Um apagão que durou pouco desperdiçando-se um momento marcante de aprendizagem

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Filipa Silva
Eng. Agrónoma – Consultora e Formadora

Na passada segunda-feira, fomos todos surpreendidos por um grande apagão. É em momentos como este, quando a grande rede de dependências falha, que se revela a fragilidade do sistema em que vivemos. E nestes momentos, relembro o bom que é, e agradeço por não viver numa grande cidade — lugares onde as dependências são ainda mais complexas e não há resposta para as necessidades de tanta gente, tornando tudo ainda mais caótico perante uma falha deste tipo.

Não deixo de pensar nas pessoas que sofreram com este imprevisto. Lamento por quem ficou preso em túneis, no metro, em elevadores; nos passageiros que voavam sem saber onde iriam aterrar; e em todos aqueles que passaram horas e horas em filas à espera de transportes. As consequências foram sérias, sobretudo para os serviços essenciais como os hospitais e outras unidades de saúde, que não podem nunca parar.

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Mas, se houvesse uma forma de garantir que ninguém sairia gravemente prejudicado, confesso: gostaria que o apagão se tivesse prolongado no tempo. Há quanto tempo não se via tantas pessoas na rua? Entre vizinhos à conversa, famílias juntas a passear nos parques, grupos de jovens a conviver.. e tudo sem ecrãs, sem smartphones, sem redes sociais. Relações reais, não virtuais.

Que bom seria se todos tivéssemos painéis solares nos telhados das nossas casas, permitindo-nos ser autónomos em energia, para que neste tipo de situações, ninguém tivesse que ficar sem cozinhar, sem água quente, ou sem acesso a cuidados de saúde que dependem de electricidade. Mas que divertido teria sido jantares à luz das velas, noites de jogos de tabuleiro ou de leitura com lanternas e velas? Seria como acampar mas dentro de casa, proporcionando momentos simples mas memoráveis.

Não quero parecer insensível perante o sofrimento alheio, mas não vou mentir sobre o facto de querer que o apagão tivesse durado mais tempo. Penso que este episódio não foi longo o suficiente, tendo sido perdida uma oportunidade para relembrarmos como ser criativos e encontrar soluções para os pequenos desconfortos, perdeu-se uma chance de experimentar, ainda que por uma noite, uma forma mais simples de viver e de nos relacionarmos.

A forma como usamos a tecnologia, especialmente os telemóveis, está a sugar o que resta das nossas relações humanas. E parece que, como humanidade, não temos força para reconhecer, nem para agir perante esta catástrofe social.

Talvez apenas falhas como esta, não esperadas, sejam das poucas oportunidades para sermos confrontados e forçados a parar e a olhar uns para os outros, a comunicar frente a frente – e para relembrar que a vida é bela, e mais bela quando partilhada fisicamente com outras pessoas. ■

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