O caldense Pedro Couto Pereira fez um mestrado sobre a Linha do Oeste no qual constata o mau serviço prestado pela CP nesta região e o definhar do número de passageiros devido aos maus horários e aos transbordos desnecessários nas Caldas da Rainha. O jovem engenheiro – que viu recusadas informações por parte da CP para o seu trabalho académico – defende na sua tese que a linha do Oeste deverá estar integrada na Grande Lisboa, com serviços directos e mais frequentes.
Pedro Pereira decidiu o tema da sua tese quando começaram a surgir notícias sobre o encerramento do serviço de passageiros da Linha do Oeste, entre as Caldas da Rainha e Figueira da Foz e Coimbra. Já tinha anteriormente feito trabalhos sobre mobilidade durante o mestrado e a possibilidade de estudar o eixo ferroviário que serve a sua terra natal agradou-lhe tendo sido de imediato aprovado pelo seu orientador.
“Acompanhei o que se ia passando através da Gazeta das Caldas, do Público e em vários blogues e grupos que foram criados no Facebook em defesa da manutenção do serviço”, disse o jovem.
Em seguida quis fazer todo o trajecto da Linha do Oeste entre Lisboa e Coimbra para fazer inquéritos aos passageiros. Pediu um passe à CP, mas foi logo recusado com a justificação de “que toda a gente fazia estudos e que não podiam dar passes a todos”. Ou seja, um estudo académico, sob a chancela da Universidade Nova, não pôde contar com o apoio da empresa pública cujos défices são pagos pelos contribuintes. Também não foram cedidos ao estudante dados sobre a Linha do Oeste que Pedro Pereira considerava importantes como, por exemplo, a matriz origem-destino, ferramenta fundamental para se poder abordar com rigor científico a tráfego da linha.
“A CP é uma empresa pública, logo este tipo de dados deveria estar na internet”, disse o autor da tese, a quem, após insistência por parte do aluno e professores, foi dito que “era politica da empresa não fornecer dados por questões de competitividade”. E se a segunda recusa já não espantou Pedro Pereira, os seus orientadores ficaram estupefactos com tal atitude por parte da CP. É que, na linha do Oeste não circula mais nenhum operador para além da CP, pelo que não se entende os eventuais problemas de concorrência que a empresa possa ter. Ou tratar-se-á de esconder as provas da manifesta má gestão que é feita na linha do Oeste?
Mas Pedro Pereira não baixou os braços. Apesar de não ter hipótese de fazer todos os inquéritos que gostaria, por falta de financiamento, realizou várias viagens, entre Julho e Agosto, entre Lisboa e Caldas da Rainha nas quais inquiriu 72 pessoas.
“Fiz uma pequena amostra”, contou o caldense, que se deparou com uma enorme abertura por parte dos passageiros pois estes queriam falar sobre o que está mal e o que poderia melhorar no serviço da Linha do Oeste.
“As pessoas estavam muitos disponíveis pois sentem-se muito prejudicadas com as medidas que vão sendo implementadas”, disse Pedro Pereira. O jovem identificou que uma das principais queixas se prendia com os horários. “Os que se praticam não satisfazem as necessidades dos passageiros”, disse o jovem, explicando que se não se mantêm os horários de forma coerente ao longo do tempo, logo não é possível criar hábitos de consumo.
O segundo problema encontrado foram “as greves dos maquinistas que se prolongam durante vários meses e que desesperam os utentes pois a CP não oferece alternativa. É quase caricato pois as pessoas ficam apeadas”, disse o autor.
Entre as conclusões deste estudo está a evidência – já sobejamente conhecida na região – de que o serviço da CP no Oeste “não satisfaz os seus clientes”. Aponta como causas a má gestão da CP na questão dos horários e também considera incompreensível que haja sempre um transbordo na estação das Caldas da Rainha. Por exemplo, entre Torres Vedras e Leiria ou tão só entre o Bombarral e S. Martinho é preciso mudar sempre de comboio nas Caldas. Uma situação que desencoraja o uso do transporte ferroviário e para a qual a CP nunca deu uma explicação convincente.
Segundo o autor do estudo, o número de passageiros tem vindo a diminuir. “Os utilizadores lamentam, mas preferem não arriscar usar um transporte onde se arriscam a não chegar a casa. Já lhes aconteceu várias vezes estar numa estação à espera por um transporte que não vem”, exemplificou o autor do estudo. Pior que tudo, para o caldense é que ao contrário de qualquer empresa que se preocupa com os seus clientes, em relação à Linha do Oeste, a CP “parece que simplesmente não quer saber”.
