Carlos Mota regressará às Caldas se “a cidade assim o exigir”

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Carlos Mota esteve à frente do CCC durante 14 anos. Deixou funções recentemente e, neste momento, está a colaborar na programação cultural de outros dois municípios do Oeste. Não se despede pois diz-se disponível para a cidade

 

Como entrou para a direção do CCC?

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Fui convidado pela anterior vereadora da Cultura, Maria da Conceição Pereira, para vir dirigir e programar para o CCC. Estava na altura na direção do Teatro-Cine em Torres Vedras e ainda fiz algum trabalho prévio antes do CCC abrir.
Ajudei a constituir o modelo de organização pois não se sabia se se deveria constituir uma fundação ou qual seria o melhor modelo de gestão. Foram momentos de muito trabalho e dedicação e constituiu-se um modelo associativo com a perspetiva do respeito democrático, da participação de várias entidades. A Câmara das Caldas nunca quis constituir uma empresa municipal para gerir o centro cultural.

Como foi fazer o projeto de arranque para aquele equipamento?
Não foi fácil… Primeiro porque havia uma grande expetativa em volta do novo Centro Cultural. Era algo que já se falava há muitos anos. Ainda se pensou na recuperação do Teatro Pinheiro Chagas, que ficava na Praça 5 de Outubro. Foi-me pedida opinião, eu estava na Casa da Cultura e Santana Lopes era então o secretário de Estado da Cultura, (não havia ainda Ministério). Só que depois de avaliado o tamanho do palco percebeu-se que não se podia receber,por exemplo, uma Companhia de Dança…Hoje se existisse só poderia servir uma pequena companhia ou para receber pequenos projetos. E se calhar poderia ter hipotecado a construção de um projeto como o CCC.

Podia ter feito mais nestes 14 anos que esteve na direção?
Obviamente que podíamos ter feito mais coisas, se tivéssemos mais condições e mais pessoas.
Os meios disponíveis eram muito poucos, os espetáculos decorriam após negociações com os agentes e a larga maioria dos eventos escolhidos tinham que ter rentabilidade. O orçamento do CCC era maioritariamente para a gestão do quotidiano: despesas correntes e salários do pessoal.
Os espetáculos tinham que, forçosamente, custar pouco e após negociar as condições com os produtores dos espetáculos. Pagas as despesas e os salários ficava com muito pouco dinheiro para programar. Esse foi um dos maiores impedimentos para a concretização de mais iniciativas.

Como comenta o facto das Caldas não ter ganho apoio financeiro da Rede de Teatros?
Esta foi a primeira edição do Concurso de Apoio à Programação da Rede de Teatros e Cineteatros Portugueses. Os projetos apresentados e que venceram os valores mais altos tinham que assegurar que têm metade do valor para desenvolver os projetos. Também precisam de ter parcerias com outros espaços culturais.
Para além do financiamento anual ao CCC – e algum extra para as realizações do Caldas Anima e do Festival de Jazz -, não tínhamos outros financiamentos, logo nunca nos poderíamos candidatar aos valores mais altos. Desenhámos o pedido para um financiamento mais baixo.
Não acompanhei o processo até ao fim, mas creio que estava tudo bem. Creio que é injusto não ter sido atribuído nenhum apoio pelo trabalho e pelos contactos que a equipa desenvolveu, pelos programas que criou e que ainda vi e assinei no início.
Depois já não tive tempo para acompanhar mas recordo-me que uma das condicionantes do financiamento é que para se ter acesso ao montante máximo era preciso o teatro ter autonomia financeira e um diretor há, pelo menos, 10 anos e com autonomia artística. O CCC não tem uma coisa, nem a outra.

O que considerava necessário aos grupos e aos artistas para atuarem no centro cultural?
Sempre defendi que quem viesse apresentar espetáculos ao CCC já tinha que ter feito um percurso por outros espaços culturais da cidade, ou seja, depois de provar que é bom. Não se chega ao Centro Cultural sem ser bom, caso contrário, cria-se uma falsa ilusão de que na realidade já é bom para ter lá ido.
É preciso não esquecer que nestes 14 anos tivémos duas crises graves. A primeira económica e financeira, dos tempos da governação de Sócrates e, depois, a pandemia.
Chegámos a ter um projeto de um cartão de crédito com uma entidade bancária local e que também não singrou.
Ao longo desta direção fizémos 1728 espetáculos de bilheteira que tiveram um total de 730 mil espetadores. Somam-se outros projetos transversais de formação que foram feitos com vários grupos da região.

