A descentralização de competências do Estado central para as autarquias é uma das prioridades do governo socialista, mas os autarcas mostram algumas reservas relativamente a este aumento de poderes. Os presidentes de Câmara das Caldas e de Óbidos reclamam um envelope financeiro adequado às competências a delegar e a necessidade de uma maior discussão sobre a matéria antes de uma tomada de posição definitiva, que terá que acontecer nos próximos três anos.
Alcobaça e Bombarral preferem não se comprometer e dizem que a discussão deve passar pela OesteCIM e Nazaré e Peniche não responderam.
O presidente da Câmara das Caldas, Tinta Ferreira, considera que os 4,3 milhões de euros que o Estado prevê transferir para a autarquia no âmbito da delegação de competências “não é suficiente nem se adequa à realidade local”. O autarca salienta que o actual quadro de funcionários das estruturas escolares e de saúde e do Museu da Cerâmica é insuficiente e prevê que haja, no futuro, um aumento do valor das despesas com a conservação dos equipamentos. “Os edifícios precisam de obras de grande monta e os quadros de pessoal são deficitários”, sintetiza.
No entanto, Tinta Ferreira está convicto de que enquanto a lei não for aprovada e publicada há margem para lutar por uma descentralização mais adequada às necessidades dos municípios.
O autarca discorda da passagem do Museu da Cerâmica para a alçada da Câmara pois considera que, pela sua “importância e relevância nacional, deveria ser tutelado a nível central”.
Esta temática da descentralização tem sido abordada, sobretudo na Assembleia Municipal, como aconteceu na última reunião, em que o autarca e deputados mostraram a sua apreensão face ao envelope financeiro que acompanhará as transferências de competências.
O vereador da oposição Luís Patacho (PS), concorda com a descentralização por princípio, pois considera que é uma consolidação da própria democracia e um aumento de responsabilidades para as autarquias. No entanto, ressalva que “é importante que o envelope financeiro seja adequado”.
O ex-candidato à Câmara considera que, estando munidas dos meios financeiros, as autarquias poderão gerir, de forma até mais eficaz, algumas das competências que estão previstas virem a ser descentralizadas. No caso das Caldas entende que os valores indicados pelo governo “são curtos para a nossa realidade”, sobretudo nas áreas da Educação, Saúde e Cultura, que são “as que envolvem custos mais elevados e são mais complexas”.
A questão que mais o preocupa é a passagem dos museus para o âmbito municipal. Luís Patacho é da opinião que os Museus da Cerâmica e de José Malhoa deveriam passar para a esfera nacional e não municipal, como o governo pretende no caso do Museu da Cerâmica. “Acompanho a Câmara nesta questão”, disse, acrescentando que discorda “com veemência que o museu passe para a tutela municipal e com a transferência de montantes que ficam muito aquém do desejável”.
O vereador socialista acredita que o processo não está fechado e que “ainda é possível melhorar alguns dos valores apresentados pois este governo tem mostrado que é possível negociar e dialogar”.
“Dinheiros mais bem gastos pelas autarquias”
O presidente da Câmara de Óbidos, Humberto Marques, é a favor da delegação de competências e contra a descentralização. “Esta última não nos dá a garantia da prestação cuidada de serviços de Norte a Sul do país”, diz, defendendo que seria “mais prudente” uma delegação de competências com as autarquias que sentissem maior preparação para determinadas áreas, num processo gradual e sempre com a regulação e avaliação do governo. “Esta forma não me parece prudente”, sintetiza.
Humberto Marques diz ter sérias dúvidas quanto aos valores financeiros a serem transferidos, que no caso de Óbidos ascendem a 1,65 milhões de euros. Por exemplo, na área da saúde a proposta do governo é feita sem que “tenhamos condições de avaliação dos actuais custos dos centros”. Questiona qual a base sobre a qual incidiu o levantamento do governo para chegar ao valor apresentado e se este prevê a necessidade de obras e manutenção dos edifícios ou a contratação de mais administrativos, que actualmente estão a ser assegurados pelas juntas de freguesia.
“Há muitas dúvidas na forma e conteúdo das competências que deverão ser ainda mais discutidas, para depois se decidir com segurança”, conclui.
Já o vereador do PS, Vítor Rodrigues, assume-se “acérrimo” defensor da descentralização de competências para os municípios. Refere que a matéria está consagrada na Constituição e que há vários estudos que mostram que os “montantes gastos pelas autarquias, pela proximidade que têm dos cidadãos, são mais bem gastos do que se fossem geridos pela administração central”.
Por outro lado, Vítor Rodrigues entende que a descentralização e a respectiva transferência de recursos devem ser objecto de avaliação “constante por parte do poder central, face ao executado, por parte de cada autarquia”.
A transferência de montantes para a Educação, no caso do município de Óbidos, já é prática desde há uns anos, por via do contrato inter-administrativo de delegação de competências, mas o vereador da oposição diz que desconhece o valor que o governo tem vindo a transferir para Óbidos nesta área. Todavia, tendo em conta o estado “deteriorado das escolas” deduz que o montante não tem sido suficiente para assegurar a manutenção dos edifícios e dos seus espaços e espera que a Câmara reclame o seu aumento.
Quanto à saúde, Vítor Rodrigues salienta que não foi dado conhecimento ao colectivo camarário dos termos dessa transferência de competências e de recursos, pelo que não se pode pronunciar sobre o envelope financeiro.
Alcobaça vai focar-se na área da saúde
Questionado pela Gazeta das Caldas sobre a descentralização e os montantes envolvidos, o presidente da Câmara de Alcobaça, Paulo Inácio, disse apenas que este assunto “está a ser tratado com a ponderação e o cuidado necessários”. E acrescenta que durante este período de transição até 2021, irão focar-se “essencialmente na área da saúde”, escusando-se a comentar se concorda com os valores indicados pelo governo e se concorda com a descentralização.
Bombarral não adere antes de 2020
Já o presidente da Câmara do Bombarral, Ricardo Fernandes, diz que não consegue, nesta altura, dar uma resposta concreta sobre se os montantes previstos na descentralização são suficientes. O autarca recebeu, através da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), uma listagem com a indicação de valores, nomeadamente para as áreas da Educação e da Saúde, calculadas na base de alguns critérios, que até lhe parecem lógicos. Contudo, precisa de fazer uma análise mais aprofundada dos dados para emitir “qualquer juízo de valor que possa ser verdadeiramente sustentado”.
A Câmara do Bombarral ainda não sabe quando estará em condições de aderir ao processo de descentralização. Ricardo Fernandes pretende abordar o tema na OesteCIM e perceber qual o sentido a tomar pelos restantes municípios do Oeste. Ainda assim, “face ao grau de desenvolvimento do processo e tendo em consideração os ciclos de gestão dos municípios podemos afirmar, com algum grau de certeza, que a adesão nunca ocorrerá antes de 2020”, conclui.
O autarca considera que este terá de ser um processo o mais participado possível, até para serem equacionadas as mesmas matérias sob diversos pontos de vista, de modo a que a decisão possa ser a mais acertada possível.
Gazeta das Caldas pediu também um comentário aos presidentes de Câmara da Nazaré, Walter Chicharro (PS), e de Peniche, Henrique Bertino (independete) sobre o assunto, mas estes não responderam.






