“Parece que só existe um caminho para o Oeste que é a A8”
Pedro Pereira constatou que a Linha do Oeste “não se promove” e que não há qualquer publicidade nos postos de turismo. “O zero de divulgação à ferrovia faz com que pareça que só há um caminho para o Oeste: a A8”.
Para o estudante, a promoção da Linha do Oeste é necessária e sugere até que se estabeleça uma parceria com a ESAD para a produção de campanhas e de materiais gráficos para dar a conhecer esta forma de viajar.
Segundo o autor do estudo, o serviço entre as Caldas e Coimbra (ou Figueira da Foz), “é mais competitivo do que o rodoviário e a CP não aposta nele e nem muda o horário para tentar cativar mais utilizadores”.
Entre as Caldas e Lisboa já não acontece o mesmo. O percurso pela ferrovia é mais sinuoso do que o rodoviário e por isso o primeiro decorre no dobro do tempo. Comparativamente, “enquanto houver gente que ganha muito dinheiro com a construção das auto-estradas, vão continuar-se a gastar balúrdios com isso pois dá jeito a quem as constrói”, disse Pedro Pereira. Pelo contrário, as linhas ferroviárias “já existem e as melhorias não enriquecem ninguém, logo não interessam”.
E até há viagens interessantes. Pedro Pereira referiu que chegou a “apanhar” nas viagens para Lisboa famílias inteiras que se deslocavam à capital e faziam “um dois em um”: viajar na Linha do Oeste e visitar o Jardim Zoológico. “É uma pena que a CP e a Câmara de Óbidos não façam uma colaboração regular para os grandes eventos como já aconteceu uma vez com a Vila Natal em 2009”, disse.
O caldense considera que não faz sentido encerrar o serviço de passageiros da Linha do Oeste pois se existem recursos, numa altura de crise como actualmente se vive em Portugal, “deveríamos aproveitá-los e rentabilizar o que existe”.
Na sua opinião, a linha serve muitos utilizadores que se deslocam entre Lisboa e Coimbra e o seu encerramento iria prejudicar também centenas de veraneantes que usam o comboio para ir à praia em S. Martinho. “No Verão, o comboio estava cheio”, disse.
Apesar de tudo também há queixas para quem leva pranchas de surf ou bicicletas pois não há lugar próprio nas carruagens para as transportar. No estudo, o caldense aponta ainda outras necessidades de inovação no serviço de bordo, sendo uma das sugestões a instalação de internet via wireless como já faz a Rede Expresso e a Carris.
Pedro Pereira chama a atenção para a necessidade de melhorias básicas nalgumas estações. “Parei em Entrecampos [Lisboa] onde a automotora pára fora da estação que é coberta e os passageiros têm que andar em passadeiras rolantes paradas e cheias de ervas para conseguir entrar na estação”, contou.
Se o trajecto fosse de Entrecampos para as Caldas “eu nunca iria dar com aquela zona onde se pára. Dá a sensação que está tudo feito para que no fundo as coisas não funcionem bem”, contou o jovem, acrescentando que nesse dia “o comboio foi cheio”.
O caldense propõe ainda que a Linha do Oeste seja integrada na Grande Lisboa e defende que no futuro se faça uma linha de Malveira a Loures “que poderia ser uma maneira rápida e eficiente de entrar em Lisboa”.
Engenheiro do ambiente interessado em ferrovia
Depois de se ter formado em Engenharia do Ambiente no Instituto Superior de Agronomia, Pedro Couto Pereira decidiu mudar-se para a Universidade Nova para obter o seu mestrado no mesmo curso, mas com perfil de Ordenamento do Território e Impactos Ambientais. O jovem caldense frequentou o ensino secundário na Escola Secundária Bordalo Pinheiro e em 2006 ingressou na universidade. O mestrado na Nova, além de relacionado com o seu curso, apresentava um perfil que lhe interessava por estar voltado para o Ordenamento do Território.
Para já, Pedro Pereira não quer prosseguir estudos. Gostaria de trabalhar na área em que se formou, de preferência em projectos ligados à regeneração urbana e à requalificação das cidades. Neste momento trabalha em part-time como guia no Museu de Electricidade.
Natacha Narciso
nnarciso@gazetadascaldas.pt































