Antigo ministro da Educação defende flexibilidade e diversidade na escola

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Guilherme d’Oliveira Martins ladeado por João Silva e Lina Nicolau, da Escola Raul Proença

Uma escola aberta a todos, que aposta na diversidade e flexibilidade, é a receita de Guilherme d’Oliveira Martins, que esteve no passado dia 15 de Janeiro na Escola Secundária Raul Proença para falar sobre educação e cidadania à luz do perfil dos alunos à saída da escolaridade obrigatória. O historiador e antigo ministro da Educação referiu, ainda, que um dos desafios que se colocam hoje às crianças que chegam à escola é o de conseguir utilizar correctamente a muita informação que já possuem, transformando-a em conhecimento e defendeu a necessidade de encontrar “formas reais e eficazes” de valorizar o professor e educador na sociedade

“Quando um aluno termina a escolaridade obrigatória, não tem senão licença para aprender”, disse Guilherme d’Oliveira Martins nas Caldas, acrescentando que a dificuldade que se coloca aos alunos é garantir que consigam utilizar correta e adequadamente a muita informação que têm, transformando-a em conhecimento. Mas esse conhecimento, alertou, de nada vale sem bom senso, o que considera ser a chave da perspectiva humanista.
O coordenador do estudo do Perfil do Aluno no Final do Ensino Obrigatório destacou que o mais importante numa escola é a “valorização”, a força das pessoas e sua capacidade de fazerem da escola um conjunto de “pedras vivas”. E falou da importância do erro e da inclusão e defendeu a ideia de flexibilidade, destacando que não há dois alunos iguais e que também não há receitas na educação. Considera fundamental a compreensão de que “cada pessoa é irrepetível”, reconhecendo que é importante que as crianças tenham bons equipamentos, mas que o fundamental é contarem com a escola, família e comunidade.
O historiador entende que uma cidadania activa que pressupõe a capacidade de ser responsável e não ser indiferente, por exemplo, ao ambiente, pois, como alertou, não existe um planeta 2. “Há que ter consciência que temos destruído o no meio ambiente a uma velocidade tremenda. Em 1970 foi lançado, em Estocolmo, o alerta da destruição do meio ambiente, mas que ocorreu desde então até hoje foi maior do que a poluição criada desde o inicio da humanidade até 1970”, denunciou.
O antigo ministro da Educação do governo de António Guterres considera que um dos desafios que se colocam hoje às crianças que chegam à escola é o de conseguirem utilizar correctamente a muita informação que já possuem, transformando-a em conhecimento e criação contemporânea. Na visita que fez pela escola viu nas paredes intervenções de artistas, que as permitiu tornar mais belas. “É o patriotismo prospectivo, que falava Raúl Proença”, disse, reportando-se à ideia de se gostar da sua terra e gentes e poder aprender com eles.
Presente no encontro na Escola Secundária Raul Proença, o director do agrupamento, João Silva, questionou o orador sobre a inversão de valores e a preocupação de certos pais em que os seus filhos obtenham resultados sem terem em conta se o fazem pelos meios mais correctos. “É fácil pôr os alunos na rua com cartazes a protestar, mas depois é difícil fazê-los andar 10 metros para fazerem a separação dos resíduos”, exemplificou. Na opinião do orador os valores são para ser trabalhos e a escola tem de se aplicar nesse ponto.
Optimista em relação ao desenvolvimento do digital e inteligência artificial, o historiador considera que este progresso deve ser encarado como uma possibilidade fantástica, que permitirá, por exemplo, que as pessoas tenham menos horas de trabalho e a criação de riqueza e bens aptos para satisfazer as suas necessidades. A população está a crescer, há uma maior esperança média de vida e a escola “vai ser, talvez, a instituição que terá de mudar mais rapidamente”.

professor no centro

Lina Nicolau, coordenadora da Estratégia da Educação para a Cidadania, disse que estão a ser exigias várias mudanças aos professores e que alguns deles, à beira da reforma, já não têm vontade de fazer esse esforço. O político defendeu que é preciso encontrar formas “eficazes” de valorizar o professor. “Pôr o professor e o educador no centro, é fundamental”, disse acrescentando que as formas de valorização e motivação a encontrar não são exclusivamente materiais. O responsável partilhou com a plateia, maioritariamente composta por professores, que em inquéritos feitos a alunos do ensino secundário resposta mais frequente é a de que a “escola é uma maçada”. Recorda que o ensino secundário foi concebido para o prosseguimento de estudos e que actualmente, a lógica da educação obrigatória de 12 anos e a de adquirir estudos, independentemente do facto que querer prossegui-los ou não.
Não sua opinião os resultados são fundamentais, assim como as avaliações, mas o essencial é a aprendizagem. “A educação não é só da escola, a sociedade tem de assumir essa função”, disse, defendendo uma escola de portas abertas. Guilherme d’Oliveira Martins considera também que nem todos os alunos têm que ter Latim, Grego ou praticar a mesma modalidade e que uma “escola uniforme é uma escola que não responde e é maçadora”. A solução, preconiza, está na diversidade e flexibilidade e, parafraseando Montaigne, disse que “mais vale uma cabeça bem feita do que bem cheia”.

O envolvimento da cidadania activa no património cultural

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Em 2018 assinalou-se o Ano Europeu do Património Cultural e, no seu início, um estudo do Euro Barómetro mostrava que Portugal era o primeiro a valorizar o seu património, mas que depois era o último a fazê-lo com actos concretos, relativamente ao envolvimento da sociedade. “Éramos o país em que menos visitávamos os museus e menos assistíamos a espetáculos culturais”, exemplificou Guilherme d’Oliveira Martins, para informar que viria a registar-se um volte-face que faria que, no final do ano, Portugal acabasse em 3º lugar, a nível europeu, com maior número de actividade de envolvimento concreto de cidadania activa em torno de todo o património cultural. E como é que isso aconteceu? De acordo com o coordenador nacional do Ano Europeu do Património, houve um envolvimento das escolas, com as bibliotecas escolares e os centros de recursos, “como placas giratórias onde todos se encontram e onde ler e aprender é, simultaneamente, dialogar”.
O antigo presidente do Centro Nacional de Cultura destaca também a importância do património digital, a “informação que tem que se transformar em conhecimento”.
Admirador do patrono da escola, Raul Proença, o actual administrador executivo da Fundação Calouste Gulbenkian considerou-o uma das grandes influências da cultura do século XX e deixou desde logo a sua disponibilidade para voltar aquele estabelecimento de ensino para falar sobre esta personalidade.

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