Comemora-se este ano o V Centenário da morte da Rainha Dona Leonor de Lencastre

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Nicolau Borges
Historiador

Comemora-se este ano o V Centenário da morte da Rainha Dona Leonor de Lencastre, fundadora do Hospital Termal das Caldas da Rainha, falecida a 17 de novembro de 1525.
O concelho das Caldas da Rainha não podia esquecer, nem alhear-se, da nobre e digna evocação que a “nossa Rainha fundadora” merece e justifica, programando um conjunto de ações e eventos que assinalarão e celebrarão a sua vida e a sua obra.

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Desse programa se dará conta muito brevemente, aproveitando-se tal pretexto para evocarmos a forma como se assinalou e comemorou o V Centenário do seu nascimento.
Com efeito, no dia 2 de maio de 1958 evocou-se e celebrou-se o V Centenário do nascimento da rainha dona Leonor de Lencastre(1458-1525), fundadora do Hospital das Caldas da Rainha “alma mater” da cidade termal.

Tomou a iniciativa de tão distinta evocação a Fundação Calouste Gulbenkian, decisão de Azeredo Perdigão, seu presidente, que pretendeu com a iniciativa celebrar tão importante personalidade histórica, mas também iniciar uma nova fase na promoção da cultura portuguesa, através do envolvimento da FCG no panorama da oferta cultural portuguesa, pretendendo fazer “novo e melhor”, abanando assim a tradição salazarista no respeitante à organização, dinamização e socialização das artes portuguesas.

Com efeito, a organização da exposição evocativa do V Centenário da Rainha Dona Leonor, a primeira exposição organizada pela Fundação Calouste Gulbenkian, assumiu-se como um momento de rutura na organização de eventos culturais em Portugal, afirmando um novo modelo de apoio às artes e à cultura, que fizeram da FCG a única instituição geradora de esperança para o desenvolvimento e crescimento criativo dos artistas, único meio de suporte à inovação, experimentação e formação dos artistas portugueses durante quase duas dezenas de anos, prosseguindo até aos nossos dias uma continuada ação mecenática às artes, à cultura, à ciência e à educação.

Na época, a FCG decidiu, antes de qualquer instituição pública, comemorar os 500 anos do nascimento da Rainha D. Leonor (1458-1525), esposa do rei D. João II, irmã do rei D. Manuel I, rainha nas ausências do marido e do irmão, mecenas e fundadora das Misericórdias em Portugal, justificando esta iniciativa do seguinte modo: “Um tal acontecimento não podia ser indiferente à Fundação Calouste Gulbenkian, uma vez que, entre os seus fins estatutários, figura a realização da caridade e a proteção das artes. A Rainha Dona Leonor foi, ao mesmo tempo, uma alma dotada do mais puro amor do próximo e um espírito devotado aos mais belos empreendimentos artísticos e culturais”(Carta de Azeredo Perdigão dirigida a Pedro Teotónio Pereira, datada 4 de dezembro de 1957. p. 2. FCG: Arquivo da Presidência – PRES 108).

A referida exposição foi inaugurada no dia 6 de dezembro de 1958, no Mosteiro da Madre de Deus, cujo restauro, financiado pela FCG, foi propositadamente realizado para este evento. À ideia inicial de expor a vida e a obra da Rainha, juntou-se depois um núcleo dedicado às Misericórdias portuguesas.

Foi uma exposição inovadora e com um sucesso extraordinário. Resultou de um trabalho interdisciplinar coordenada pelo arquiteto Francisco Conceição Silva, (1922-1982), contando com a colaboração dos também arquitetos José Daniel Santa-Rita (1929-2001), Raul Santiago Pinto e o decorador Manuel Rodrigues (1924-1965), seus colaboradores noutros projetos, afirmando-se como uma exposição inovadora ao recorrer a um trabalho de equipa interdisciplinar e revelando de modo mais enfático e criativo o contributo da arquitetura e do design para a concretização de exposições temporárias de arte e história.
A exposição estava dividida em três núcleos principais: Aspetos da época da Rainha, A Rainha e os Artistas e A Rainha e as Misericórdias. Estes núcleos, no Convento da Madre de Deus, distribuíam-se pelas galerias do claustro joanino, salas do primeiro e segundo piso do mosteiro e no claustro pequeno. A sala de Santo António e coro alto faziam também parte do percurso expositivo. Presidiu à sua inauguração o Presidente da República, General Craveiro Lopes, tendo a mesma um forte impacto mediático na imprensa nacional.
A Fundação Calouste Gulbenkian deu assim início a uma ação continuada até aos nossos dias, inspirada na ação mediática da Rainha Dona Leonor, afirmando um compromisso com a cultura portuguesa em todas as suas componentes estruturantes, desde a História, as Artes, a arquitetura, o design, a música, o teatro, através da referência ao apoio da Rainha a Gil Vicente.

Celebremos pois a vida e a obra da Rainha que nos inspira e nos orgulha, com esperança de que, tal como a água termal brota incessantemente nas fontes caldenses também a vontade dos caldenses não se esgote e cumpra o sonho da rainha dona Leonor, que o Hospital Termal, as artes e a solidariedade se afirmem e se regenerem. ■

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