O “novo” governo de Pedro Passos Coelho toma hoje posse envolto em incertezas e divergências na leitura constitucional. Na sua constituição mantêm-se os deputados eleitos pelo distrito de Leiria, Assunção Cristas, como ministra da Agricultura, e Teresa Morais, que ascende a ministra da Cultura, da Igualdade e da Cidadania.
Nas Caldas da Rainha, e após uma auscultação da Gazeta das Caldas, as opiniões dos partidos seguem a tendência nacional. Os partidos à direita acham que o Presidente da República falou ao país de forma correcta e que o governo encabeçado por Passos Coelho deveria governar. À esquerda critica-se o discurso tendencioso do chefe de Estado e acredita-se que o PS, BE e PCP podem chegar a acordo nas negociações e derrubar o governo de coligação.
“Discurso acertado”
Hugo Oliveira, presidente da concelhia caldense do PSD, considera que o Presidente da República teve um “discurso acertado” no que diz respeito à indigitação do primeiro-ministro e na forma como expressou a situação política do país. Aceita que possa ter ido “longe demais” em algumas matérias em relação aos partidos de esquerda, embora “compreenda a sua intervenção”.
O também vereador acha que Passos Coelho não terá dificuldade em formar governo. Prevê é que possa haver “alguma irresponsabilidade” por parte de deputados da Assembleia da República, ao pôr “em causa um governo só porque entendem que um maior número de deputados possa formar governo, o que não é tradição em Portugal”.
Hugo Oliveira diz mesmo que, embora a votação nas eleições legislativas seja para eleger deputados, “é uso da população votar a pensar eleger o primeiro ministro”. E a maioria, acrescenta, votou na coligação Portugal à Frente. “Se quisessem que o primeiro-ministro fosse António Costa, teriam votado nele”, afirmou.
Não o assusta um governo formado por partidos de esquerda, mas preocupa-o. “Preocupa-me o facto de haver matérias fracturantes e pouco ortodoxas, nomeadamente em relação à União Europeia e à Nato, que alguns defendem como bandeira”, disse Hugo Oliveira, criticando o facto de ainda não terem chegado a posições concordantes.
“O que vemos é uma esquerda que diverge muito em matérias fundamentais e ainda não vimos acordo nenhum”, concretizou.
Esquerda pode causar “danos sérios”
A presidente da concelhia caldense do CDS-PP, Margarida Varela, gostou de ouvir o Presidente da Republica falar ao país. “Achei que Portugal tem um presidente que é justo, fez sobressair o que é expectável, tendo em conta uma história democrática com 40 anos em que todos os candidatos que venceram foram indigitados”, disse. Na sua opinião, trata-se mesmo de uma regra de bom senso tomada a partir da Constituição portuguesa.
Considera que a “sede” de poder dos partidos é visível e que são incapazes de ver todos os “esforços desenvolvidos pelos portugueses nos últimos anos, o que revela falta de humildade, humanidade e patriotismo democrático”.
Não a assusta a existência de um governo de esquerda pois confia na solidez das instituições democráticas. No entanto, lamenta que possam “vir a ser postos em causa” os esforços que nos últimos anos foram feitos pelos portugueses. “Em Portugal o governo foi sempre formado por partidos que acreditam na União Europeia e que se pautaram por cumprir os compromissos internacionais”, disse, acrescentando que a coligação de esquerda poderá causar “danos sérios” à credibilidade do país.
“Cavaco lida mal com a democracia”
Lino Romão, do Bloco de Esquerda das Caldas, considera que o discurso de Cavaco Silva foi de uma “certa radicalidade à direita” e que marginalizou cerca de um milhão de eleitores (que votaram no PCP e BE). “Um Presidente que devia de ser de todos, assumiu a sua facção de direita radicalizada”, disse, referindo-se ao facto de este ter alertado para as coisas que aconteceriam se os partidos de esquerda chegassem ao poder.
O dirigente bloquista critica a visão “anacrónica” do chefe de Estado e caracteriza-o como um “homem que lida pior com a democracia do que esses partidos a que ele se referiu e dos quais só faltou dizer que deviam ser ilegalizados”.
Lino Romão diz compreender que Passos Coelho tenha alguma dificuldade em formar um novo governo porque “ninguém quer fazer parte do governo mais curto da democracia”. Isto porque, acredita, a composição de forças à esquerda na Assembleia da República não vai permitir este governo.
O dirigente bloquista espera agora que os partidos à esquerda se consigam entender, até porque quando há coligações “todos têm que fazer cedências”. Lino Romão explica que um programa de governo tem graus de intensidade e que quando se tem maioria absoluta podem-se aplicar as medidas na sua totalidade, mas neste caso cada partido terá que estar “mais próximo do programa mínimo e que é mais fácil de conciliar entre todos”.
Defende ainda que o futuro governo de esquerda deve ser de quatro anos, sob pena de voltar a direita ao poder. O facto da esquerda estar a trabalhar um acordo em sigilo absoluto também agrada a Lino Romão, que vê nesta atitude um sinal de que este está a ser “levado muito a sério”, estando confiante no resultado final.
“Presidente dividiu os portugueses”
“Um discurso muito além das competências que podem ser atribuídas ao Presidente da República”. É desta forma que a presidente da concelhia caldense do PS, Sara Velez, caracterizou o discurso proferido por Cavaco Silva a 22 de Outubro e no qual indigitou Passos Coelho para formar governo. Já as considerações que fez a seguir, “além de não respeitar a boa harmonia das instituições, também divide os portugueses”, acrescentou.
No que respeita às dificuldades de Passos Coelho em criar governo, a dirigente socialista considera que esta poderá ocorrer na sua viabilização. “Se Passos Coelho continuar preso à mesma narrativa a que esteve em três dos seus quatro anos de mandato, já há três partidos que mostraram a sua discordância”, disse, referindo-se ao PS, BE e PCP.
Sara Velez salienta que são partidos com programas próprios e perspectivas diferentes em algumas matérias, mas que estão determinados em tentar chegar ao que os une e não ao que os separa. “Se o processo correr bem, estão criadas as condições para a existência de um governo à esquerda”, diz a dirigente socialista que acredita na possibilidade de um acordo.
“Um discurso infeliz”
Para Vítor Fernandes, do PCP caldense, Cavaco Silva fez um discurso “tendencioso e pouco criterioso” no que diz respeito à Constituição, “marginalizando algumas forças políticas” como foi o caso do BE e do PCP.
Na sua opinião, o chefe de Estado “não tem que discriminar ninguém” porque todos foram eleitos. Por tudo isto, conclui que se tratou de um discurso “infeliz”, tendendo para o caminho da coligação PSD/CDS-PP.
Lamenta todo este episódio e garante que o seu partido tudo fará para que o governo indigitado “não tenha continuidade” na Assembleia da República.
“É um governo a prazo”, diz Vítor Fernandes, adiantando que este pode chegar ao Parlamento e que, ao ter o seu programa ser chumbado, terá que voltar para trás.
Apesar das negociações ainda não estarem fechadas, o dirigente comunista acredita que o PS, BE e PCP chegarão a um consenso. Diz mesmo que a demora que se está a verificar é “para encontrar uma plataforma de acordo”, que permita a constituição de um governo de esquerda e ter uma política “diferente da que houve nos últimos anos e que levou o país ao estado em que está”.






























