, surgiu um convite que lhe permitiria ajudar uma pequena start up, na área da inteligência artificial e telecomunicações, a crescer no mercado internacional. “Felizmente tem sido uma história de sucesso”, com a empresa a ter um crescimento exponencial. Nos últimos dois anos passaram de 40 pessoas para mais de 300.
O que a Grécia “tem de incrível, para além do clima, da paisagem e da história, são as pessoas: a capacidade que têm de expor a alma com uma elegância e dignidade ímpares. Independentemente do tempo, ensinam-te a olhar para o horizonte com o entusiasmo de um universo novo”, considera.
Este ano, a pandemia impediu que viesse a Portugal de férias visitar a família. Vive numa cidade grande e a probabilidade de contrair o vírus “é sempre maior do que na aldeia”, compara o jovem que optou por sacrificar “matar” as saudades.

DA PASTELARIA À TELEVISÃO NO CANADÁ

A cadavalense Cristina Gonçalves de Jesus decidiu emigrar em 2012, mas só chegou a Toronto, no Canadá, em Janeiro de 2014. Quando decidiu sair trabalhava na Associação Empresarial de Óbidos e o facto de trabalhar “muitas vezes aos feriados, fins-de-semana, até tarde, e não tinha direito a pagamento de horas extraordinárias”, levou-a a arriscar. Já tinha sentido dificuldades para receber o salário a tempo e horas e, aos 45 anos, “estas situações começam a ser intoleráveis” e “ninguém pode organizar-se financeiramente desta forma”. “Então decidi que ou tomava a decisão de emigrar ou, pelo factor idade, jamais sairia de Portugal e não tinha grande esperança de que o futuro mudasse”, nota.
Chegou ao Canadá em pleno Inverno, com as temperaturas a rondar os 30 graus negativos e a “tentar encontrar trabalho o mais rápido possível”. Em situação ilegal, a primeira coisa que apareceu foi uma pastelaria portuguesa. “Ao fim de dez dias, estava a trabalhar”, relembra. Por lá ficou dois anos, até começar a fazer limpezas em casas particulares. “Pelo menos tinha os fins de semana livres e ganhava um pouco melhor”, justifica.
Ao fim de cinco anos conseguiu legalizar-se, depois de casar com um… argentino. Foi então que conseguiu voltar ao Cadaval. Quando regressou a Toronto, a mudança foi contínua. E bastante profunda.
“Voltei ao Canadá e mudei de emprego. Passei por uma agência de viagens, restaurantes, escritórios de advogados e comecei a trabalhar também numa televisão portuguesa”, explica Cristina Jesus, que vive um “desafio diário”, pois nunca fizera televisão. À segunda-feira faz o programa do resumo desportivo do futebol com comentadores a defenderem as cores dos três grandes de Portugal e de terça a sexta faz o Telejornal. Mas não se fica por aqui, pois ainda tem tempo para ser personal shopper.
No Cadaval deixou uma filha, que vive com o pai, e a mãe. Sente falta da família e “dos sábados de manhã”, em que tinham “tempo” e tomavam o pequeno-almoço “juntas”. Mas também “do cheiro das vindimas, das vozes das pessoas conhecidas, da calçada portuguesa, da comida, da alegria do povo português, do comércio tradicional”. De se “sentir em casa”.

UMA NAZARENA EM TIMES SQUARE

Se é certo que há muitos milhares de emigrantes que, por receio, não fizeram o trajecto de regresso a casa nesta época de Verão, também há quem tenha feito precisamente o contrário. Foi o caso da nazarena Maria Midões, de 36 anos, que vive e trabalha em Nova Iorque e foi mãe recentemente. A vontade de regressar às origens e, sobretudo, de apresentar o novo elemento da família falou mais alto, pese embora as contrariedades que sentiu desde o momento em que decidiu apanhar um voo para Portugal.
“Tínhamos viagem marcada para dia 2 de Abril e a mesma foi cancelada. Depois disso não nos pareceu seguro viajar com o nosso bebé e acabámos por adiar até Julho, altura em que finalmente viemos”, explica a fotógrafa, que tem família e viveu e estudou nas Caldas da Rainha.
A mudança para os Estados Unidos ocorreu há pouco mais de cinco anos, depois de ter sofrido uma perda irreparável. “Mudei-me em Janeiro de 2015 para Nova Iorque, depois de, em 2014, ter perdido os meus pais. Precisava mudar de ares e candidatei-me a um estágio de fotografia para o qual fui aceite. Primeiro, fui por três meses e depois consegui o visto e fiquei sem compromisso”, nota a prestigiada fotógrafa, que tem mais de 50 mil seguidores na rede social Instagram, devido ao trabalho que assina e que, como alguém já descreveu, é literalmente de “comer e chorar por mais”.
Esta fotógrafa de comida vive num bairro de Brooklyn, chamado Greenpoint, e trabalha como freelancer na área de fotografia e criação de conteúdo. Plenamente estabelecida (e reconhecida) em terras do Tio Sam, foi nos Estados Unidos que, curiosamente, conheceu um português, natural do Fundão, por quem se apaixonou. Entretanto, foram pais. E os planos de futuro, para já, são muito indefinidos. “Agora dizemos que vamos ficando até gostarmos”, sublinha
Para Maria Midões, ser emigrante não são só vantagens, mesmo para quem vive na cidade que nunca dorme e onde as oportunidades se sucedem na área em que se celebrizou. Porque, mesmo a milhares de quilómetros de distância, a palavra saudade faz-se sentir. E por variadíssimas razões. “O que mais sinto falta é da família e dos amigos, sempre. Os mercados da fruta e do peixe também. Temos um país maravilhoso, é fácil ter saudades”, dispara a fotógrafa, que já fotografou celebridades internacionais e, claro está, a apresentadora… Cristina Ferreira.

Emigrante caldense vai lançar livro de crónicas em Tornada

O primeiro livro de André Serrenho tem como título “Do Berço ao Caixão” e vai ser lançado a 24 de Agosto, pelas 18h00, no Manjar de Tornada.
O autor caldense estudou na sua terra natal e seguiu para o ensino superior em Lisboa. Como o curso não lhe garantiu emprego, decidiu aventurar-se no estrangeiro. Primeiro emigrou para o Reino Unido e, mais tarde, para a Polónia, onde se tem mantido até agora.
O autor dedica-se a produzir crónicas e foi naquele país de leste que André Serrenho aprumou o seu gosto, já antigo, pela escrita, tendo decidiu escrever o seu primeiro livro de crónicas.
Trata-se de uma compilação de relatos “sobre tudo e sobre nada. Sobre a vida e sobre a morte. Sobre o quotidiano e a sua portugalidade intrínseca. Sempre num tom satírico e pragmático”, refere o caldense.

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