
Veio para as Caldas em 1970 e toda a vida foi professor e pároco em várias freguesias do concelho, tendo vivido por dentro o 16 de Março. Aos 84 anos, o padre Eduardo Gonçalves mantém-se muito ligado à comunidade local. Ainda hoje dá explicações de Latim e mantém uma forte vitalidade e dinamismo.
Tem 84 anos, mas ninguém pára o padre Eduardo Gonçalves, uma força da natureza que continua a dar resposta aos seus antigos alunos que lhe pedem para batizar filhos e “até já alguns netos”. Este ano, já celebrou “quatro aniversários de 50 anos de casais”, revela.
O confinamento fez adiar muitas festividades e, como tal, desde junho, que praticamente todos os fins de semana o padre Eduardo, natural do concelho de Torres Novas, teve de celebrar batismos, casamentos, bodas de prata ou de ouro.
Veio para as Caldas em 1969 para lecionar Religião e Moral na Escola Industrial e Comercial (atual Secundária Bordalo Pinheiro) e ajudar o pároco local. No ano letivo seguinte, já se dividia entre a Bordalo e a então Secção Liceal que seria a futura Escola Secundária Raul Proença onde ensinou até se reformar.
Entretanto, o prior da Foz, Nadadouro e Serra do Bouro abdicou e o padre Eduardo acabou por tomar o seu lugar, logo a partir de 1970.
A pedido do padre José Guerra, é chamado para uma nova missão: tomar conta do Colégio Ramalho Ortigão, que funcionava como Jardim de Infância e atividades de tempos livres.
“Quando somos novos temos força para tudo”, disse Eduardo Gonçalves que tinha 31 anos e, além das escolas, era pároco nas três freguesias caldenses.
A maior parte das suas atividades realizavam-se fora da Igreja, nas escolas e em ligação com a comunidade, o que o leva a afirmar que tinha até uma atitude fora do sistema clerical e de abertura ao mundo.
“Hoje sou mais tolerante em relação às pessoas do que quando tinha 30 anos”, contou o pároco que foi ordenado aos 24 anos e que ainda passou pelo Montijo e por Santarém antes de vir para a cidade termal.
Aos 84 anos, o padre Eduardo possui uma prodigiosa memória e é com grande detalhe que conta as situações que viveu.
Assistiu ao crescimento da cidade, ao surgimento de novas escolas e da vinda de milhares de alunos para as Caldas, não só com a abertura da Secção Liceal e da D. João II.
“A abertura da sociedade à escola foi algo fulcral para a transformação das sociedades rurais”, referiu o padre que acha que a vinda para a cidade e a escolarização acabaram por beneficiar e trazer novos hábitos à maneira de ser e de estar nas aldeias.
“O alcoolismo era um problema central”, disse o sacerdote, satisfeito por ao fim de poucos anos ter assistido ao encerramento de muitas tabernas. Testemunhou muitas mudanças na vida social e política das Caldas da Rainha e não esquece o 16 de março de 1974. Nesse dia, uma quarta-feira, o padre Eduardo chegou aos Pavilhões do Parque para lecionar.
Logo os seus alunos o informaram que havia movimentações militares nas Caldas, que o quartel do RI5 (hoje ESE) estaria cercado. “Nem pensei em mais nada! Agarrei no carro e fomos até à rotunda da entrada da cidade, que liga o percurso a Óbidos e efetivamente havia militares à entrada da localidade. “Só víamos os canos das suas armas atrás dos caniços”, lembrou o sacerdote que naquela tarde tinha previsto a audição do musical operático “Jesus Cristo Superstar”, lançado no final de 1973 e que Eduardo Gonçalves tinha conseguido obter e queria ouvir com os estudantes o musical que ele próprio tinha traduzido.
Só que os militares que vieram de Santarém e de Abrantes cercar o quartel do RI5 – a menos de um mês da Revolução dos Cravos – “acabaram por se instalar também nos Pavilhões de Parque nesse dia”. “Era lá o poiso da infantaria”, referiu o padre Eduardo, comentando que alguns acabaram por vir também ouvir os temas daquele musical que estava na moda e que refletia sobre a vida de Cristo. A história tem destas reviravoltas.






























