Tens razão

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Dora Mendes
técnica de Museu

Tema amplamente discutido ao longo dos séculos por inúmeros filósofos, matemáticos e cientistas, a razão, ou falta dela, assume-se como um conceito paradoxal que questiona a natureza da verdade, e a relação entre o conhecimento e a realidade.
Por um lado, temos a noção de que a verdade é absoluta e pode ser conhecida através da razão e da evidência. Esta é a base da ciência, da lógica e da argumentação, onde o objetivo é encontrar a verdade a partir do conhecimento disponível.
Por outro, a ideia de que a verdade vive envolta numa certa relatividade. Esta condicionada, à partida, pela perspetiva de cada individuo e daquela que é a sua própria perceção da realidade. Ora, se as experiências, crenças e valores são distintos, logo a verdade, será ela mesma, desigual deitando por terra o conceito de verdade absoluta.
Isso traz-nos a uma contradição aparente: se não há verdades absolutas, como pode alguém ter razão? E se alguém realmente tem razão, como pode haver uma verdade relativa?
Falamos da razão, daquela por que tanto nos debatemos e teimamos, fazendo acreditar que tudo depende do facto de “termos razão”! Como se “dela” dependêssemos para conseguir ser credíveis, seguros e, em última análise, as melhores pessoas!
Acabamos muitas vezes, na autoritária defesa da nossa razão, por ser agressivos, depreciativos, muitas vezes até ofensivos para com o outro. Não deixando margem para que algum entendimento entre pares possa surgir.
Mas afinal, a quem importa a razão senão a nós mesmos? Quem teme tanto não ter razão, quanto cada um de nós? A quem mais queremos, no fundo, provar que temos razão, senão a nós próprios?
E focados neste nosso umbigo, esquecemos que neste paradigma vive também o outro… tornando as suas razões tão válidas e pertinentes quanto as nossas.
A construção de relações fortes e consistentes, não se faz de razões absolutas e individualistas, mas antes de argumentações salutares, em que o objetivo passa por compreender os diferentes pontos de vista e integrar, também, as opiniões dos outros.
Ao contrário do que se pensa, assumir que “não tenho razão” requer confiança e alguma segurança, e está longe de ser um sinal de fragilidade. Mas antes um meio de aprender mais, de integrar mais conhecimento.
Se as nossas razões nos fazem sentido, também as dos outros lhes fazem sentido a eles. Talvez possamos por isso começar por entender que se quero ter razão, tenho primeiro de estar disposto a procurar entender a razão do outro.
Somente nessa disponibilidade, sincera, conseguirei construir espaço para que a minha razão possa ter razão.
Caso contrário, mantemo-nos no risco iminente de cair na trama do tão conhecido ditado popular: numa casa em que não há pão, todos ralham e ninguém tem razão… ■

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