Uma questão de aviário ou a passarada de Rafael

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Um dos temas que, recentemente, mais tem ocupado as páginas dos jornais, o tempo das televisões e a atenção dos bloguistas, é a ovocultura.
Espantoso assunto para um país que se encontra na bancarrota!
Pelo que me foi dado perceber, há cerca de doze anos, a União Europeia legislou sobre as condições de habitabilidade das galinhas poedeiras com o objectivo de garantir o direito destes animais a viverem em boas condições de espaço e de salubridade, por respeito pela respectiva qualidade de vida, pela qualidade dos seus ovos e, em última análise, pela segurança alimentar e pela saúde pública.
Como é usual no nosso país, todas as entidades envolvidas permitiram que o atraso atingisse o limite do aceitável no que respeita à aplicação das medidas impostas pelos regulamentos europeus a este sector de actividade. Neste momento de crise generalizada e de escassez de liquidez, os avicultores encontram-se, parece, na impossibilidade de cumprirem a lei, correndo-se o risco da eliminação dos galináceos e, consequentemente, de nos faltarem os ovos.
E, ironia das ironias, tudo isto se passa numa área de negócio em que Portugal tem sido mais do que meramente auto-suficiente, uma vez que chega a exportar o excedente da produção para países de galinhas menos proficientes na sua postura …
Longe de mim pôr em causa a necessidade de optimização das condições das galinhas poedeiras. E os porcos? Em que condições se permite que (sobre)vivam? E os coelhos? Nenhum destes grupos de animais importa, meramente porque não põem ovos? E a questãozinha da saúde pública? Umas vezes sim, outras nem tanto?…
Está visto que não percebo nada destes assuntos. Contudo, a ignorância não apaga a preocupação.
Agora o que eu sei é que no seu último jornal, «A Paródia», Rafael Bordalo Pinheiro retratou o estado da economia de um modo magistral e com uma actualidade impressionante; desenhou uma galinha a que chamou «A Economia – a Galinha Choca». Uma questão de aviário ou a passarada de Rafael A galinha de então, tal como as de agora, choca aplicadamente, a dívida externa, os títulos, a dívida flutuante, o Banco de Portugal, etc.
Uma questão de aviário ou a passarada de Rafael A galinha bem se esforça, tanto que já partiu o ninho na sua tentativa desesperada e frustrada de chocar tanto ovo choco. Pobre galinha … Tanto esforço para nada. Por trás, indiferente, mas ufano da sua suposta importância, o galo canta alto. A cada manhã nos acorda gritando, não nos permitindo esquecer todos os empréstimos que sobre nós pendem, qual espada de Dâmocles.
Uma questão de aviário ou a passarada de Rafael Os ovos desta galinha estarão galados?
Uma questão de aviário ou a passarada de RafaelTalvez sim, talvez não. Temo que deles acabem por nascer uns bicharocos esquisitos, que falam, falam, sem saberem, muitas vezes, o que dizem e que ocuparão os poleiros do poder sem verdadeiramente fazerem nada que preste.
Uma questão de aviário ou a passarada de RafaelDos ovos da galinha choca – pasme–se! – podem vir a nascer os que, com a sua retórica parlamentar, nos vão tão afincadamente desgovernando. São papagaios que não se calam e nos infernizam a vida.
Volta, Bordalo, que não te há-de faltar matéria de inspiração.

Isabel Castanheira,

no dia em que foi noticiado o aumento do gás em 6,9%!!

PS: A 7 de Fevereiro de 1900, «A Economia – a Galinha Choca» é publicada na «A Paródia»; a 16 de Maio do mesmo ano é publicada na mesma publicação «A Retórica Parlamentar: o Grande Papagaio».

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