
Revestimentos e filmes alimentares ou sacos de vários tipos, a investigadora do MARE tem ajudado a desenvolver uma miríade de produtos à base de algas, entre elas invasoras da nossa costa
Ana Augusto, de 35 anos, natural de Mélvoa, em Pataias, é investigadora no MARE – Politécnico de Leiria, situado em Peniche. No edifício Cetemares, onde está instalado o centro de investigação, há aquários onde crescem organismos marinhos, entre os quais as algas que a investigadora usa nos múltiplos trabalhos na área da biotecnologia e valorização dos recursos marinhos aplicada à ciência alimentar, em cujas equipas está envolvida.
Entre eles está o projeto “Algae Coat”, no qual desenvolveu revestimentos para as frutas (maçãs e peras), que demonstraram um poder de conservação do alimento superior ao das soluções sintéticas comummente usadas. “Percebemos que o nosso extrato da alga – um produto natural, feito a partir de codium – consegue inibir o escurecimento da maçã até quase 30 dias, em comparação com os entre 7 a 10 dias das soluções que são atualmente utilizadas”, conta.
Os revestimentos alimentares são “soluções que se colocam à superfície dos alimentos com o objetivo de os proteger do meio ambiente e fazer com que durem mais tempo ou, pelo menos, tenham qualidade e segurança alimentares. A maior parte das vezes é líquido e faz-se a imersão do alimento, que adquire uma camada protetora”, explica.
Este projeto tem-na acompanhado desde os tempos do mestrado, e está praticamente finalizado. Para que o produto do MARE possa ser utilizado enquanto aditivo alimentar, falta apenas passar nos testes de toxicologia exigidos pela União Europeia, que são muito dispendiosos, e não há fundos para os pagar.
Ana terminou o doutoramento em Ciências da Alimentação e Nutrição em 2022, mas já investiga no MARE desde o mestrado em biotecnologia dos recursos marinhos.
Diz que, quando entrou para a licenciatura em Biologia Marinha e Biotecnologia, não tinha ideia do que podia fazer com ela, mas os professores da Escola Superior de Turismo e Tecnologia do Mar (ESTM) abriram os seus horizontes, e o gosto pelo trabalho em laboratório foi crescendo.
“No mestrado, comecei com o estudo da utilização das algas como agentes de revestimento para maçãs, para prevenir a oxidação das maçãs fatiadas. E percebi que era conhecimento útil para a sociedade, que poderia vir a ser aplicado. Foi isso que me levou a seguir a área da investigação”, explica.
A bióloga reflete sobre a sorte que tem tido de seguir, desde sempre, uma linha de investigação que inicialmente era “muito pequenina”. “Consegui ir cada vez mais ao pormenor e perceber o que é que os extratos das algas estavam a fazer às fatias de maçã para inibir o seu escurecimento. E consegui chegar mesmo ao final da linha”, sublinha. “Consegui fazer os testes no laboratório e perceber que o produto podia ter potencial, perceber que funcionava à escala piloto, a nível semi-industrial (nem sempre o conseguimos fazer).”
Ana Augusto reconhece que recebeu alguns “nãos” até ganhar uma bolsa da FCT para o doutoramento, mas que foram “males que vieram por bem” e que o “timing” de tudo acabou por ser o melhor.
Agora, vai começar a liderar o seu próprio projeto, pois no dia anterior à nossa conversa, que decorreu no dia 1 de outubro, recebeu a boa nova de ter conseguido um contrato de investigação “CEEC”, financiado pela FCT. “É a valorização de tudo o que tenho feito”, reconhece. “O objetivo é fundir todas as áreas em que trabalhei até agora.”
À semelhança dos outros projetos em que está envolvida – “Sea Film”, “Embalagem do Futuro”, “Orquestra”, etc. -, no seu projeto “CEEC” será “tudo muito aplicado, a tentar colaborar com a indústria”. O projeto “Algae Coat” foi realizado em colaboração com a empresa de hortofrutícolas Campotech, em Torres Vedras, e no projeto do “Sea Film” “fomos falar com a indústria aqui em Peniche ligada à conservação do peixe”.
Atualmente está também muito dedicada a este último projeto, iniciado durante o mestrado, no qual desenvolve filmes alimentares “100% naturais” com as mesmas algas usadas nos revestimentos, mas também com algas invasoras presentes na costa de Peniche. Estas películas visam proteger o pescado congelado.
“É um três em um: são comestíveis, 100% compostáveis em casa (em 14 a 30 dias ficam completamente degradados) e permitem substituir os plásticos de uso único, para os quais a UE já criou multas, apesar da escassez de alternativas existentes no mercado. Outra grande vantagem é que o filme consegue prevenir a queimadura pelo gelo, conseguindo o alimento manter-se com maior qualidade durante o tempo de armazenamento, em comparação com os outros filmes que usam o plástico”, explica.
“Agora estamos a tentar fazer a produção do filme para um dia o conseguirmos comercializar. Mas primeiro temos de validar à escala piloto (no laboratório)”, conta. A patente do produto é europeia e só do IPLeiria, que poderá vir a criar uma start-up para a comercialização dos filmes.
Porém, para Ana Augusto, neste momento, o maior projeto é mesmo a sua bebé.






























