
Três operacionais dos Bombeiros do Bombarral recordam à Gazeta, 25 anos depois, o impacto que o acidente teve nas suas vidas e, ainda, na corporação. A tragédia faz parte das suas vidas mas nem isso os demoveu de serem bombeiros
Um quarto de século depois, o acidente na A8 causou muita consternação entre os Bombeiros Voluntários do Bombarral e que persistiu durante muito tempo. O comandante Pedro Lourenço, que à época já liderava a corporação há um ano e que comandou as operações de socorro no local, assume que a ocorrência deixou marcas emocionais, sobretudo no corpo ativo da associação humanitária. “Tinha na altura já vinte anos de bombeiro e nunca tinha sentido o que era chegar a um acidente e ver companheiros nossos vítimas desse mesmo acidente. Foi algo que me marcou muito e que ainda hoje me lembro bem de como aquilo aconteceu. E, na altura, ponderei não continuar como comandante dos bombeiros, porque foi um peso muito grande porque levou-nos muito abaixo”, recorda à Gazeta. O impacto psicológico no corpo ativo foi de tal forma que, desde então, Pedro Lourenço alerta sistematicamente os seus bombeiros, quando saem para uma ocorrência: “há que fazer sobretudo uma condução defensiva porque se vamos resolver um problema, não podemos ir criar outro, porque ficaremos muito limitados para poder dar uma resposta”. Desde então houve uma maior formação dos operacionais, do ponto de vista emocional, porque o acidente “despertou-nos a nossa mente para defendermo-nos” no teatro de operações.
Entre os três bombeiros feridos, o então subchefe João Carlos Pedro foi o que ficou em pior estado de saúde. O empresário da restauração, então com 32 anos, sofreu a amputação da perna esquerda e foi ainda operado á perna direita que ficou bastante afetada, para além de ter sofrido um traumatismo craniano e ferimentos no rosto. Membro do Quadro de Honra, anos mais tarde regressou à corporação, agora como profissional, enquanto operador da central de comunicações. “O meu conceito de vida mudou completamente a partir daquele dia do acidente… há uma nova forma de celebrar a vida”, contou à Gazeta. O bombeiro recorda que os tempos que se seguiram ao acidente foram marcados por muitas cirurgias, longos períodos de internamento e um processo doloroso de recuperação. “Teve um impacto profundo. Não soube lidar muito bem com a minha ausência dos bombeiros, porque fiquei magoado e triste comigo… levou quase dez anos a ‘digerir’ a dificuldade de não poder responder ao toque da sirene”. Com a mulher grávida do seu filho na altura do acidente, foi duro o período que teve pela frente. Foi fundamental durante todo este processo o apoio sobretudo da família e dos amigos mais próximos para poder encarar uma nova forma de viver a vida e atenuar o sentimento inicial de revolta causado pelas sequelas do acidente. Mas nunca teve dúvidas ou arrependimentos da opção que tomou na ocasião.
“Se me perguntassem, no dia a seguir, se fazia tudo igual, eu dizia que sim. Hoje, 25 anos depois, se encontrasse uma situação idêntica e, se pudesse, faria igual!”.
Marco Martinho tinha 22 anos e era bombeiro de 3ª classe quando sofreu os ferimentos causados por ajudar os acidentados naquele fatídico dia 7 de novembro de 2000. O jovem partiu ambas as pernas, fraturou um braço e teve uma luxação na omoplata, tendo também enfrentado um longo caminho de recuperação até regressar ao corpo ativo da associação. Depois de assistido no hospital caldense, foi transferido para o Hospital da CUF, em Lisboa. “Namorava há pouco tempo e o apoio familiar foi também para mim muito importante”, destaca. Na memória, “há coisas boas e outras más”. “Lembro-me de ir na ambulância com o João, ele numa maca e eu noutra… e antes estar deitado no alcatrão e ver o [colega] Délio e achar que estava morto”. Agora, 25 anos depois, “voltava a repetir o que fiz. Parava e ajudava. Mas fico também a pensar o que poderá ser para a minha família, se ‘fico’ aqui… como é?!”.
Outro bombeiro ferido foi Délio Ribeiro, bombeiro de 2º classe de 25 anos de idade e que hoje desempenha as funções de adjunto do comandado dos Bombeiros Voluntários de Óbidos. Ficou internado no Serviço de Cirurgia do Hospital das Caldas durante alguns dias, consequência do traumatismo craniano e da cirurgia ao pescoço para diminuir um hematoma junto à coluna.
Para além de todos os problemas físicos e psicológicos decorrentes do acidente, para os intervenientes diretos neste drama houve ainda que lidar com a parte judicial, tendo os processos andado nos tribunais mais de uma década, com o consequente desgaste emocional que acarretou para todos os envolvidos com os processos jurídicos e pagamento dos seguros e despesas médicas.
Todos têm em comum terem estado envolvidos no socorro ao acidente mais grave ocorrido na A8, na zona do Oeste, em que as profundas sequelas físicas e emocionais não os demoveram em continuar a ajudar o próximo enquanto bombeiros profissionais ao serviço da comunidade.






























