Um Livro Por Semana 204 – «A escola do paraíso» de José Rodrigues Miguéis

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O ponto de partida é a nostalgia: «Não se pode ter nascido ali, viver a ver chegar e partir navios todos os dias, com um rasto de lágrimas e o esvoaçar de adeuses no azul, nem ouvir noite e dia estas vozes, sem ficar impregnado de irremediável nostalgia». O ponto de chegada é a «Escola do Paraíso», ela-mesma mas também a metáfora do Mundo e da Vida: «Por extraordinário que pareça, o Paraíso existe e está ao nosso alcance: ao cimo da Calçada, quase no encontro de três ruas, mas recolhido e ausente». O autor constrói um mundo à parte, um intervalo entre sonho e realidade, entre família e cidade, entre Galiza e Lisboa: «Lisboa, para aqueles imigrantes, era a vida nocturna e subterrânea, o trabalho forçado, a mina; e a Galiza, o mundo azul e verde da esperança e redenção, da abastança e repouso. A conversa arrastou-se sobre os eternos temas – capitais, juros, conversões, câmbios, ágios, inscrições, vacas, pinheiros, lameiros, canastros, contas em papelinhos inverosímeis, amarrotados…» De vez em quando a narrativa pergunta («Como é que o tempo passa tão depressa?»), volta a perguntar («Como é possível a gente viver e depois esquecer assim tudo?») para, no fim, concluir: «Entre o sonho e a realidade quotidiana não existe laço algum». Entre a paisagem e o povoamento, o autor escolhe: «No meio disto tudo, o que realmente nos interessa são as pessoas». À porta do Coliseu, afirma: «Há no Circo, como no Amor, uma tristeza de impossível.» No ponto alto da metáfora, a despedida: «Que tristeza a duma escola abandonada! Os meninos foram-se todos embora. E o Paraíso vai ficando para trás, no cimo da Calçada empinada, cabo da memória para sempre dobrado e oculto».
(Editora: Estúdios Cor, Capa: Manuel Correia)

José do Carmo Francisco

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