As uniões de freguesias vieram para ficar?

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Os municípios e freguesias vão ser inquiridos sobre o processo de reorganização administrativa das freguesias entre o final de Setembro e meados de Outubro. Esta decisão do governo surge depois das propostas de lei apresentadas pelo PCP e BE, que defendem a reposição de freguesias antes das eleições autárquicas de 2017, e de uma resolução do PS que aponta para uma avaliação depois do acto eleitoral, como pretende o Governo.
Gazeta das Caldas falou com os presidentes das uniões de freguesias criadas na região, que destacam os ganhos em termos de escala e rentabilização dos recursos, mas também reconhecem uma possível perda da proximidade em relação aos seus fregueses. Esta é, de resto, uma das razões para o descontentamento em Salir do Porto, onde se sente ainda um grande desconsolo em relação à agregação com Tornada.

A polémica lei 22/2012, que prevê a reorganização administrativa do território das freguesias, levou à extinção (e agregação) de quatro freguesias no concelho caldense, passando de 16 para 12. Nossa Senhora do Pópulo, Coto e S. Gregório juntaram-se levando a uma união de freguesias, assim como as de Santo Onofre e Serra do Bouro e as de Tornada e Salir do Porto.
Vítor Marques, presidente da União de Freguesias de Nossa Senhora do Pópulo, Coto e S. Gregório, destaca a optimização de recursos permitida pela agregação. Ao autocarro e duas carrinhas, antes pertença de Nª Sra. do Pópulo, mais duas carrinhas de São Gregório e um dumper do Coto já juntaram mais duas camionetas, um trator roça caniços e uma máquina retro-escavadora.
Também o número de quadros afectos a esta freguesia quase que duplicou: de seis passou para 11, facto que ocorreu devido às delegações de competências que lhes foram entregues, entre elas a de manutenção do Parque D. Carlos I e Mata Rainha D. Leonor.
“O que se poderia perder, e achamos que isso não aconteceu, era uma maior proximidade das pessoas com o presidente da sua freguesia”, disse o autarca. Para colmatar esse problema, aquando da formação do executivo tiveram o cuidado de o dotar com duas pessoas de Nossa Senhora do Pópulo, uma do Coto e outra de S. Gregório.
“É normal que cada freguesia tenha o seu bairrismo e nós temos feito o possível por manter esse bairrismo”, disse, acrescentando que apresentam-se como uma união das três freguesias mas que incentivam as actividades que são desenvolvidas nos próprios locais, como foi o caso da reactivação da festa anual de S. Gregório.
Também a desconfiança inicial por parte de algumas pessoas foi esbatida, acredita o autarca.
As sedes de freguesia agora extintas continuam abertas. A do Coto não tinha funcionário e as instalações eram abertas pelos próprios membros do executivo, à noite, enquanto que a de S. Gregório tinha uma funcionária a tempo inteiro, que fazia atendimento aos fregueses e o transporte escolar das crianças. Agora a sede do Coto está aberta duas manhãs para atendimento e a de S. Gregório duas tardes, enquanto que o trabalho contabilístico passou a estar centralizado nas Caldas.
Os transportes escolares continuam a ser assegurados pela junta em S. Gregório através de um protocolo com o centro social.

ERA MAIS EFICAZ AGREGAR CÂMARAS

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Abílio Camacho, presidente da União de Freguesias de Santo Onofre e Serra do Bouro, diz que se mantém contra a agregação de freguesias, que, em seu entender, “não veio aliviar em nada” o orçamento de Estado. Para esse fim, o autarca defende que seria mais eficaz agregar algumas câmaras de pequena dimensão.
 “Muitas delas têm menos habitantes que a nossa união de freguesias, mas não houve coragem”, referiu.
Em relação à união de freguesias que dirige, Abílio Camacho diz que a agregação permitiu rentabilizar os recursos existentes. Com mais verbas do que as freguesias tinham anteriormente, é possível um maior controlo do que a autarquia consegue fazer. Foram adquiridas duas carrinhas, uma para transporte de crianças que serve em exclusivo o território da Serra do Bouro, e outra de caixa aberta para os funcionários realizarem as tarefas de manutenção nas duas freguesias. As instalações onde funcionava a Junta de Freguesia da Serra do Bouro mantém-se em funcionamento diariamente e no mesmo horário. Os funcionários também se mantiveram e Abílio Camacho refere que a união de freguesias até está à procura de mais um. “Temos poucos, não conseguimos ter sempre tudo arranjado, nomeadamente a limpeza, porque o território é muito grande”, refere.
De resto, o autarca realça que a poupança gerada não foi significativa, até porque a agregação obrigou a uma despesa inicial avultada na mudança de software informático e também de muito hardware, como as bandeiras, carimbos, selos brancos e papel timbrado.
Abílio Camacho fala de alguma resistência inicial, sobretudo por parte da população da Serra do Bouro, por ser uma freguesia muito antiga, mas acredita que esta foi a melhor solução. “A freguesia ficou com maior poder financeiro e já fizemos coisas que não seriam possíveis fazer com os fundos que a Junta de Freguesia da Serra do Bouro tinha”. Foi o caso de um novo parque infantil, alcatroamento de estradas e obras de manutenção no miradouro.
Hoje Abílio Camacho não sente descontentamento e diz que, apesar de haver uma pessoa sempre disponível na Serra para assinar alguns documentos, já muitos fregueses daquela zona se dirigem directamente a Santo Onofre para tratar de documentos como provas de vida e licenças.
Abílio Camacho vai todas as semanas à Serra do Bouro e reforça que, apesar da agregação, o executivo continua a dar valor e a respeitar a identidade das duas freguesias.

