Mais de uma centena de “viúvas” na cremação do entrudo

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A animação foi uma constante durante todo o percurso | Isaque Vicente

Numa noite de 14 de Fevereiro em que a chuva não deu tréguas, mais de uma centena de enlutadas viúvas carpideiras disseram adeus ao Entrudo deste ano. Entre muitas lamúrias e brincadeiras, o tradicional cortejo fúnebre terminou junto à Biblioteca Municipal, onde em vez de enterrado, o Carnaval foi cremado, para renascer das cinzas no próximo ano.

“Ai coitadinho, ele era tão bom… Quando estava a dormir”, diz uma viúva. “Nem isso, que ele ressonava alto!”, responde outra. “Vocês são todas amantes, que ele, mulher, só tinha uma e era eu”, exclama outra. “Deixa lá, eu só quero é a reforma”, retorquiu uma quarta. “Era mas é um felizardo, tinha-as todas para ele”, diz um dos envolvidos na tarefa de carregar o defunto na carreta da agência funerária “Ká Te Espero”.
E quem é o defunto? Um boneco à escala humana, com um descomunal membro viril. Simboliza o Entrudo e viaja na carreta acompanhado por uma embalagem de vinho, do qual as viúvas se vão servindo ao longo do percurso.
A primeira paragem é na Praça da Fruta, depois do cortejo ter passado pela Rainha. Aí são esperados por algumas pessoas que todos os anos gostam de assistir ao enterro do Entrudo.
No tabuleiro da praça descansa-se, conversa-se e, aqueles que querem, bebem um copo de vinho. E siga a marcha, pela rua das Montras e Dr. Miguel Bombarda, passando depois em frente à Gazeta das Caldas e percorrendo a rua Manuel Mafra até nova paragem no largo Frederico Pinto Bastos.
O grupo de mais de uma centena de viúvas lamuriosas (há “viúvas” mulheres e “viúvas” homens, de todas as idades) chama a atenção por onde passa e é comum pessoas virem à janela ou à rua para assistir ou até juntar-se ao cortejo.
Nesta paragem são distribuídas umas hóstias especiais… Tratam-se de jaquinzinhos e vêm acompanhar um novo copo de vinho. Dali até ao local do enterro, onde ninguém é enterrado, mas sim cremado, é um instante. O grupo é agora muito maior que no início do percurso.
Depois de o “padre” Américo Oliveira, ter lido o muito breve discurso (que este ano não teve a piada dos anos anteriores), o Entrudo é levado para o local onde é cremado, mas não sem que antes haja tempo para umas últimas e sentidas despedidas.

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MENOS GENTE POR CAUSA DOS NAMORADOS

José Oliveira vem enterrar o entrudo desde que vive nas Caldas, há cinco anos. Este ano assumiu o  papel de cremador que antes não existia, depois de no último ano ter andado com a candeia em frente à carreta. “Isto quer é inovação”, afirmou.
Ana Alves, mais conhecida como Ana Entrudo, é das Caldas e todos os anos participa neste evento como viúva. “Ele era tão bom, dava-me porrada, mas agora que está morto, ele era tão bom marido!”, brincou.
O gosto pelo Carnaval é o que a traz ano após ano. “Adoro o Carnaval, adoro”, confessou. “Este ano houve pouca gente porque era dia dos namorados e foi tudo comer chouriço, não quiseram vir enterrar o morto”, fez notar com humor.
Uma viúva mais nova, mas ainda assim já com experiência nestes enterros, é Rodrigo Martins, que há três anos se vem despedir do Carnaval neste evento. “É divertido e gosto muito disto, além disso era o meu marido, tinha que vir… É o terceiro que enterro e arranjo sempre outro para matar, eu quero é a reforma”, gracejou.
João Pina, presidente da Associação Cultural Recreativa e Desportiva de Santo Onofre – Monte Olivett, realçou que a meteorologia afectou a adesão à iniciativa, bem como o facto de ter coincidido com o Dia dos Namorados.
Jorge Varela, presidente da Junta de Santo Onofre e Serra do Bouro, que fez todo o percurso do enterro do Entrudo, mostrou-se “muito feliz por ver terminar o Carnaval das Caldas aqui”.
Este é um evento que nasceu há perto de uma dezena de anos, com cerca de 30 pessoas e que daí para cá tem vindo a ganhar adeptos.

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