Bombeiros das Caldas e de Óbidos participaram no combate aos grandes incêndios que assolaram o país

0
907
A corporação caldense integrou o Grupo de Reforço de Incêndios Rurais (GRIR) do Oeste

O verão de 2025 foi um dos piores em termos de incêndios florestais em Portugal, com mais de 248 mil hectares de área ardida até final de agosto, o que colocou o país como o que registou maior percentagem de território ardido na União Europeia. A região conseguiu escapar a esta dimensão de números, mas nem por isso os bombeiros das Caldas da Rainha e de Óbidos tiveram um verão descansado, uma vez que integraram as equipas que estiveram no ataque a alguns dos fogos de maiores dimensões que assolaram o país

Entre julho e agosto, os meses de maior atividade, os Bombeiros das Caldas participaram em 71 ocorrências, com 706 bombeiros e 176 viaturas mobilizados durante mais de 680 horas e perto de 12 mil quilómetros percorridos.

“Andámos sempre por fora, e foi difícil”, afirmou o comandante dos Bombeiros Voluntários das Caldas da Rainha, Nelson Cruz, explicando que a corporação caldense integrou o Grupo de Reforço de Incêndios Rurais (GRIR) do Oeste.

- publicidade -

A operação começou em Alcanede, a 29 de julho, seguindo-se uma permanência de três dias em Abrantes, na base de apoio logístico do Mabal, em missão preventiva. A partir de 4 de agosto, com o início do incêndio de Vila Real, as equipas das Caldas entraram numa mobilização contínua que as levaria sucessivamente a Vila Pouca de Aguiar, Moimenta da Beira, Tabuaço, e finalmente ao complexo de incêndios que incluía o Candal, na Lousã, e Arganil.

“Tivemos um envolvimento de 210 bombeiros, naturalmente estes 210 são os nossos 120 bombeiros que foram, em alguns casos, mais do que uma vez”, explicou o comandante, com as viaturas da corporação a realizarem um total de 48 serviços. Diariamente, equipas de cinco bombeiros e um motorista faziam o transporte entre as Caldas e os teatros de operações no interior do país.

O comandante descreve a severidade dos fogos encontrados, agravados por condições meteorológicas adversas. “Apanhámos incêndios de uma severidade extrema, que ardiam com uma velocidade estonteante, de facto de difícil combate”, descreve.

Nelson Cruz realça que houve “mesmo momentos em que não era possível combater [as chamas], o incêndio passava por copas e, portanto, não havia como o conseguirmos fazer”. Esta realidade obrigou frequentemente a adotar medidas defensivas. “Tivemos alguns momentos em que a estratégia foi ter que defender as habitações próximas”, destacou.
Apesar de terem vivido algumas situações com alguma tensão, o comandante da corporação caldense sublinha que nunca esteve em causa a segurança de homens e equipamentos. “Tivemos duas ou três vezes equipas, como os chefes de equipa que me relataram, que estiveram em aldeias cercadas pelo fogo, das quais não era possível sair”, disse. No entanto, “felizmente, correu tudo bem, não tivemos acidentes e fizemos um bom trabalho”, realçou, lamentando as vítimas e danos registados noutras corporações.

Na corporação de Óbidos, foram 286 os bombeiros envolvidos em 51 ocorrências, apoiados por 62 viaturas, contabilizando mais de 820 horas de empenhamento e percorridos 8441 quilómetros, sobretudo durante o mês de agosto. Houve alturas em que o comandante da corporação estava num incêndio, o adjunto do comando noutro e havia ainda um veículo de combate dos bombeiros de Óbidos a participar noutra ocorrência. Número registado sobretudo fora do concelho, que registou nesse período apenas um hectare de área ardida. Tal como aconteceu com os bombeiros das Caldas da Rainha, os operacionais obidenses foram chamados a reforçar o dispositivo em várias frentes no país, muitas vezes integrados nos mesmos grupos do Oeste. Nos meses de julho e agosto, estiveram envolvidos em 51 ocorrências, a sua maioria na região (em incêndios no Cadaval, Caldas da Rainha, Bombarral, Alcobaça ou Lourinhã) mas também nos grandes fogos, que deflagraram, sobretudo, no interior do país, como os de Trancoso e Arganil, com uma área ardida que ultrapassa os 216 mil hectares.

“Foram muitos dias e teve que haver um trabalho de equipa e de gestão de meios, através do Comando Sub-regional do Oeste, para que conseguíssemos, por exemplo, substituir o veículo afeto a Óbidos, pelo das Caldas da Rainha”, exemplificou o comandante, dando conta do grupo de 32 operacionais, 2 veículos de comando, 4 veículos de combate a incêndios, 2 veículos de tanque e uma ambulância de socorro, do Oeste. Nas duas semanas mais críticas chegaram a estar no terreno dois grupos do Oeste, mais uma equipa de posto de comando, que está encarregue do planeamento e coordenação das operações. O último incêndio onde Bruno Duarte esteve, a integrar a equipa de posto de comando, foi o de Piódão, no concelho de Arganil, e que depois se alastrou a outros concelhos. “Estávamos na frente 5, que era a frente mais ativa, que envolveu os municípios de Castelo Branco, Covilhã e Fundão e trabalhámos por espelho”, conta o comandante.

