“Há dez anos ainda se via em Portugal o burro a puxar a carroça”

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notícias das CaldasA família Featherstone-Clark é oriunda de Bisham, uma aldeia inglesa a oeste de Londres, perto da cidade de Marlow. Sheila, professora de 53 anos, e Stewart, gestor de 49 anos na área das tecnologias da informação, vêm com a sua filha Ailsa, de 14 anos, e o pai de Sheila, John, de 82 anos. A família tem uma casa que construiu no Nadadouro há 24 anos e faz férias nas Caldas da Rainha há 40 anos. Desta vez a filha do casal trouxe até uma amiga, Reann. Gazeta das Caldas conversou com esta família no Parque D. Carlos I

GAZETA DAS CALDAS – Do que gostam mais na cidade e na região?
SHEILA FEATHERSTONE-CLARK – A atmosfera é muito amigável e as pessoas aceitam facilmente o inglês. Mas por vezes gostamos de falar um pouco em português, embora seja um pouco frustrante. Também gostamos bastante dos restaurantes tradicionais. E o meu pai gosta imenso dos doces, especialmente da mousse de chocolate. Já para não falar que os bolos custam metade do preço do que em Inglaterra. No geral a cidade é muito relaxante, o parque é óptimo, e a partir das Caldas da Rainha é possível visitar outros sítios muito interessantes, como Óbidos, Nazaré e S. Martinho. Há muitos sítios onde se pode ir e não se está preso a um único local.

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GC – E do que é que gostam menos?
SFC – Do vento que tem estado nos últimos dias. As construções na vossa costa, e especialmente na lagoa de Óbidos, não são muito boas. Há falta da típica construção portuguesa, em vez das casas quadradas que lá estão. Falta algum planeamento.

GC – O que acham que mudou mais desde as vossas visitas anteriores?
SFC – Alguns dos pratos tradicionais já não são tão fáceis de encontrar. Adoramos a feijoada, a dobrada, a carne de porco à alentejana e o ensopado de enguias. É mais difícil agora encontrar as coisas que vemos em postais – há dez anos ainda se via o burro a puxar a carroça. Há uns anos via-se muito mais construção. E agora há mais pessoas a falar inglês.

GC – Quais vos parecem ser os principais trunfos para atrair turistas a esta região?
SFC – Há óptimas praias e bons sítios para os adolescentes se divertirem, como a Green Hill ou o Solar. A Praça da Fruta e os vossos talhos são fantásticos! Mas para nós, adultos, era interessante haver mais fado ou atracções de cultura local. Também seria bom que se fizessem mais actividades junto à lagoa de Óbidos, por exemplo, andar a cavalo.

GC – E o que procuram mais no turismo que fazem, não só aqui mas noutros locais?
SFC – Não gostamos de um turismo demasiado comercializado, com imensas pizzas e comida internacional. Gostamos da cultura das regiões e esta cidade ainda é muito portuguesa, não como o Algarve, que é igual a tantos outros locais no mundo. No fundo, sítios com poucos Starbucks e McDonald’s (risos)

GC – Que pensam dos transportes da cidade e da região?
SFC – O sistema de transportes é bastante bom, mas não tenho a certeza de que toda a gente saiba disso. No ano passado a minha filha veio de autocarro para aqui, vinda do aeroporto, e acho que muitas pessoas não se lembrariam disso – é uma boa alternativa ao aluguer de automóvel.

GC – Nesta estadia, que outros locais aqui perto já visitaram?
SFC – Fomos à zona da batalha da Roliça, a Óbidos, ao Budha Eden no Carvalhal e ao Museu dos Dinossauros na Lourinhã.

GC – Em relação ao vosso país, como vêm a situação do primeiro-ministro David Cameron ter contratado Andy Coulson, envolvido no escândalo das escutas telefónicas?
SFC – O primeiro-ministro está sob muita pressão. Ele não está a fazer tantos progressos como esperava quando foi eleito – tudo o que ele está a tentar fazer fica diluído pela pressão. Está a ter um trabalho mais árduo do que estava à espera no início.

GC – E em relação à situação financeira portuguesa, qual é a vossa opinião?
SFC – Pelo que as outras pessoas nos têm dito, os portugueses querem ter tudo, mas não têm dinheiro. É uma pena, e esperamos que Portugal consiga estabilizar-se, mas há que ser realista. Tem havido imenso dinheiro da União Europeia a entrar em Portugal nos últimos dez anos – há novas pontes e auto-estradas, o que vos dá óptimas infra-estruturas. Mas esse volume de receitas não vai continuar a vir e vocês devem reconhecer que têm que parar de gastar tanto dinheiro, e repensar onde o vão passar a gastar.
Ora isso é algo muito complicado para qualquer país, e os portugueses parecem-me um povo muito relaxado, que deve estranhar ter que tomar este tipo de decisões. Mas acho que não conseguimos ter uma imagem precisa de como as coisas estão boas ou más em Portugal, porque tudo o que sabemos é o que vem nas notícias. No geral, as coisas não nos têm parecido tão más como dizem as notícias, ainda que se veja que algumas lojas fecharam e que não se constrói tanto. Mas também nos parece que ainda há muitos ricos em Portugal, e que as pessoas mais pobres é que sofrem mais. Talvez pudessem aproveitar mais algumas oportunidades de exportação. Os espanhóis, nos últimos anos, têm sido bons a criar marcas para vender os seus produtos e imagino que Portugal também tenha muitos produtos de qualidade para vender no estrangeiro, mas precisa de desenvolver melhores marcas para os promover.

Óscar Morgado
omorgado@gazetadascaldas.pt

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