Deixa o CCC bem colocado a nível nacional?
Sim, considero que, em termos nacionais, o CCC está bem colocado no que diz respeito à atividade pública e artística. Não se consegue dar respostas às muitas centenas de propostas de quem quer atuar no Centro Cultural das Caldas e não temos resposta a dar a todos, não é possível.
Também realizámos experiências inéditas no que diz respeito às artes circenses e que tiveram a participação de artistas topo mundial. E foi igualmente importante o que se fez com a comunidade local pois foram concretizados projetos de dança com as filarmónicas, de jazz com as bandas, além de animação de rua e de termos feito chegar o jazz às escolas, entre outros .

Quais são os maiores problemas no centro cultural?
Um deles é que tem um equipa muito reduzida de técnicos. Tem apenas o mínimo para funcionar. Logo nunca é fácil aceitar um congresso ou convenção de três dias pois é preciso dar folga ao pessoal…Os salários da equipa também deveriam ser mais altos.
No ano em fechámos por causa da pandemia, seria o melhor ano no que diz respeito aos alugueres dos espaços. Tínhamos pedidos de reserva para quase todo o ano.

Como foi o processo da sua saída da direção?
Foi-me dito numa reunião em novembro do ano passado, com elementos da associação e com o presidente da Câmara, que era preciso mudar o ciclo.
Sim, no último ano senti alguma tensão latente. Mas para mudar será que basta mudar o diretor geral? Guardo alguma tristeza pela forma como fui tratado.
E aguardo que seja editado o catálogo da coleção das centenas de obras do acervo do CCC. É um compromisso que ainda não foi cumprido. A coleção possui obras que podem ser apresentadas em qualquer galeria nacional. Espero que cumpram e que mandem fazer o catálogo, por exemplo, das aguarelas da cidade e do concelho, resultantes do Encontro Internacional de Aguarela das Caldas.

O que fica desta experiência? Que conselhos deixa ao seu sucessor (a)?
Fica uma grande experiência e garanto que o que fizémos ao longo destes anos foi muito bem feito. As Caldas saiu sempre salvaguardada.
Espero que quem venha faça coisas boas, claro. Espero que saiba do metier, que conheça os grupos, que não seja fanfarrão, pois um diretor não é uma estrela e deve estar sobretudo nos bastidores.

O que faz agora?
Estou a trabalhar com duas autarquias do Oeste na sua programação cultural. Trabalho na Valorsul e estou próximo da idade da reforma mas ainda colaboro com alguns projetos regulares que possam construir públicos. Mantenho-me disponível para a cidade, se esta me exigir que volte para integrar outros projetos. ■

Percurso

1983/1986

  • Integra Gabinete de Animação Termal Hospital Termal Rainha D. Leonor/com Município. Colaboração nas comemorações do V Centenário do Hospital e das Caldas da Rainha
  • Direção área turística/ relações públicas/ coordenação e programa animação termal do Grupo Vidago , Melgaço e Pedras Salgadas. Vidago

1986/89

  • Cria Festival “ Encontros Vicente” – Festival de Teatro, Música, dança
    Coordena as Edições Cadernos Vicente – sob direção de Osório Mateus
  • Diretor e programador do Gabinete de Animação do Hospital Termal

1991/92

  • Dirige Casa da Cultura
    Lança parceria com alunos ESTGAD e realiza com a Câmara, programas de animação de verão para as Bienais Internacionais de Arte.

1992/93

  • Produtor Independente, organização de exposições.
  • Docente na Escola de Formação de Animadores Teatrais

1995/97

  • Abre galeria “Terreiro das Gralhas”, nas Caldas, pela Produtora “Lazer dos Oficios – Projetos culturais, lda.

1997/2000

  • Coordenador dos museus municipais. Organiza cursos de verão internacionais
  • Coordenador do XI Encontro Nacional de Museologia e Autarquias

2002/07

  • Diretor Teatro Cine Torres Vedras

2004/12

  • Director artístico do “Festival Internacional Acordeões do Mundo” Torres Vedras

2000/22

  • Técnico de Comunicação e Sensibilização na Valorsul

2008/22

  •  Diretor Geral/ Programador do CCC, do Caldas Anima e do Caldas nice Jazz
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