O processo de licenciamento de homologação da pista de aviação da Lagoa de Óbidos está a levantar um diferendo entre a Câmara de Óbidos e o Aeroclube da Lagoa. Em causa está a interpretação da lei, em que a autarquia considera que a pista está em área de Reserva Ecológica Nacional (REN), enquanto que a direcção do Aeroclube alega que a sua licença é anterior aquela classificação e, por isso, não se encontra por ela abrangida.
Entretanto, desde que o processo deu entrada no Instituto Nacional de Aviação Civil (INAC), há quatro meses, que estão sem voar. A Câmara já sugeriu outros espaços para a instalação de uma pista, que os responsáveis garantem não ter condições e que não será licenciada.
Em Maio de 1997 dá entrada no Ministério do Ambiente o pedido de licenciamento do Aeroclube, que tem parecer favorável em inícios do ano seguinte. É também em 1997, mas em Setembro, que entra em vigor o regime de transicção da REN, o que leva o presidente do Aeroclube da Lagoa, Luíz Corte-Real, a sustentar que o processo já estava aprovado aquando da passagem para Reserva Ecológica, pelo que a legislação não se aplica a este caso.
O responsável lembra ainda que em 1992 a Câmara de Óbidos, então presidida pelo socialista Pereira Júnior, emitiu uma declaração para ser apresentada na Direcção Geral de Aeronáutica Civil onde refere que “não vê inconveniente” na utilização do terreno situado no Arelho, nas antigas salinas, onde se encontra instalada a pista de aviação pelo Aeroclube de Óbidos. E declara ainda que “apoia esta actividade e que é de interesse a existência do aeroclube, bem como os objectivos a que se dedica”, refere Luíz Corte-Real.
Entretanto, em 2006, sai nova legislação para as infraestruturas aeronáuticas que obriga todas as pistas, mesmo as já legalizadas a entregar documentação, nomeadamente uma declaração da autarquia para autorização da pista. Mas, a “Câmara sempre se recusou a passar esta declaração alegando que aquilo estava em zona REN”, diz o responsável, que discorda desta posição.
A Câmara de Óbidos pediu um parecer à CCDR – entidade que tutela aquele espaço – sobre a legalidade do Aeroclube ali situado, que esclarece que o “regime das áreas integradas na REN não se aplica a realização de acções autorizadas à data da entrada em vigor da delimitação REN”, explica Luíz Corte-Real, acrescentando que também informa da declaração emitida anteriormente pela autarquia a concordar com a utilização daquele terreno.
O responsável do Aeroclube acusa a Câmara de “deturpar as informações, tanto no que se refere ao ofício da CCDR, como a proibição de voos entre final de Janeiro e Maio devido à nidificação de avifauna”. E esclarece que estão condicionados a voar apenas nos braços da Barrosa e Bom Sucesso e Poça das Ferrarias.
Alternativas “sem condições” para criação de uma pista
A Câmara de Óbidos garante que não pretende encerrar o Aeroclube. O vereador Humberto Marques explica que não foi emitida uma declaração favorável ao Aeroclube por terem que respeitar os prazos legais a que estão obrigados e por razões jurídicas que se prendem com a REN. “Sempre dissemos que com a REN, e não havendo licenciamento anterior, seria muito complicado”, disse à Gazeta das Caldas, questionando-se porque é que a três meses de terminar o mandato autárquico é que se tenta avançar com um processo destes. “Ao ver isto tudo ser agora dinamizado pelo PS de Óbidos, percebemos que pode ter havido uma intenção de condicionar a Câmara, achando que esta nunca iria tomar uma decisão desfavorável em véspera de eleições”, denuncia.
O vereador, e candidato pelo PSD à Câmara, adianta que os juristas e serviços técnicos aconselharam “vivamente” o executivo a não emitir a declaração. “Se alguém quis armar uma cilada à Câmara Municipal enganou-se, pois não caímos na armadilha de violar o regime da REN e incorrer em perda de mandato”, diz.
Humberto Marques explicou ainda que estando a pista numa zona de REN se propuseram a estudar outro local como alternativa e justifica que querem potenciar o eixo aeronáutico, pois têm actualmente empresas que investem na vigilância aérea, paraquedismo e até transporte de passageiros, assim como às práticas de ultraleves e aeromodelismo. “É nesse que estamos a trabalhar e já visitamos o local com a direcção do Aeroclube, que manifestou compreensão e quis começar a trabalhar connosco na alternativa”, disse.
No entanto, à Gazeta das Caldas, José Ruivo, tesoureiro do Aeroclube, explicou que as propostas de terrenos feitas pela Câmara, são de privados e que será “necessário entrar em expropriações, que são morosas e envolvem custos”. Para além disso, os locais, ambos na Quinta do Furadouro, perto do limite do concelho de Peniche, não apresentam condições para a instalação de uma pista, acrescenta o responsável, destacando que as propostas não seriam aprovadas pelo INAC.
O responsável dá nota das condições de excelência que possuem no Arelho e considera que esta alteração é como que “fazer uma transfusão de sangue ao Aeroclube, para acabar com ele”, até porque, acrescenta, a autarquia não conseguirá colocar uma nova pista a funcionar nos próximos três anos.
O responsável do Aeroclube acredita que este não é um assunto político mas de interpretação da lei e aguarda agora que “haja bom senso na Câmara”, garantindo que vai continuar a lutar para manter aquele espaço junto à Lagoa.
Actualmente o Aeroclube tem 95 sócios portugueses, 57 espanhóis e dois franceses. Não estão a voar desde que deram entrada do processo no INAC, há cerca de quatro meses, com excepção dos dias 11 e 12 de Maio que tiveram autorização daquele organismo para promover um evento com 18 aviões espanhóis.
Luiz Corte-Real disse ainda à Gazeta das Caldas que se a decisão for favorável ao Aeroclube sairá “caro à Câmara” porque vamos entrar com um pedido de indemnizações pelos prejuízos causados com o tempo que têm estado impedidos de voar.
Fátima Ferreira
fferreira@gazetadascaldas.pt































