Brasília – A capital mais moderna e bonita do mundo

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Untitled-1A primeira vez que estive em Brasília foi a seguir à memorável campanha para a democratização do país (movimento Directas Já), que levou à queda da ditadura militar e à vitória do Presidente Tancredo Neves. Infelizmente o Presidente sucumbe a uma infecção hospitalar na véspera da tomada de posse, na sequência de uma intervenção cirúrgica de urgência. Meio em euforia meio em grande tristeza, levantava-se o Brasil nesses tempos do pesadelo da ditadura. Recordo chegar a Brasília e amigos locais prepararem a visita à grande e inovadora capital, dizendo que iríamos passar pelos principais pontos da cidade, incluindo o Palácio dos Congresso. Esta era uma obra prima da arquitectura mundial desenhada por Óscar Niemeyer, onde funcionava o Senado e a Câmara dos Deputados. Diziam-nos que dificilmente poderíamos visitar pois nada estava preparado para isso. Eis senão quando o pequeno grupo de portugueses chega à entrada do Palácio e refere a sua nacionalidade. Imediatamente os responsáveis pela segurança dizem: “Entrem, sigam por esta ala e vão dar ao Senado. Se não houver sessão podem entrar. Na Câmara dos Deputados deve haver sessão por isso só podem ir às bancadas do público. À esquerda e direita vão encontrar gabinetes dos deputados e senadores. No final a grande Biblioteca do Congresso.” E lá fomos nós sem qualquer identificação prévia, nem qualquer acompanhamento de segurança, percorrendo o interior do poder legislativo, numa experiência difícil hoje de compreender e mesmo de aceitar. Como Brasil e o mundo, 30 anos depois, são hoje tão diferentes.
BRASÍLIA UMA CIDADE DE IDEAIS E DE ARTISTAS
Mais recentemente voltámos a Brasília por duas vezes e em cada uma delas foi sempre uma lição de civilização e de cultura. A capital brasileira é aquela cidade idealizada e concretizada por alguns espíritos superiores nas áreas do planeamento urbano e da arquitectura, na sequência da concretização de um desígnio definido na constituição republicana desde o séc. XIX, pelo Presidente Joselino Kubitchek de Oliveira. Os dois principais nomes ligados a Brasília foram Lucio Costa e Óscar Niemeyer. O primeiro como autor inicial do projecto urbanístico, ganho em concurso público, a que se juntou depois o segundo, que também assinou algumas das propostas arquitectónicas mais revolucionárias. A cidade nasceu do nada, numa zona do planalto central, árida e muito seca, onde foi necessário criar inúmeros lagos para tornar a região habitável. A vantagem invocada na localização era criar um ponto central no imenso território nacional e substituir a descentrada cidade do Rio de Janeiro, já na altura altamente congestionada. O projecto foi lançado em 1956 e inaugurado em 1960, o que demonstrou a capacidade do país para fazer parte substancial de uma grande e inovadora cidade em quatro anos, tanto tempo ou menos que a preparação desta Copa do Mundo. Ainda por cima para criar um território monumental que é já hoje património da Humanidade da UNESCO. O melhor conselho para visitar a cidade é ter alguém que conheça e guie pelas suas longas avenidas, ou então, no caso de não se dispor desta possibilidade, alugar um táxi e negociar o preço para fazer essa visita durante algumas horas. Não vale a pena tentar conhecer Brasília a pé. As distância são imensas e ainda não há transportes públicos suficientes que ajudem essa visita.
UMA CIDADE EM FORMATO DE BORBOLETA
Presentemente Brasília tem mais de 2,5 milhões de habitantes vivendo na capital federal. Com as cidades satélites, que se foram erigindo nos seus arrabaldes, totalizam quase quatro milhões de habitantes, tendo-se transformado na quarta cidade brasileira mais populosa. A cidade foi criada segundo a forma de uma cruz, como pode ser comparado com a forma de um avião, ou também de uma borboleta como o autor, o urbanista Lucio Costa, defendeu em tese, rejeitando as interpretações anteriores. O projecto parte de um eixo rodoviário central no sentido norte-sul, e de um eixo monumental no sentido leste-oeste. Dos eixos rodoviários definem- -se duas asas simétricas, como num avião, denominadas norte e sul, que são formadas por quarteirões residenciais, com equipamentos de apoio comerciais, culturais, educativos, de lazer e de diversão. O objectivo seria tornar auto-suficientes cada uma das partes da cidade, evitando grandes deslocações para as tarefas do quotidiano. No eixo monumental, conhecido pelo “corpo do avião”, situavam- se as grandes infraestruturas do poder político federal (o Brasil é uma república federativa formada por estados autónomos em bastantes áreas), como a Esplanada dos Ministérios e pela praça dos três poderes (legislativo, executivo e judicial). Para uma viajante estrangeiro, mais do que aquilo que é representado por cada edifício, o que interessa é a monumentalidade da arquitectura desses mesmo edifícios desenhados por Niemeyer.
