SANDES DE COURATO

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Gazeta das Caldas

Alternância

É indispensável compensar a grandeza do poder pela brevidade da duração.
Montesquieu

Pensava não abordar tão cedo este tema mas, quando há dias, vi fotografias da inauguração da Biblioteca Municipal o assunto impôs-se-me. É impressionante que após 20 anos muitas das caras sejam as mesmas, é impressionante a pouca renovação que se verificou nas estruturas autárquicas.
A diversidade é o motor da evolução. Mesmo que não queiramos colocar em questão a competência, não é possível defender que a manutenção das mesmas pessoas, nas mesmas posições, não é redutora e não impede o surgimento de visões e soluções novas, sempre enriquecedoras. A alternância, o desafio, o questionamento, cria uma dinâmica de melhoria e evolução construtiva que não ocorre nas situações de estagnação. O desafio constante é a energia que contraria a inércia. As organizações quando são desafiadas têm de reagir e ser melhores para sobreviver; se não houver desafio, se a posição de conforto não for ameaçada, não há motivação para procurar a superação.
Na história do governo municipal desde que se realizam eleições livres para o poder local, podemos distinguir três grandes momentos. Para a presente análise vamos deixar de fora a terceira fase a qual, por ser recente, não se apresenta relevante do ponto de vista de análise histórica.
Os primeiros anos foram de investimento em infra-estruturas. Este foi um desígnio do Concelho, mas também de todo o país e tenho para mim que, independentemente da força política que estivesse na Câmara teria sido esse o rumo seguido. A inteligência do PSD foi a de saber capitalizar em votos as obras realizadas, mantendo-se à frente da Câmara.  Na segunda fase, a do betão, desenvolvimento foi confundido com construção. Foram decididas opções que contribuíram para a descaracterização urbanística e que condicionaram e condicionarão o desenvolvimento por muitos anos. Mas as maiorias continuaram a premiar o PSD.

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A questão que me tem merecido reflexão é perceber como pode uma força política, sem fazer obra notável, manter-se tantos anos no poder?
Pedindo licença a Noah Harari “Em 1917, quando as classes média e alta da Rússia não teriam menos de três milhões de pessoas, o Partido Comunista tinha apenas 23 mil membros. Apesar disso, os comunistas tomaram o poder (…) porque estavam bem organizados” ou, do mesmo autor, “Ceausescu e os seus comparsas dominaram 20 milhões de romenos porque tinham assegurado três condições fundamentais. Em primeiro lugar, entregaram o controlo de todas as redes de cooperação (…) aos apparatchiks leais ao partido. Em segundo lugar, impediram a criação de quaisquer organizações rivais (…)”. Salvaguardando as proporções, reconhece-se o padrão. A manutenção do poder baseia-se na capacidade de organização, em criar um aparelho que sustente esse poder – foi isso que aconteceu em Caldas, é essa a explicação, e não a excelência do trabalho, que justifica que sejamos há tanto tempo governados pelas mesmas caras.
Caldas continuará assim governada enquanto uma de duas coisas não acontecerem: a maioria implodir – facto pouco viável porque a manutenção do poder é um grande estímulo para o entendimento; ou a oposição perceber que não são as propostas feitas em campanha eleitoral, mas a capacidade de erodir as fundações da organização que sustenta a maioria, que garantirá futuras vitórias. O PS – partido mais bem colocado para disputar a câmara, enquanto não perceber isto – não governará a Cidade.
Para terminar. Se nas últimas décadas tivéssemos sido governados, no Concelho, pelo PS, estaríamos melhor?  tenho a certeza de que não. Tivesse havido alternância no governo da Câmara? Tenho a certeza que sim, hoje estaríamos melhor.  

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