Zé das Papas

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A Canela – parte II
Não se tendo concretizado a profecia dos maias, cá volto aos meus escritos…
Em vésperas do dia de Reis regresso à canela que foi preponderante nas mesas dos menos desfavorecidos.
Já referi que os portugueses substituíram, com êxito, os mercadores, que se abasteciam nos mercados do Levante, subvertendo o tráfego entre a Europa e o Oriente, passando, a partir de então, o comércio a ser dominado pela rota do Cabo.
No ano de 1506 desembarcaram em Ceilão, ilha muito fértil em produtos naturais,  com destaque para a canela, apreciada pela superior qualidade em relaçao à do Malabar, onde a caneleira tinha sido aclimatada.
Chegaram ao Oriente encontrando um comércio já perfeitamente organizado em torno de mercados e rotas há muito estabelecidas. Bases terrestres dispersas desde a costa Oriental Africana à costa de Malabar serviam de suporte a uma actividade intensa que convergia na entrada do mar Vermelho e do Golfo Pérsico – a rota do Levante, dominada por mercadores árabes, turcos e judeus, bem como alguns europeus.
Foi sobre as potências muçulmanas do Extremo Oriente que recaiu todo o peso da conquista portuguesa, por culpa dos seus correligionários do Médio Oriente: não só tinham sido os Turcos que haviam feito subir escandalosamente o preço das especiarias, como tinham sido os árabes que haviam inculcado nos europeus uma fé infinita nas qualidades medicinais destas plantas.
Graças aos ensinamentos da medicina árabe, os europeus acreditavam que as especiarias eram uma espécie de panaceia para a longevidade e a cura de todas as infecções. Os médicos passeavam-se pelas ruas da Europa, atulhadas pela peste, levando uma laranja seca especiada com cravo, suspensa muito próximo do nariz!
O comércio português na Ásia atingiu o seu auge no reinado de D. Manuel I e a permanência lusitana na ilha dura 165 anos.
Monopólio da coroa, a canela constituiu, assim, uma das nossas principais fontes de receita, já que o seu comércio era muito lucrativo.
Começámos a ser privados deste monopólio quando, de 1600 a 1620, o Extremo Oriente e as especiarias nos foram escapando quase por completo.
Em 1658, terminou o domínio português em Ceilão e os Holandeses, que nos expulsaram, concentraram ali a produção da canela, impedindo a sua produção noutros territórios.
Mais tarde, a partir de 1796, o comércio passou para os ingleses, quando  ocuparam a ilha.
A perda do comércio desta e de outras especiarias levou-nos a promover a sua cultura sistemática em África e sobretudo no Brasil, para onde se deslocou o centro do Império Português no séc. XVII. Seguiu-se uma política económica oposta à  de D. Manuel, que proibira o cultivo das especiarias na África e América portuguesas e chegara a ordenar a destruição dos espécies nativas que fossem encontradas e pudessem fazer concorrência ao comércio oriental.
Em África, a cultura da caneleira desenvolveu-se em 5.Tomé, para onde que a planta teria sido levada já no séc. XVI, embora não tivesse sido fomentado o seu aproveitamento na altura, pelas razôes já apontadas.

João Reboredo
joaoreboredo@gmail.com

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