SALIR DO PORTO QUER VOLTAR A SER FREGUESIA

Em Tornada e Salir do Porto, os serviços funcionam nas duas freguesias, mas existem questões de identidade que as dividem.
O descontentamento surge do lado de Salir do Porto. “Perdemos identidade e poder de decisão”, aponta Eraldo Carmo, eleito para a assembleia da união de freguesias, que se demitiu recentemente “por não estar de acordo com o funcionamento” desta autarquia de base.
Eraldo Carmo integrou o executivo da Junta de Freguesia de Salir do Porto durante 18 anos, como tesoureiro. Diz que a agregação foi uma má decisão política porque afastou as pessoas do centro de decisão, pelo menos no caso de Salir do Porto.
José Cardoso, antigo presidente da Assembleia de Freguesia de Salir do Porto, consolida essa ideia. “Somos um meio pequeno, as pessoas encontram-se à noite na associação e quando era necessário os problemas resolviam-se rapidamente. Hoje eles [os membros do executivo] não se vêem todos os dias e as coisas demoram mais tempo a ser tratadas”, aponta.
Outra questão que preocupa estes dois ex-autarcas de Salir do Porto é a diferença de identidade das duas freguesias, uma à beira-mar e virada para o turismo, outra mais virada para a agricultura. “Tornada é uma freguesia simpática, damo-nos bem com as pessoas, mas gostávamos de ser freguesia”, realça José Cardoso, que diz que, a haver agregação, até fazia mais sentido agregar as freguesias com costa, “porque os interesses são idênticos”.
Eraldo Carmo é um pouco mais crítico e refere que a antiga junta de freguesia estava mais sensibilizada para as questões do turismo do que a actual união e afirma que ainda não viu nenhuma obra feita em Salir do Porto no actual mandato, além da habitual manutenção.
Ambos notam que Salir é, a par de Alvorninha, a freguesia mais antiga das Caldas, com carta régia de 1142, e não duvidam que se a população for consultada, irá responder que prefere voltar ao formato anterior.
Gazeta das Caldas contactou o presidente da União de Freguesias de Tornada e Salir do Porto, Henrique Teresa, mas este não esteve disponível para responder, assim como o vice-presidente Abílio Luís.

SOBRAL DA LAGOA VAI TER REFERENDO  

Em Óbidos houve uma única agregação: Santa Maria, São Pedro e Sobral da Lagoa juntaram-se numa união de freguesias. João Rodrigues, o seu presidente, considera que a nova unidade administrativa ficou mais forte com a junção de todos os meios e pessoal e ganhou escala.
Um dos primeiros objectivos do autarca foi criar um armazém central e juntar o pessoal afecto às três juntas de freguesia para trabalharem na nova estrutura administrativa. “E resultou”, remata João Rodrigues, destacando que a dificuldade inicial foi a falta de conhecimento de todo o território, superior a 37 quilómetros quadrados.
Agora são 11 os funcionários que prestam serviço a cerca de 4000 habitantes.
Antes do processo estar concluído, os cidadãos do Sobral da Lagoa manifestaram-se contra a perda de autonomia, chegando a fazer um abaixo-assinado. João Rodrigues diz nunca ter sentido qualquer animosidade, mas na última Mostra da Cebola, que decorreu naquela aldeia no fim do mês passado, informou a população de que iria avançar com o inquérito de satisfação e de auscultação sobre se querem voltar a ter autonomia administrativa. Esta iniciativa surgiu depois de ter tido conhecimento da proposta do BE na Assembleia da República para a reposição das freguesias.
O autarca entende que as freguesias de Santa Maria e S. Pedro (que já partilhavam a sede) devem continuar agregadas, até porque havia casos caricatos em que a habitação pertencia à Junta de Freguesia de Santa Maria e o quintal à de S. Pedro. Já no que respeita ao Sobral, gostaria que assim se mantivesse, mas entende que pela sua história e tradições, “se fosse autónoma poderia haver um maior incentivo para o seu desenvolvimento”.
Com a agregação, o Sobral ficou como delegação, funcionando de segunda a quinta-feira de manhã e à sexta à tarde. No restante tempo a funcionária faz um périplo pelos vários lugares, permitindo que as pessoas, sobretudo de mais idade, possam fazer os pagamentos de água, electricidade e telefone, entre outros serviços.

