A campanha decorreu durante este mês e foram encontradas novas pegadas e trilhos de terópodes e saurópodes. São centenas ou milhares de pegadas, que também vêm atestar o comportamento natatório dos dinossauros carnívoros
A campanha de prospeção que decorreu durante este mês de julho numa arriba a Sul da duna de Salir do Porto, com vista para o Oceano Atlântico, onde se encontra uma laje com uma jazida que tem uma grande quantidade de pegadas de dinossauros saurópodes e terópodes, permitiu aos investigadores encontrarem novas pegadas e traçarem trilhos feitos pelos gigantes há milhões de anos atrás.
A investigação envolveu cerca de uma dezena de pessoas em simultâneo. No local foi possível vê-los a trabalhar, com enxadas primeiro, vassouras cada vez mais finas e depois colherins, limpando a laje de vegetação e sedimentos, num trabalho moroso, mas cujos progressos são visíveis.
Esta campanha incidiu sobre 18 mil dos cerca de 23 mil metros quadrados da laje e ocorreu de forma faseada. Além da identificação e estudo das pegadas, procuraram outros vestígios e também foram recolhidos elementos que permitam perceber como era o ambiente naquele local na época dos dinossauros.
Uma coisa é certa para os investigadores e é uma particularidade desta jazida de pegadas: é que nesta zona existiria água, pouco profunda que faria os dinossauros, numas zonas, nadar, e noutras flutuar. Tal explica que, em vários casos destas pegadas, não apareça a parte posterior do pé, do calcanhar. “Estas pegadas testemunham o comportamento natatório dos dinossauros carnívoros, chamados terópodes”, explicou a responsável pelo projeto, Inês Marques, que é geóloga do Geoparque Oeste e que defendeu a sua tese de mestrado sobre oito jazidas de pegadas da região, entre as quais esta laje de calcário.
Enquanto falamos junto a um trilho de herbívoros de pescoço e cauda comprida que é o mais visível nesta laje, com impressões das mãos e dos pés do dinossauro e que, conforme afirma a geóloga, “vai ser um dos principais pontos de visitação”, Inês Marques conta-nos que estão “a encontrar muito mais pegadas” e uma “concentração muito elevada”, referindo que são já “centenas, se não forem milhares”. Mantêm-se os tipos saurópode e terópode já identificados no primeiro estudo que fez, para o mestrado.
Depois foi momento de procurar trilhos porque “um trilho permite obter muito mais informações do que uma pegada”. A elevada concentração de fósseis de bivalves também será “importante para reforçar a interpretação paleo-ambiental”, com uma pessoa apenas dedicada a esse trabalho de recolha e estudo.
Nesta campanha, que une o Geoparque Oeste, o Museu da Lourinhã e a Sociedade de História Natural de Torres Vedras num protocolo assinado com o município das Caldas (que financiou a bolsa de voluntariado, num valor total de cerca de 2000 euros), também já identificaram fragmentos de ossos de dinossauros, o que “é sempre entusiasmante”. Serão estudados para extrair o máximo de informação possível e procurar perceber a que dinossauro pertenceriam.
Os voluntários “são na sua maioria pessoas que vivem nas Caldas e arredores e são jovens, mas também temos alguns em idade adulta que querem experimentar”. A maior parte deles não tinha qualquer tipo de experiência nesta área, sendo o primeiro contacto com a paleontologia.
O calor foi uma das principais dificuldades, assim como o vento e as mudanças de temperatura. Em termos de segurança, o local é relativamente seguro para trabalhar.
No final destes trabalhos de limpeza fazem-se as medições e registo fotográfico do material paleontológico, sejam ossos, pegadas ou outro tipo de descobertas, bem como a respetiva catalogação. Depois é feito um voo com drone a baixa altitude para perceber melhor o impacto da campanha e o que ela colocará a descoberto, sendo um importante auxílio, por exemplo, na definição dos trilhos. Dos planos faz ainda parte a criação de um modelo 3D da laje.
No futuro pretendem criar condições de conservação, acessibilidade, divulgação e visitação, mas primeiro há que limpar e estudar.
Uma nota interessante é que ao longo dos trabalhos, nos primeiros dez dias, passaram pelo local mais de 130 pessoas, curiosas com as pegadas, o que “significa que, não sendo um sítio preparado para ter visitantes, já tem uma procura bastante interessante”, aponta.
André Saleiro, do Museu da Lourinhã, disse que já descobriram mais do que esperavam. “À medida que íamos limpando mais pegadas e rastos de arranhões dos dinossauros começaram a aparecer”, referiu. “Estamos a encontrar bem mais do que estávamos à espera”, assumiu, destacando o potencial da região em termos paleontológicos e desta localização em particular.
Bruno Camilo, da Sociedade de História Natural de Torres Vedras, considera que este é um projeto que não é para um ano. Além da limpeza da laje, paralelamente, estão a fazer “a avaliação do ambiente, a ecologia do espaço há 150 milhões de anos”. Para tal estão a estudar os bivalves, que permitirá perceber quais as zonas mais profundas e “que contribuição existiria de água doce para o sistema, dado que parece que era água salobra, estuarina”.
Em termos de potencial das Caldas nesta área, considera que além das pegadas, há jazidas com ossos que precisam de estudo e, depois, de apresentações temporárias para que as pessoas conheçam o património paleontológico existente. “Toda a região Oeste é extremamente rica nestes vestígios, não se circunscreve a Torres Vedras e Lourinhã, é muito mais, é só uma questão da atividade científica estar a pender mais para aquele lado”, faz notar, destacando que nesta laje “existe uma profusão de vestígios bastante interessante e densa, não há assim tantos sítios com uma densidade tão grande de pegadas de dinossauros” e que “este sítio está literalmente todo pisado por dinossauros, em várias direções, uns de maior outros de menor porte”.



