A ARQUITECTURA QUE INTERPRETA OS PODERES
Dada a quantidade e variedade, para o leitor vamos enumerá- los com descrições simples. Na internet poderão encontrar uma imensidão de informação com documentação fotográfica consistente. Praça do três poderes: Palácio do Planalto onde funciona a Presidência da República abrigando o gabinete presidencial, a casa civil, a secretaria geral e o gabinete se segurança. Arquitectonicamente é um edifício de linhas simples, onde dominam os traços horizontais, parecendo as colunas “leves como penas pousando no chão” no dizer de Niemeyer. A entrada é feita por uma vistosa rampa que domina a frontaria. Supremo Tribunal Judiciário – alberga a Suprema Corte (uma espécie do Supremo Tribunal de Justiça português) e o Tribunal Constitucional, todos de âmbito federal. Respeita arquitectonicamente a linha do Palácio do Planalto, dispondo igualmente de um museu reproduzindo o plenário da antiga sede no Rio de Janeiro. Congresso Nacional, o edifício mais conhecido e emblemático de toda a praça, reúne um conjunto de construções com duas cúpulas inversas representando respectivamente uma (a cúpula maior e côncava) o plenário da Câmara dos Deputados e a outra (cúpula menor e convexa) do Senado Federal. Existe um espelho de água numa das alas e tem ainda dois edifícios verticais com 28 pisos onde funcionam os serviços dos dois órgãos. Ainda junto à Praça dos três poderes, se podem visitar outros pontos históricos e pitorescos como o Museu Histórico de Brasília, as Esculturas, Os Guerreiros, de Bruno Giorgi, considerados o símbolo da capital, o Mastro da Bandeira onde está hasteada uma bandeira nacional com a dimensão maior do mundo (288 m2), o Panteão da Pátria e os espaço Lucio Costa e Oscar Niemeyer.
ESPLANADA DOS MINISTÉRIOS NO EIXO MONUMENTAL
Aqui encontram-se vários edifícios também de grande significado e qualidade arquitectónica, dos quais destacamos: Palácio Itamaraty – onde funciona o ministério dos Negócios Estrangeiros, também conhecido pelo Palácio dos Arcos, devido à forma da sua fachada. Em frente do edifício existe um imenso espelho de água onde desponta uma escultura Meteoro concebida por Bruno Giorgi. Palácio da Justiça – também desenhado por Niemeyer tem uma bela arquitectura na linha das restantes criações do arquitecto mais querido dos brasileiros. Catedral Metropolitana de Nossa Senhora da Aparecida – mais uma obra prima de Niemeyer com uma área circular de 70 metros de diâmetro, meia enterrada no solo, sob 16 colunas de cimento armado formando uma hipérbole, cobertos a vidros transparentes. O acesso do templo é ladeado por quatro esculturas gigantes de bronze significando os apóstolos, realizadas com o apoio do escultor Dante Croce. O interior da catedral também é de uma beleza excepcional, estando encimada por uma escultura de três anjos suspensos por um cabo de aço, de autoria de Alfredo Ceschiatti. Mas a quem visita a catedral não cessa de se espantar com a descoberto de inúmeras intervenções artísticas das mais variadas proveniências no seu interior.
A CIDADE ONDE OS PORMENORES CONTAM
Uma visita a Brasília não dispensa uma ida à Igrejinha da 307/308 Sul ou Igreja Nossa Senhora de Fátima, construída no início das obras de Brasília em cem dias, desenhada também por Oscar Niemeyer (que era militante comunista) para pagar uma promessa da mulher do Presidente Kubitchek, fazendo a sua arquitectura referência a um chapéu de freiras. A fachada e o interior são cobertos com azulejos de Athos Bulcão. Outra Igreja a visitar em Brasília, pela sua qualidade arquitectónica, é o Santuário de Dom Bosco construído em homenagem ao padroeiro da cidade. O edifício tem 80 colunas de 16 metros e é decorado por vitrais em 12 tonalidades de azul. No interior, um lustre de 3,5 metros de altura, formado por 7.400 peças de vidro murano, simboliza Jesus, a luz do mundo. A beleza do mármore rosa é realçada pela presença do quadro em bronze de Gianfrancesco Cerri, que mostrou com poesia o momento do batismo de Jesus. Uma parte do eixo monumental é ocupada com o conjunto dos edifícios da área da defesa, onde pontuam também exemplares arquitectónicos de Nemeyer como a Catedral Militar da Rainha da Paz, bem como vários edifícios ligados às áreas militares todos com arquitectura significativa. Visitar Brasília é, pois, receber uma lição de arquitectura e de cultura mundial. Nos arredores situam-se as residências do Presidente da República, o chamado Palácio da Alvorada junto à península do lago Paranoá, e do Vice- -Presidente, o Palácio de Jaburu, ambos desenhados por Nemeyer, que são outros exemplares arquitectónicos de grande qualidade. No bairro das embaixadas, onde estão mais de uma centena de representações estrangeiras, pode-se ver o esmero que cada país colocou na construção da sua para mostrar também a qualidade da arquitectura nacional. Por exemplo, a embaixada portuguesa, concebida pelo arquitecto Raul Chorão Ramalho, construída entre 1973 e 1978, é um belo edifício, despojado, em betão de linhas direitas, com dois pisos, decorado no exterior com um lago com esculturas de Querubim Lapa, Espiga Pinto, José Aurélio e Lagoa Henriques. No interior podem encontrar-se obras de João Abel Manta, Sá Nogueira e Guilherme Camarinha. Mas é recomendado fazer um giro por este bairro, uma vez que se podem verificar muitas das idiossincrasias ou aspectos peculiares de cada país.
JLAS

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