FREGUESIAS URBANAS REUNIDAS EM PENICHE

Em Peniche a união de freguesias juntou Ajuda, Conceição e S. Pedro, criando apenas um órgão administrativo na cidade. Henrique Bertino, que preside à união de freguesias, conclui que a maioria dos objectivos do programa eleitoral já está concretizada.
O autarca considera que algumas das áreas que faziam parte da extinta freguesia de São Pedro, acabaram por beneficiar com a agregação, tendo em conta que antes não tinham capacidade económica para avançar com obras que, com os recursos agora disponíveis, já foram realizadas. Henrique Bertino, que tinha sido presidente da extinta Freguesia de Ajuda e ali tinha criado uma equipa de operários e apoios logísticos, acabou por reforçar essa estratégia durante este mandato. “Continuo a pensar que os trabalhos nas freguesias dependem muito das sensibilidades, capacidades e vontades de cada um dos autarcas eleitos e, de alguma forma, onde cada executivo se dispõe a investir o dinheiro da freguesia”, remata.
Neste caso, em que os serviços administrativos das três freguesias extintas já funcionavam no mesmo edifício, a população acabou por não sentir grandes diferenças. “Alguns acabaram por beneficiar da alteração de alguns dos procedimentos administrativos”, acrescenta o autarca, que acredita que este mandato servirá muito para as análises comparativas que se venham a fazer.
Actualmente esta união de freguesias tem três trabalhadores administrativos, mas no passado, no conjunto das três, chegaram a ser o dobro dos funcionários. “Quando se consegue gerar algumas poupanças (nas várias frentes de trabalho), para nós são oportunidades de investimento que se criam para outras necessidades”, salienta, acrescentando que a gestão depende sempre da disponibilidade financeira de cada momento.
No caso da União de Freguesias de Peniche, as verbas disponíveis são sempre aplicadas, tendo-se no entanto, “sempre o cuidado de manter um saldo financeiro de reserva”.

QUATRO UNIÕES DE FREGUESIAS EM ALCOBAÇA

Em Alcobaça foram quatro as uniões de freguesias criadas pela agregação de 2013, que diminuiu o número de freguesias de 18 para 15.
Isabel Fonseca, presidente da União de Freguesias de Alcobaça e Vestiaria, diz que a autarquia que dirige ganhou expressão, população e uma nova identidade, além de ter permitido criar economia de escala. “As freguesias beneficiaram com o número de população uma da outra”, realça. Foram mantidos postos de atendimento nas duas localidades.
No entanto, a autarca reconhece aspectos negativos na mudança, a começar nas diferenças de identidade. Uma das freguesias é urbana e a outra rural e têm necessidades diferenciadas, o que exige “um esforço muito superior do executivo”, refere. Apesar dessas diferenças, Isabel Fonseca diz que a resistência inicial foi ultrapassada. Por outro lado, se o objectivo da agregação era gerar poupança, a única que vê é no número de eleitos, o que até nem tem um peso muito significativo.
Álvaro Santo, presidente da União de Freguesias de Coz, Alpedriz e Montes, faz um balanço positivo dos três anos de funcionamento desta autarquia de base. “No contacto diário com as populações constato que não se sentem lesadas com a agregação, antes pelo contrário”, observa.
O principal benefício que Álvaro Santo nota é uma maior eficácia na gestão de recursos financeiros, humanos e materiais. “É possível executar pequenas obras que até então só o era com o apoio da Câmara de Alcobaça”, realça.
Também nesta união de freguesias mantêm-se postos de atendimento abertos nas três localidades. Para facilitar a integração, o executivo reúne-se e faz atendimento ao público nas três freguesias. O mesmo acontece com a assembleia, que reúne de forma rotativa nas três localidades.
Tal como a sua homóloga da União de Freguesias de Alcobaça e Vestiaria, Álvaro Santo refere que a única poupança gerada é no vencimento dos membros do executivo, por serem em número menor. No entanto refere que existe um deficit nos recursos humanos, “que a ser devidamente equilibrado com o volume de trabalho exigido atualmente”, anulará essa poupança.
Também aqui houve resistência inicial das populações, no caso a de Alpedriz, mas o presidente afirma que hoje esse sentimento está ultrapassado e sente satisfação dos fregueses pelo trabalho desenvolvido.
Gazeta das Caldas tentou também auscultar as uniões de freguesia de Aljubarrota e de Pataias e Martingança, mas não obeteve respostas até ao fecho de edição.

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