Mais de três centenas de professores, funcionários e encarregados de educação do Agrupamento de Escolas Rafael Bordalo Pinheiro (AERBP), assinaram um documento enviado ao governo onde pedem a revisão da constituição deste agrupamento com vista à separação de Santa Catarina.
O documento que mereceu este consenso enuncia as irregularidades do processo de constituição do agrupamento e refere que a prática demonstra que o mesmo não é funcional.
O Agrupamento de Escolas Rafael Bordalo Pinheiro foi criado em 2012, agregando a Escola Secundária Rafael Bordalo Pinheiro e o Agrupamento de Escolas de Santa Catarina, mas a sua constituição nunca foi consensual. Agora, a disponibilidade do governo em rever os agrupamentos de escolas que não estiverem a funcionar bem, levou a comunidade educativa a pedir uma análise do seu funcionamento e o seu possível reordenamento.
No abaixo-assinado são contestadas, desde logo, irregularidades do processo de constituição do agrupamento, salientando a conduta “pouco idónea e arbitrária” do então director regional de Educação na condução do processo. Criticam a falta de rigor, o facto das escolas não terem sido ouvidas e de não ter havido uma ampla discussão com toda a comunidade educativa.
O documento refere ainda que houve desrespeito pelos critérios legalmente estabelecidos pois o agrupamento não se enquadrava nos pressupostos que orientam a constituição dos agrupamentos verticais. Por um lado, “pela dificuldade em dar coerência” aos projectos e valores defendidos pelas duas escolas e, por outro, pela impossibilidade de “proporcionar um percurso sequencial e articulado dos alunos”, uma vez que eram poucos os alunos de Santa Catarina que prosseguiam os estudos secundários na Bordalo Pinheiro (que se situa a 17 quilómetros de distância por uma estrada sinuosa) optando os seus pais por matriculá-los na Benedita, a apenas três quilómetros.
Por outro lado, a Escola D. João II, situada mesmo ao lado da Bordalo Pinheiro (apenas separada por uma rede) ficou sem agrupar.
As duas escolas agrupadas possuem ainda identidades “bem vincadas e diferentes”: uma integrada num meio urbano e outra com uma envolvente essencialmente rural, que inviabilizam um projecto educativo e uma unidade orgânica coesa. “As escolas foram coercivamente agregadas e forçadas a um projecto educativo único, por isso desenraizado da realidade e desrespeitando a identidade de cada uma”, refere o documento.
Por outro lado, consideram que a articulação vertical dos diferentes níveis e ciclos de escolaridade não fazia sentido para as comunidades educativas de ambas as escolas.
Já depois de formalizado o agrupamento, a discordância de professores e funcionários manteve-se. De acordo com o documento, regista-se que a maioria dos alunos de Santa Catarina prossegue os estudos noutros concelhos mais próximos, nomeadamente no de Alcobaça, na Benedita.
Para além disso, a Câmara, que na altura manifestou intenção em melhorar a rede e qualidade dos transportes entre as duas localidades, não o fez até ao momento.
O facto de Santa Catarina se localizar no extremo do concelho acarreta outras consequências negativas para o funcionamento do agrupamento. Não permite a deslocação e comunicação eficaz entre as escolas e impede uma gestão de proximidade. Também os pais, quando precisam de tratar de alguma questão administrativa, têm que se deslocar à escola-sede, a 17 quilómetros de distância e por “uma estrada cheia de curvas”.
As duas escolas têm ainda complexidades próprias. Por um lado, a Bordalo Pinheiro possui vários cursos profissionais, cuja gestão contabilística implica dinâmicas diferentes do ensino regular, assim como cursos vocacionais, de ensino e formação de adultos e de ali estar alocado o CFAE Centro-Oeste e o CQEP, cuja gestão financeira passa pela contabilidade da escola.
Já na EB de Santa Catarina, as duas unidades de Multideficiência e muitos alunos com necessidades educativas especiais requerem, por exemplo, transportes adaptados.
