“Boa tarde. É o D. José Policarpo? Posso falar consigo?”

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Foi assim que há 17 anos me dirigi ao mais alto responsável da Igreja Católica portuguesa através das grades do portão da sua casa, no Pego (Alvorninha), sem ter muito bem a noção de que aquele poderia não ser a forma de tratamento mais adequada para tão importante figura.
É claro que o ter acrescentado que era da Gazeta das Caldas facilitou o contacto. Afinal o então bispo (formalmente só seria cardeal no ano seguinte após a morte de D. António Ribeiro) até era leitor deste jornal e não teve pejo em abrir-me as portas da sua casa e convidar-me até para uma bebida.
A casa da família Policarpo, então partilhada pelos sete irmãos, estava em obras. Mantinha as características de uma casa agrícola, mas ganhara entretanto garagens, um extenso relvado e até um campo de jogos polivalente.
Sentámo-nos à mesa de uma sala do rés-de-chão e aceitei a bebida. D. José Policarpo puxa de um cigarro. Enquanto dura a entrevista não parará de fumar. E esse será até um dos temas abordados na conversa.
Conta-me que já tinha pensado deixar de fumar. “Mas não sei o que é pior, se o andar bem disposto e fumar um cigarrito, se o stress provocado por deixar de fumar. E para stress já tenho uma vida bastante agitada”.
E refere a vida stressante que viveu sobretudo quando era reitor da Católica: “uma universidade com 12 mil alunos, mil docentes e espalhada por quatro pólos é uma máquina muito pesada”.
Quase 20 anos depois, porém, a imagem que recordo daquela conversa com o cardeal patriarca é a de um homem extremamente calmo e muito afável. Que parecia que tinha todo o tempo do mundo, que me respondeu às perguntas todas, contando-me a sua vida desde os tempos em que vinha “a cavalo do burro”, desde o Pego até às Caldas para pagar a décima e tratar de assuntos no Grémio da Lavoura para os seus pais.
Não fui o único a fazer perguntas. D. José Policarpo também quis saber da minha vida pessoal. É justo. Por isso não pude alegar que o jornalista era eu e que só a mim me competia fazer perguntas. Acabamos assim numa amena e inesperada cavaqueira, já cá fora, no jardim, numa soalheira tarde de Março.
Desde então fiquei fã deste ilustre caldense, com quem, desde logo, não pude deixar de simpatizar.

Carlos Cipriano
cc@gazetadascaldas.pt

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