
ex-vereador da Câmara das Caldas da Rainha
Ao presidente da Câmara das Caldas da Rainha dedico este artigo, que se consubstancia num conceito a que, técnica e academicamente, chamamos “capacidade de carga”, muito utilizado no ordenamento do território, mas aplicável a outros setores de atividade.
Importa explicar que a capacidade de carga do território é o número de indivíduos que um ambiente pode suportar, sem impactos negativos significativos. Porém, talvez seja conveniente continuar a explicar ao presidente da Câmara de um modo que mais facilmente mereça a sua compreensão.
Imagine que lhe convém distribuir 100 caixas com garrafas de bebidas, mas cujo veículo apenas contém espaço e suporte para 50 caixas. A capacidade de carga é a quantidade máxima permitida de peso e/ou volume num único transporte. Já tendo sido gestor da maior empresa de distribuição de bebidas da região, talvez assim entenda melhor o conceito.
Imagine que tem casas cheias, ou perto disso, no obsoleto Campo da Mata e no inestético Campo da Quinta da Boneca, ou seja, 6000 pessoas no total para assistirem a jogos. Porém, as lotações destes campos ultrapassam, em muito, a capacidade de carga da Mata Rainha D. Leonor, em pisoteio e viaturas, face à fragilidade deste ecossistema. Caldas devia ter um estádio fora de portas, em vez de apenas ter feito um específico para o râguebi, na zona desportiva municipal. Já tendo sido presidente do Caldas Sport Clube, talvez assim entenda melhor o conceito.
Imagine que tem um espetáculo numa zona central da cidade, onde é possível ensanduichar milhares de pessoas, mas, por exemplo, não tem estacionamento suficiente. Já tendo sido presidente de Junta, talvez assim entenda melhor o conceito.
Meu caro, para exercer não basta ser simpático. Mesmo que uma decisão contracorrente não alegre alguns eleitores, a firmeza afirmá-lo-á como um autarca que é respeitador da ecologia e, também, destas e das próximas gerações. O que o presidente da Câmara insiste em fazer no Parque D. Carlos I é um atentado a uma joia patrimonial, porque não é o encurtamento de dias dos eventos que resolve esta violação. Dado que não tem do seu lado quem lhe deveria dar regras de sustentabilidade ambiental e urbana nem sequer o conhecimento de que estas realizações devem merecer pareceres do Património Cultural e ter Plano de Emergência, deverá ouvir quem do Parque entende em termos daquilo que é a essência histórica, paisagística e ecológica deste espaço – e não penso naturalmente apenas em mim, leia bibliografia sobre estas questões. Já imaginou ser feito o mesmo nos Jardins Botânicos de Lisboa, de Coimbra ou do Porto? Para seu espanto, presumo, digo-lhe que o Parque e a Mata das Caldas são tão importantes quanto esses espaços ricos de flora e fauna.
A animação periódica de um espaço com estas características deve ser feita com manifestações de artes performativas e de atividades não-intrusivas. Porventura, saberá se todos os hóspedes dos hotéis circundantes estão dispostos a ouvir o estardalhaço até altas horas? Porventura, saberá se há residentes que necessitam de descanso, porque enfrentam o trabalho no dia seguinte, ou se existem doentes a residir por perto que nos merecem respeito acrescido? A ideia de que as atividades periódicas deste calibre morrem se não forem feitas no Parque é uma falácia. Avance com um Parque de Exposições, em local aberto e generoso em termos de capacidade de pessoas e viaturas, e logo verá que Caldas entra no patamar das cidades modernas e que o seu exercício autárquico fará história. Não será necessário ir muito longe para conhecer bons exemplos (Alcobaça e Torres Vedras).
O benefício da dúvida que lhe foi dado no início já se perdeu. Ser presidente da Câmara exige muito mais do que ser presidente da Junta. Essa perda dá-me toda a legitimidade para o confrontar, porque a minha condição de cidadão e lutador pelo melhor para as Caldas obriga-me a estar presente. A legitimidade do voto não lhe dá todo o direito de fazer das Caldas a resultante da sua curta visão política e do mundo. ■
































