Vergílio Alberto Vieira (n.1950) escolhe para título deste conjunto de 22 poemas um verso de Luiza Neto Jorge (Avós são reis por detrás de um vidro) e afirma na «memória justificativa»
deste seu recente livro: «para os avós, o amor dos netos não é regresso ao passado mas regresso ao presente – esse eterno presente para o qual a vida não é caminho mas razão para
caminhar». Num certo sentido esta ideia de Vergílio Alberto Vieira cruza-se com Camilo Castelo Branco (1825-1890) quando afirma: «A poesia não tem presente: ou é esperança ou
saudade». Temos o amor dos netos como ponto de partida mas esta poesia sábia, adulta e sintética não se satisfaz com as ilustrações dos netos do poeta, antes procura e encontra os desenhos de Emerenciano (n. 1946), autor de vasta obra de referência nesta área da ilustração de livros.
Nesta nota que procura saudar, situar e referir um livro novo, há um poema capaz de sintetizar a vida que permanece, o poema «Casa»: «Protegida p´los ulmeiros / Que, há um século, ali cresceram / Do chão que os mestres pedreiros / P´ra morada dela ergueram / Rende-se a casa ao lugar / De ausência que a habitou / Sempre que, de volta ao lar / A morte por ali passou /
De heras coberta, a fachada / A que as telham pesam mais / Deixam-na só, abandonada / Ao silêncio dos beirais / Janelas outrora abertas / Fecham-na, então, à passagem / De almas
feridas, desertas / Que partiram, em viagem / Pela memória esquecida / De que não ficou sinal/ De regresso, à luz perdida / Entre escombros, pedra e cal.»
Por fim se refere e cita o poema «Estátua» como exemplo de «moral da história» que toda a narrativa ou poética persegue. Porque entre o precário da Vida e o inevitável da Morte só o
Amor nos pode resgatar. Também no parque da cidade a estátua permanece entre solidão e esquecimento a dizer em voz alta e teimosa que não quer morrer: «Até que a luz regresse / Ao ponto donde partiu /Com ninguém mais se parece /Senão pois com quem a viu / Ser em sal transformada / Receber da noite a nudez / De estrela transfigurada / No sol de que se fez / Estátua depois esculpida /Pela mão que a levantou / À altura então devida /Ao fogo que a forjou /No parque, que a não vê / De dentro da escuridão /De bronze tem à mercê / O eco da solidão / Que a expõe à eternidade / De olhos abertos sem ver / Que o que fica da saudade /Também começa a morrer.»
(Editora: Crescente Branco, Ilustrações: Emerenciano)
