CONSENSO ALARGADO
De acordo com Manuel Nunes, um dos professores que subscreve o documento, este foi assinado por 304 pessoas. Na sua maioria assinaram professores da Bordalo Pinheiro, a quase totalidade dos funcionários das duas escolas (Bordalo Pinheiro e Santa Catarina) e encarregados de educação (sobretudo de Santa Catarina). Figuram ainda 13 assinaturas de elementos do Conselho Geral do agrupamento.
Em Abril deste ano, numa visita feita à escola Bordalo Pinheiro, a deputada socialista Odete João deixou a garantia de que este partido estava disponível para discutir eventuais desagregações de agrupamentos (até porque também prometeu faze-lo para as uniões de freguesia), podendo ser um deles o Agrupamento de Escolas Rafael Bordalo Pinheiro.
Em declarações recentes à Gazeta das Caldas, a deputada disse que aguardava informação sobre a forma como tem decorrido o funcionamento do agrupamento “e depois tomaremos as diligências que entendermos necessárias”.
Odete João disse ainda que “a criação do agrupamento não obedeceu às regras, nomeadamente as da continuidade pedagógica e da continuidade territorial”. E prosseguiu: “havia uma grande apreensão face à constituição do agrupamento. As condições de partida não foram boas”.
PROFESSOR VERSUS VEREADOR
Alberto Pereira não se quis pronunciar na qualidade de vereador da Educação, uma vez que o documento não foi apresentado ao executivo camarário, à Assembleia Municipal nem ao Conselho Municipal da Educação. No entanto, esteve presente (como vereador) no Conselho Geral do agrupamento (no passado dia 30 de Novembro) onde este documento foi apreciado e a opinião pessoal que defendeu nessa sessão – e também enquanto professor da Bordalo Pinheiro na altura da agregação – é que o processo deve ser revertido. Ele próprio assinou em 2012 um abaixo assinado contra a constituição do agrupamento.
Alberto Pereira diz que não se debruçou ainda sobre as questões legais abordadas no abaixo assinado, pelo que não as pode comentar. No entanto, considera que o documento peca por ser “pouco ambicioso”, por não apontar uma solução e por não ter sido colocado à consideração dos professores do 1º ciclo e do pré-escolar e do pessoal não docente. “O desfazer de um agrupamento tem impacto na vida destes profissionais”, observa.
O vereador referiu que o documento nem foi objecto de uma tomada de posição no Conselho Geral do agrupamento e que foi ele próprio o único a apresentar ideias concretas.
Alberto Pereira diz que o agrupamento deveria ser revertido, até por já não existirem os constrangimentos que levaram à sua criação. Na sua óptica, no concelho das Caldas deveriam existir três agrupamentos (D. João II, Santo Onofre e Santa Catarina com as respectivas escolas do pré-escolar e 1º ciclo) mais duas escolas secundárias (Bordalo Pinheiro e Raul Proença).
Em todo o caso, não vê nenhum drama na apresentação deste documento e acredita que este pode ser “um ponto de partida” para uma discussão que deve ser “muito mais alargada do que apenas no Conselho Geral do agrupamento”. Entende que o assunto deve passar pela Câmara Municipal, pela Assembleia Municipal, pelo Conselho Municipal da Educação e ser ainda discutido internamente em cada um dos agrupamentos existentes. Diz ainda que os assuntos quando são apresentados e discutidos “com mérito” podem chegar ao nível superior, mas adverte que “a palavra final caberá sempre ao Ministério da Educação”.
Gazeta das Caldas contactou a presidente do Conselho Geral do Agrupamento de Escolas Rafael Bordalo Pinheiro, Manuela Silveira, que não se quis pronunciar sobre esta questão. Até ao fecho da edição não foi possível contactar a directora do agrupamento, Maria do Céu Santos.