O adjunto do comando Délio Ribeiro participou também no combate às chamas e reconhece que “podiam ter acontecido muito mais acidentes durante aquele período”. Os bombeiros já se encontravam exaustos e a população envolveu-se demasiado, por vezes correndo riscos. Houve aldeias a que não chegaram os bombeiros porque, “à velocidade em que o fogo se propagava era impossível pôr meios em todos os sítios, e tínhamos de nos focar na defesa das pessoas e bens”.

A instalações das turbinas eólicas nos locais mais elevados revelou-se uma grande ajuda para os bombeiros, que usaram os acessos criados. No entanto, há locais onde não é possível ir por terra ou que, pelas suas características (dimensão, intensidade de calor, poder de destruição), é preciso “dizer claramente que não temos capacidade de extinção e a prioridade é proteger a aldeia e a população”, concretiza o comandante.

Por outro lado, realça que, nem todas as equipas têm por missão apagar o fogo, mas que existe uma divisão de funções entre quem planeia, quem se encarrega da logística, vai confirmar os locais por onde podem circular ou se é necessário retirar as pessoas dos locais. Um trabalho que é garantido pelos bombeiros, mas também pelas várias forças de segurança e militares que estão no terreno.

A importância da prevenção
Crítico da criação em relação à criação dos Comandos Sub-regionais, Nelson Cruz considera que a atual organização do sistema de socorro atrofia o sistema, defendendo o regresso aos antigos comandos distritais. “Passámos de 18 comandos distritais para 24 sub-regionais. Quanto mais está dividida esta a estrutura, mais dificuldade nós temos nas triangulações, no envio de meios, a celeridade das coisas”, defendeu. Na opinião do comandante da corporação caldense, “se houvessem só cinco comandos regionais, chegava perfeitamente, porque o problema é que temos comandantes a mais e burocracias a mais para a celeridade que é necessária no momento dos grandes incêndios”.

Mas as críticas mais duras que faz são à área da prevenção. “Eu questiono, onde é que está a Agência de Gestão de Incêndios Florestais. São milhões de euros que o país está a gastar na prevenção, com poucos resultados”, refere, deixando no ar uma questão: “é normal Pedrógão ter ardido com a violência que ardeu outra vez?”

Apesar de a situação dos incêndios ter acalmado, Nelson Cruz teme que ainda se possam verificar mais situações difíceis este ano. “O setembro e o outubro ainda costumam ser difíceis”, recorda. Para o comandante dos bombeiros caldenses, as alterações climáticas são uma realidade incontornável “e cada vez vai ser mais difícil combater incêndios. Cada vez vão ser mais violentos e mais graves”.

A solução, defende, passa por uma mudança estrutural. “O caminho tem que ser feito na prevenção, na limpeza e na organização. A floresta tem que passar a mosaicos. Tem que haver outro tipo de vegetação. Há um grande trabalho pela frente, que demora muitos anos a resolver”, aponta.

De acordo com o comandante dos Bombeiros de Óbidos, Bruno Duarte, a fase mais crítica do dispositivo de combate a incêndios rurais – a fase Delta – decorre até ao final do mês. Durante este período existem mais meios de prevenção e, caso se registe uma ocorrência, são acionados três veículos de combate a incêndios rurais das proximidades. Paralelamente, é reforçado sempre com a saída de um meio aéreo, que nesta região e desde há dois anos, está sediado no Centro de Meios Aéreos, na Lourinhã. “Intervenha ou não, sempre que há registo de uma ocorrência de incêndio rural, o meio aéreo sai ao mesmo tempo que os bombeiros com os meios terrestes”, explica o comandante da corporação de Óbidos.

No raio de cobertura desta região estão também uma parelha de Fire Boss (aviões anfíbios), estacionados na pista de Santarém e que, em caso de incêndio, “por defeito saem carregados com uma calda retardante”, para ajudar no seu combate. O comandante obidense destaca que grande parte das ocorrências são “ganhas” nos primeiros 90 minutos, pelo que é preciso uma intervenção musculada.

De acordo com o responsável tem-se apostado muito na prevenção, com as entidades a alertar para o risco do fogo. Há municípios que não permitem queimadas durante o verão, mas na zona de Óbidos há exceções, como a possibilidade de as fazer nos pomares afetados com o fogo bacteriano.

Bruno Duarte alerta que, historicamente, o período de incêndios no Oeste regista-se, sobretudo, em setembro e outubro. Defende que, para além de uma resposta musculada no seu combate, é importante a sua prevenção, garantindo a faixa de manutenção de combustível, mas também apostando na agricultura, com a plantação de vinha, milho, ou outra espécie resistente ao fogo. Também o seu adjunto de comando, Délio Ribeiro, destaca a importância na prevenção, muito garantida pela agricultura e pastoreio e controlando a vegetação, alertando que “existem muitos Pedrógãos…”

Os bombeiros de Óbidos reforçaram o dispositivo em vários incêndios no país
- publicidade -