Saúdinha, Qu’isso É Qué!

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Cumpre, na entrada desta primeira crónica, agradecer o convite lançado pela Gazeta das Caldas e saudar a boa companhia de leitores e parceiros de painel, esperando que o confronto de propostas e ideias seja proveitoso para a nossa comunidade que, manifestamente, delas carece.

Cabe também uma brevíssima explicação sobre aquilo que o título destes escritos traz consigo: «De Palavra em Riste», adaptação de um verso de Alexandre O’Neill, traduz o desejo de uma abordagem crítica fundamentada, a qual não recusa, antes pelo contrário, o conteúdo contundente, dado abundarem as versões idílicas da propaganda oficial e a sua necessária desmontagem é tarefa ingrata e exigente. Fácil seria a mera maledicência (até porque para dizer mal nem é preciso ter razão: basta ter vontade) ou, na perspectiva oposta, o discurso do boneco manipulado do ventríloquo.

Não se estranhará escolher como tema primeiro a Saúde, saúdinha da rija, qu’isso é qu’é principalmente, como diz a letra do fado. O debate sobre as Urgências Hospitalares, recentemente organizado pela Comissão de Utentes do CHO, estabeleceu, devido à qualificação dos participantes, um quadro de análise diversificado e complementar de uma enorme importância e que veio confirmar um tristíssimo resultado: as Urgências no Hospital de Caldas da Rainha são uma das 6 piores do país. A preocupante gravidade dos problemas não pode ser ignorada como se nada se passasse, mistificada com formulações estatísticas ou desvalorizada com insultos a quem se inquieta e denuncia a dimensão caótica que se verifica. Quando aconteceram as movimentações iniciais em defesa do Hospital, houve quem, no exercício das responsabilidades do seu mandato autárquico, rotulasse de imediato as causas que estavam na base da mobilização como uma «boataria» e os cidadãos empenhados tidos por alguém que necessitava sem demora de «internamento psiquiátrico». Infelizmente os motivos de alarme eram sérios e reais. Aliás, vêm de longe; ficou célebre a tirada do ministro da AD, Carlos Macedo – «quem quer Saúde, paga-a!», entendimento que Correia de Campos desenvolveu e este Macedo, levou ao apogeu. Anuncia-se uma verba de 150 mil € para um projecto de ampliação das Urgências, mas nada se fica a saber sobre as opções do programa que o deve enformar, custos de obra e calendário de execução. Acresce o funcionamento amputado dos Centros de Saúde, tendo como consequência e dano colateral o entupimento das Urgências, a progressiva eliminação de valências, de que a desarticulação do Departamento de Saúde Mental é o último exemplo, sendo que o protocolo de cooperação com o Serviço de Psiquiatria do Centro Hospitalar Lisboa Norte (curiosamente assinado no dia da homenagem à responsável exonerada do CHO) não é uma substituição satisfatória, até porque se prevêem mais parcerias no âmbito de outras especialidades «fragilizadas» sobre as quais as administrações envolvidas nada revelam.

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A ampliação do hospital já não é viável dado que avançaria pela Mata, punha em risco a preservação dos aquíferos termais, mantendo-se a impossibilidade de existência de um heliporto e a dificuldade de acessos. Há que lutar pela existência de um hospital novo para os cerca de 300 mil habitantes do Oeste, em que Caldas da Rainha assume indesmentível e estratégica centralidade territorial. Resta-nos a resiliência (palavra que os decisores políticos tanto invocam), porque sem ela ficaremos com uma mão cheia de nada e outra de coisa nenhuma.

José Carlos Faria

jcrffaria@gmail.com

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